Alicia Davis em Milton Keynes, na Inglaterra: efeitos da covid-19 foram desproporcionais nos jovens (Elena Heatherwick/The New York Times)
Carolina Riveira
Publicado em 13 de novembro de 2020 às 12h46.
Última atualização em 13 de novembro de 2020 às 15h59.
Como milhões de jovens em toda a Europa, Rebecca Lee, de 25 anos, de repente se viu excluída do mercado de trabalho à medida que a crise econômica causada pela pandemia se intensifica.
Seu posto de trabalho como assistente pessoal em uma empresa de arquitetura de Londres, na qual trabalhou por dois anos, foi eliminado em setembro, e agora ela procura um trabalho de qualquer tipo.
Lee, que é formada em Ilustração pela Universidade de Westminster, enviou quase cem pedidos de emprego. Depois de dezenas de rejeições, e mesmo se inscrevendo para uma vaga de entregadora de comida no Deliveroo, finalmente conseguiu um contrato de dois meses em uma instituição de caridade que paga dez libras (cerca de US$ 13) por hora. "No momento, aceito tudo que puder. A situação é desesperadora", disse.
A pandemia do coronavírus está rapidamente alimentando uma nova crise de desemprego entre os jovens na Europa. Eles estão sendo desproporcionalmente atingidos, econômica e socialmente, pelas restrições de bloqueio, forçando muitos a fazer ajustes dolorosos e deixando os formuladores de políticas desesperados por soluções.
Anos de crescimento do emprego se perderam em questão de meses, deixando mais do que o dobro de jovens desempregados, em comparação com outras faixas etárias. A taxa de desemprego para pessoas com 25 anos ou menos saltou de 14,7 por cento em janeiro para 17,6 por cento em agosto, o maior nível desde 2017.
A Europa não é o único lugar onde os trabalhadores mais jovens enfrentam a crise. Na China, eles lutam por empregos na era pós-surto. Mas, na Europa, o impacto econômico da pandemia coloca em risco toda uma geração, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
Os jovens são super-representados em setores nos quais os empregos estão desaparecendo, incluindo viagens, varejo e hotelaria. Os que têm formação universitária enfrentam uma concorrência sem precedentes até mesmo para posições de nível básico graças a um tsunami de trabalhadores recém-demitidos.
Os europeus que chegam ao mercado de trabalho na pandemia estão baixando suas expectativas em relação ao emprego e à carreira que podem obter. Muitos estão recorrendo a estágios, vivendo com os pais ou voltando para a escola para fugir da turbulência. Os jovens trabalhadores sem ensino superior correm o risco de perder ainda mais.
Álvaro Sierra sabia que algo estava errado quando lhe pediram durante uma entrevista de emprego em março que desse garantias de que não estava morando com alguém que tinha covid-19. Na PVH, a varejista de roupas de Amsterdã, na qual ele esperava conseguir uma cobiçada posição de marketing, não houve apertos de mão. Ele percebeu que uma crise econômica ligada à pandemia era iminente.
Sierra, de 25 anos, tinha trabalhado diligentemente desde sua formatura em uma das melhores universidades espanholas em 2018 para estabelecer as bases para uma tão sonhada carreira na indústria de varejo ou de cosméticos.
Armado com um diploma de Economia, analisou dados financeiros em uma consultoria bancária de Madri e depois trabalhou em um estágio remunerado na gigante de cosméticos L'Oréal, ajudando a gerenciar e analisar orçamentos e campanhas de marca.
Em fevereiro, mudou-se para Amsterdã e conseguiu entrevistas com a PVH, a Adidas e outros grandes varejistas. Sua animação cresceu quando a PVH o chamou para uma segunda entrevista em março.
Quando o coronavírus chegou, a vaga foi cancelada. "Fiz todas essas entrevistas com grandes empresas, mas então o ritmo parou", disse Sierra. Seus dias logo foram consumidos com a busca no LinkedIn por vagas de emprego, que diminuíram rapidamente. Em vez de cargos de nível básico, havia mais vagas para estágios.
Sierra voltou a Madri em julho para morar com seus pais e fez outro estágio, dessa vez na 3INA, marca de cosméticos veganos, na qual ele auxilia no programa de marketing da empresa e recebe menos de 600 euros (cerca de US$ 700) por mês.
Apesar do programa governamental projetado para limitar o desemprego, centenas de milhares de trabalhadores foram demitidos no Reino Unido assim que Alicia Davis chegou ao mercado de trabalho.
Davis, que havia se formado em Psicologia, se viu competindo com um grupo de candidatos desempregados em rápida expansão, com experiência de trabalho que ela não tinha. Muitos estavam querendo garantir qualquer tipo de emprego – incluindo cargos de nível básico que são tradicionalmente o trampolim da carreira para recém-formados. "Comecei a pensar: 'Meu Deus, vai ser mais difícil do que pensei inicialmente'", contou Davis, de 22 anos, que voltou para a casa de seus pais no noroeste de Londres.
Quando se candidatou a um cargo de recursos humanos em uma empresa de Londres, ela descobriu que 800 outros estavam disputando a mesma vaga, muitos com experiência em gestão.
Davis recentemente arrumou um bico de quatro semanas fazendo pesquisas para uma empresa de carros, que paga o salário mínimo britânico de 8,20 libras por hora.
Aos 15 anos, Mario Palumbo, que cresceu em um conjunto habitacional perto de Nápoles, largou o ensino médio para sustentar a mãe e a irmã depois que o pai morreu, tendo empregos temporários de baixa remuneração como carregador de mudanças, pintor de casas e ajudante de obras.
Contudo, nos últimos anos, Palumbo, de 33, que é apaixonado por comida, se orgulhava de ter conquistado uma carreira estável como cozinheiro. Tendo progredido de carregador de café para garçom, e depois para chef assistente em trattorias de Nápoles, obteve em setembro do ano passado um contrato temporário como chef responsável por uma estação em um restaurante da moda.
Quando a pandemia chegou à Itália em fevereiro, seu contrato não foi renovado. Os empregos eram tão escassos que a máfia italiana se espalhou por seu bairro, tentando recrutar dezenas de jovens desempregados para desempenhar pequenas tarefas.
Incapaz de encontrar trabalho, Palumbo começou a contar com a renda básica de 300 euros de sua mãe. Acabou encontrando um emprego sem registro, em maio, em um restaurante na Calábria, a quase 320 quilômetros de casa. Mas, quando o coronavírus reapareceu em agosto, a posição foi eliminada.
Palumbo afirmou que sua única esperança era se mudar para o norte mais próspero da Itália, mas tem tão pouco dinheiro que não pode pagar a passagem de trem nem o aluguel lá. Vai ficar onde está, portanto. "Tenho energia e sei arregaçar as mangas em qualquer tipo de trabalho. Mas tudo está parado, e minhas mãos estão atadas", resumiu.
Elise Prevost arriscou tudo quando decidiu fazer mestrado em Direitos Humanos há dois anos.
Amigos de sua turma de graduação de 2018 encontraram empregos rapidamente em uma economia que estava finalmente em alta depois da crise financeira da Europa. Entretanto, no mundo competitivo do trabalho humanitário, garantir um diploma avançado parecia ser a melhor maneira de começar – mesmo que isso significasse milhares de euros em dívidas de empréstimos estudantis.
A aposta não valeu a pena. Hoje, Prevost, de 23 anos, fica pensando em como vai pagar mais de 90 mil euros – mais de US$ 100 mil – em mensalidades universitárias depois de ter se candidatado a mais de 70 empregos que não deram em nada.
Quando um estágio em um escritório de advocacia de Paris surgiu, ela o aceitou. Os casos de direitos das vítimas são o tipo de trabalho que ela quer, e sua carga horária de 75 horas por semana é semelhante à de um advogado em tempo integral. No entanto, o salário, de 600 euros por mês, dificilmente ajuda a pagar suas dívidas.
Christina Penteridou, de 21 anos, sente que não tem futuro na Grécia. Ela se formou em Cinema pela Universidade de Westminster, em Londres, e estava dirigindo seu primeiro filme independente, um thriller de fantasia, quando o coronavírus chegou.
Em março, retornou à sua cidade natal, Tessalônica, a segunda maior da Grécia, e começou a procurar empregos de produção de nível básico.
Mas a busca é tão cansativa que ela está procurando maneiras de deixar seu país novamente. "A Grécia não pode me oferecer um futuro", disse Penteridou, que estava orgulhosa de ter estabelecido uma vida independente em Londres nos últimos três anos. Agora, está desempregada e vivendo novamente com os pais.
Quando o trabalho de marketing de Tariro Madzingira acabou durante a pandemia, ela sabia que arrumar um novo emprego seria difícil. Muitos de seus colegas tinham dificuldade de enfrentar um mercado de trabalho cada vez mais volátil.
Em vez de entrar em pânico, Madzingira, de 24 anos, resolveu tomar uma atitude. Voltou de Londres para a casa dos pais, em Birmingham, e se matriculou em um curso de coaching de carreira de oito semanas.
Melhorou suas habilidades de entrevista, desenvolveu estratégias de planejamento profissional e reforçou sua confiança. Agora, está treinando outros formandos on-line gratuitamente, ajudando-os a aprimorar suas buscas por emprego e superar a ansiedade de pertencer à geração Covid-19. "Muitos jovens com nível superior com quem falei estão se candidatando a vários postos de trabalho e se sentindo realmente perturbados. Quero ajudá-los a eliminar o pânico e a entender que têm algum controle", afirmou Madzingira.
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