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Grupos armados bloqueiam distribuição de ajuda humanitária em Gaza

Trabalhadores humanitários denunciam que ações criminosas ocorrem à vista do Exército de Israel, que não intervém; enfraquecido no enclave, Hamas reativa força de segurança em busca recuperar o controle e combater os roubos

Um menino transporta uma caixa de ajuda humanitária, fornecida pelo Programa Mundial de Alimentos, de volta para sua casa no campo de refugiados de Bureij (Eyad BABA/AFP)

Um menino transporta uma caixa de ajuda humanitária, fornecida pelo Programa Mundial de Alimentos, de volta para sua casa no campo de refugiados de Bureij (Eyad BABA/AFP)

Agência o Globo
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Agência de notícias

Publicado em 26 de novembro de 2024 às 11h24.

Última atualização em 26 de novembro de 2024 às 11h24.

Em meio à escassez de alimentos na Faixa de Gaza, devastada pela guerra há mais de um ano, roubos cada vez mais violentos por gangues criminosas são agora o principal obstáculo para a distribuição de suprimentos no sul, segundo trabalhadores humanitários e moradores locais ouvidos pela rede britânica BBC. Eles alegam que homens armados passaram a operar à vista de soldados das Forças Armadas de Israel ou de drones de vigilância em uma zona restrita próxima à fronteira, mas que o Exército não intervém.

Percebendo a oportunidade de recuperar seu controle, o grupo terrorista Hamas, hoje enfraquecido, reativou uma força de segurança para combater os roubos. Após criminosos roubarem quase 100 caminhões das Nações Unidas em 16 de novembro, ferindo muitos dos motoristas palestinos e provocando uma das maiores perdas de ajuda humanitária desde o início da guerra, em outubro de 2023, vários supostos saqueadores foram mortos numa emboscada.

Ainda segundo a BBC, uma notória família criminosa de Gaza bloqueou a rodovia Salah al-Din, principal estrada que conecta o ponto de passagem de Kerem Shalom, em Israel, por dois dias na semana passada. Testemunhas disseram que barreiras de ferro foram erguidas, e caminhões que tentavam acessar o ponto de distribuição de ajuda foram alvejados. Os casos ocorreram enquanto organizações humanitárias alertam para a fome iminente no norte do enclave.

"A lei e a ordem colapsaram na área ao redor da travessia de Kerem Shalom, que permanece o principal ponto de entrada de assistência, e gangues estão preenchendo o vazio de poder. Isso é inevitável após 13 meses de conflito intenso, as coisas desmoronam", disse Sam Rose, vice-diretor da UNRWA, a agência da ONU para refugiados palestinos.

Georgius Petropoulos, chefe do escritório humanitário da ONU na Faixa de Gaza (OCHA), afirmou que a “pilhagem tática, sistemática e criminosa” tem levado à “ultraviolência” em todas as direções: dos saqueadores contra os motoristas de caminhão, do Exército israelense contra a polícia e da polícia contra os saqueadores. A ausência de ordem aumentou desde que Israel começou a atacar policiais no início deste ano, citando seu papel na governança do Hamas.

"O controle de segurança do Hamas caiu para menos de 20%. Estamos trabalhando em um plano para restaurar o controle para 60% dentro de um mês", disse o ex-chefe de investigações policiais do Hamas à BBC.

Em 15 de novembro, um dia antes do ataque aos caminhões da ONU, 29 ONGs afirmaram que o Exército de Israel está facilitando o saque de ajuda humanitária em Gaza ao atacar as forças policiais palestinas que tentam combatê-lo. Em relatório, as organizações criticaram a queda drástica da entrada de comboios humanitários para os palestinos, que estão sob cerco total israelense, e afirmaram que as forças do Estado judeu não conseguem impedir o saque dos caminhões.

“O saque é um problema recorrente, uma consequência do ataque de Israel às forças policiais remanescentes em Gaza, da escassez de bens essenciais, da falta de estradas e do fechamento da maioria dos pontos de passagem, bem como do desespero da população resultante dessas condições desastrosas”, afirmam as organizações, que incluem a Médecins du Monde, a Oxfam e o Conselho Norueguês de Refugiados.

Crise humanitária

Se por um lado alguns deslocados no sul de Gaza aprovam os novos esforços do Hamas contra as gangues criminosas, outros veem isso como uma tentativa cínica de tomar o controle de mercados clandestinos lucrativos. Além disso, muitos avaliam as tentativas do grupo de liderar o combate à criminalidade como uma consequência do fracasso de Israel em concordar com um plano para o pós-guerra na região.

Atualmente, não há alternativas para substituir o Hamas, grupo que os líderes israelenses prometeram destruir após os ataques de 7 de outubro do ano passado, quando mais de 1,2 mil pessoas foram mortas e outras 250 foram feitas reféns. Passado mais de um ano da guerra que se iniciou desde então, mais de 43,9 mil pessoas foram mortas em Gaza, e as negociações para um cessar-fogo permanecem sem avanços.

Ao todo, segundo a ONG Human Rights Watch (HRW), mais de 90% da população palestina na Faixa de Gaza foi forçada a abandonar suas casas, muitas delas mais de uma vez, em razão da guerra. Com o início do inverno chuvoso na região, autoridades humanitárias afirmam ser essencial resolver a situação para atender às crescentes necessidades da maior parte dos 2,2 milhões de habitantes de Gaza, agora deslocados novamente para o centro e o sul do enclave.

Os casos de bloqueio de distribuição de suprimentos ocorrem também num momento em que a ajuda que entra em Gaza caiu para alguns dos níveis mais baixos desde o início da guerra. Em outubro, os Estados Unidos, maior aliado de Israel, enviaram uma carta às autoridades israelenses exigindo o aumento da entrada de ajuda humanitária em Gaza, com ao menos 350 caminhões de ajuda por dia. Naquele mês, a média foi de 37 caminhões para todo o enclave, segundo a UNRWA.

Israel afirma que o principal motivo pelo qual a meta dos 350 caminhões não foi alcançada é a incapacidade da ONU e de outras agências de trazer caminhões suficientes aos pontos de passagem, algo que os trabalhadores humanitários rejeitam. Eles pedem que muitas das restrições de entrada impostas pelo Estado judeu sejam suspensas, e que mais pontos de travessia sejam abertos. Como justificativa, afirmam que Israel, enquanto potência ocupante, é obrigado a fornecer proteção e segurança na região.

Mercado clandestino

No início da guerra, quando a comida se tornou mais escassa, palestinos desesperados foram vistos roubando caminhões de ajuda que chegavam, e o contrabando de cigarros logo tornou-se um grande negócio, com gangues interceptando comboios sob a mira de armas. Hoje, segundo a BBC, um maço de cigarros pode ser vendido por valores exorbitantes: enquanto antes 20 cigarros custavam cerca de 20 shekels (cerca de R$ 31), hoje um único cigarro pode custar 180 shekels (R$ 281).

Nas últimas seis semanas, autoridades israelenses proibiram importações comerciais, afirmando que estas beneficiam o Hamas. A decisão contribuiu para a redução no fornecimento de alimentos e, por consequência, impulsionou o aumento de roubos armados. Produtos roubados, de farinhas até itens de inverno enviados como doações destinadas a serem entregues gratuitamente, só podem ser comprados a preços exorbitantes no mercado clandestino de Gaza, publicou a BBC.

Nos últimos dias, a mídia local tem sugerido que Israel está estudando a possibilidade de entregar ajuda a Gaza por meio de uma empresa de segurança privada armada dos Estados Unidos. Embora nada tenha sido anunciado oficialmente, trabalhadores humanitários estão preocupados. Petropoulos, da OCHA, questiona quais países doadores gostariam que os suprimentos fossem distribuídos dessa forma.

"Acho que será um vetor para mais derramamento de sangue e violência". (Com AFP e New York Times)

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