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Gravações de sequestrados viram documentário sobre Kim Jong-il

Dois cineastas foram sequestrados para revolucionar a cinematografia da Coreia do Norte caracterizada, até então, por frias propagandas no estilo soviético

Documentário: dois cineastas tinham sido sequestrados para revolucionar a cinematografia da Coreia do Norte (Foto/Reuters)
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EFE

Publicado em 24 de dezembro de 2016 às 09h35.

Última atualização em 24 de dezembro de 2016 às 10h51.

Seul - Há quase 40 anos, Kim Jong-il, pai do atual líder da Coreia do Norte - Kim Jong-un - e que morreu há cinco anos, sequestrou um casal de cineastas sul-coreanos para revolucionar a sétima arte de seu país. Por muito tempo, os dois gravaram em segredo suas conversas com o ditador, que agora são reveladas em um documentário.

As fitas, que estão entre os poucos registros de voz de um dirigente avesso a discursos públicos, mostram a intenção que ele tinha de transformar o cinema em uma poderosa arma do regime, assim como a admiração que cultivou pelos dois produtores que sem querer protagonizaram em vida um verdadeiro filme de ação.

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Em 1978, o diretor Shin Sang-ok e a atriz Choi Eun-hee, o casal 20 do cinema sul-coreano, anunciaram o seu divórcio e pouco depois desapareceram sem deixar rastro, após uma viagem de negócios a Hong Kong.

Os dois tinham sido sequestrados por ordem do "querido líder", então cérebro e sucessor do regime presidido por seu pai Kim Il-sung, para revolucionar a cinematografia da Coreia do Norte caracterizada, até então, por frios e chatos filmes de propaganda no estilo soviético.

Assim, Kim Jong-il conseguiu revitalizar o cinema norte-coreano, e o converteu em uma ferramenta muito mais poderosa e sutil a serviço da ditadura.

"Shin Sang-ok levou à telona personagens com sentimento e emoção, e melhorou muito a tecnologia. Isto transformou em realidade a visão política de Kim Jong-il de ditadura emocional", explicou à Agência Efe em Seul o escritor exilado Jang Jin-sung, que foi redator de propaganda do cinéfilo ditador falecido em 2011.

Lançado na última edição do Festival de Sundance e exibido também no Festival de Berlim, "The Lovers and the Despot" chegou agora às salas comerciais de vários países, como Estados Unidos e Coreia do Sul.

Ainda sem data para estrear no Brasil, o documentário dos diretores britânicos Robert Cannan e Ross Adam repassa a história deste sequestro através do conteúdo inédito das fitas cassetes gravadas em segredo pelos cineastas sequestrados.

Com um gravador escondido no bolso de Choi, eles gravaram as conversas que tiveram com Kim Jong-il para provar o que tinham vivido e não serem considerados espiões caso conseguissem voltar à Coreia do Sul, então governada pelo autocrata anticomunista Park Chung-hee (pai da atual presidente Park Geun-hye) com o apoio dos EUA.

"Por que todos os nossos filmes têm as mesmas tramas ideológicas? Não tem nada novo, nenhuma das nossas produções participa de festivais de cinema", lamenta em uma gravação Kim Jong-il, que chega a dizer que a Coreia do Sul é uma "universidade" do cinema, enquanto a Coreia do Norte seria uma "creche".

Em outro áudio, Kim, que criou afeição pelo diretor sul-coreano, explica a origem do sequestro. "Perguntei ao meu conselheiro quem é o melhor diretor da Coreia do Sul, e ele me disse que era o senhor Shin. Então eu disse: 'tragam ele aqui'".

Shin Sang-ok e Choi Eun-hee reataram a relação e se casaram de novo na Coreia do Norte onde trabalharam em 17 produções, entre elas Pulgasari (1985), longa de ação protagonizado por um monstro tipo Godzilla, a última obra do diretor antes da fuga, que aconteceu em Viena, em 1986.

Com uma magistral atuação na vida real, o casal conseguiu ganhar a confiança do líder - ao ponto de convencê-lo de sua lealdade - e foi enviado a um festival na capital austríaca. Lá, conseguiram despistar os seguranças e escaparam levando junto as fitas com a voz do ditador.

Uma voz que até então não tinha sido ouvida fora do entorno de Kim Jong-il. Ao contrário de outros megalomaníacos da História, o "querido líder" nunca falava em público, segundo dizem por não gostar da própria voz, embora exista outra versão mais plausível.

"Ele fazia isso para alimentar sua aura de divindade e evitar que os norte-coreanos se considerassem parecidos a eles. Se aproximar dele era algo impossível para um cidadão comum, e queria que com sua voz ocorresse o mesmo", garante o ex-redator do regime.

Depois da fuga em Viena, o diretor e a atriz se exilaram nos EUA até conseguirem voltar à Coreia do Sul, em 1994. Shin dirigiu filmes em ambos os países e o casal permaneceu junto até a morte dele dez anos depois.

Choi completou 90 anos no mês passado, internada em um hospital na periferia de Seul.

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