Hamas: engenheiro foi recrutado pelo grupo em 2004 e teria infiltrado ONG em 2010 (Ibraheem Abu Mustafa/Reuters)
Da Redação
Publicado em 4 de agosto de 2016 às 20h41.
Israel anunciou nesta quinta-feira que prendeu e indiciou o encarregado palestino pela organização World Vision, uma ONG na Faixa de Gaza, acusando-o de desviar milhões de dólares da organização cristã presente em todo o mundo para o grupo islâmico Hamas.
As autoridades israelenses disseram que Mohamed Halabi, um engenheiro palestino de 38 anos, foi recrutado pelo Hamas em 2004, para se infiltrar nessa ONG e subir em sua hierarquia.
Assim, desde 2010, teria desviado cerca de 7,2 milhões de dólares para financiar o Hamas e as suas atividades militares, de acordo com o serviço de inteligência israelense, Shin Bet.
A World Vision, que se apresenta como uma das organizações humanitárias mais importantes do mundo com mais de 40.000 funcionários em cerca de cem países, afirmou "não ter nenhuma razão" para acreditar nas alegações.
Mas muitas autoridades israelenses fizeram dessa prisão um exemplo por excelência da exploração do Hamas da ajuda humanitária à Faixa de Gaza.
Mais de dois terços dos 1,9 milhão de habitantes de Gaza dependem de ajuda para morar em um território controlado pelo Hamas e submetido ao bloqueio de Israel, que vivem em uma crise humanitária crônica.
Halabi foi preso em 15 de junho na passagem de Erez, entre Israel e a Faixa de Gaza, e foi indiciado por 12 acusações, incluindo por adesão a uma organização terrorista e cumplicidade com o inimigo, afirmou nesta quinta-feira a justiça israelense.
Financiamento de atividade militares
Contratado pela World Vision em 2005, assumiu o posto em Gaza em 2010, de acordo com um segurança israelense, desviou desde então 7,2 milhões de dólares anuais para o Hamas e suas atividades militares.
O Hamas, inimigo jurado de Israel, é considerado por este último, bem como pelos Estados Unidos e a União Europeia, como uma organização terrorista.
"Em nenhum momento encontramos evidências de que a organização [World Vision] estivesse envolvida ou ciente e insistimos no fato de que não estamos vigiando esta organização, mas o Hamas", disse o funcionário.
De acordo com Israel, 60% do orçamento anual da World Vision em Gaza, incluindo centenas de milhares de dólares em dinheiro, teria desaparecido sem a organização perceber.
'Ponham a casa em ordem'
A ONG, entretanto, rejeitou as acusações contra seu diretor. Os programas da World Vision na Faixa de Gaza são habitualmente submetidos a uma auditoria independente "e a uma série de controles internos", indicou a organização em um comunicado.
"Com base nas informações disponíveis até agora, não temos razão para acreditar que essas alegações sejam verdadeiras", acrescentou.
O general Yoav Mordechai, líder do corpo militar que coordena as atividades de Israel na Cisjordânia e em Gaza, reuniu-se na quinta-feira à noite em Tel Aviv com um "funcionário veterano americano da World Vision", informou seu gabinete, sem dar maiores detalhes.
"Trata-se de um incidente grave", dizia um comunicado do gabinete de Mordechai, citando o que supostamente o general disse aos seus interlocutores. "Assumam sua responsabilidade e ponham a casa em ordem".
'Exploração cínica'
A segurança israelense afirma que o dinheiro teria ido parar, camuflado em projetos agrícolas, ao financiamento de uma base de treinamento das brigadas Ezedin al Qasam, braço armado do Hamas, ou à construção de túneis entre Gaza e o território israelense.
Os túneis, que servem para introduzir ou tirar itens de contrabando no enclave sob bloqueio, são considerados por Tel Aviv uma ameaça maior proveniente de um território que Israel enfrentou em três guerras entre 2008 e 2014.
O tamanho da organização e a magnitude da suposta fraude evidenciam as dificuldades das organizações humanitárias em trabalhar em Gaza, ao mesmo tempo observadas com lupa pelas autoridades israelenses e pelo Hamas.
Como outros, o deputado de direita Avi Dichter, chefe da comissão parlamentar de Defesa e ex-chefe de Segurança Doméstica, tomou o caso como exemplo para apontar a "ingenuidade" das ONGs diante da "exploração cínica" de grupos cujo "único objetivo é matar judeus ou palestinos de quem não gostam".
Na noite de quinta-feira, o embaixador da Austrália em Tel Aviv, Dave Sharma, anunciou no Twitter que seu país "suspendia seu financiamento das operações da World Vision nos Territórios Palestinos até que se concluam as investigações".