Empresas dizem que sustentabilidade vai sobreviver à crise
Premiadas pelo Guia EXAME de Sustentabilidade mantêm seus planos de investimento em projetos sociais e ambientais
Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h37.
A expectativa de desaceleração da economia global não provocou mudanças no posicionamento das empresas-modelo em responsabilidade social no Brasil. Para essas companhias, sustentabilidade não se resume a projetos isolados. Representa a forma como pensam e agem ou mesmo um jeito de fazer negócio. Por isso, apesar das preocupações com a crise financeira, nenhuma delas cogita o corte de investimentos em sustentabilidade.
Durante o evento de premiação do Guia EXAME de Sustentabilidade 2008, que aconteceu nesta quarta-feira (28.10), em São Paulo, as companhias mostraram como esperam conciliar crise financeira e responsabilidade sócio-ambiental.
Alessandro Carlucci, presidente da Natura
Conhecida por transformar a sustentabilidade na alma de seu negócio, a Natura, assim como muitas outras empresas no país, demonstra preocupação com a crise financeira. Mas nem pensa em modificar seu modelo de negócio. Dissociar a sustentabilidade do nosso trabalho seria regredir uns 15 anos, avalia Alessandro Carlucci, presidente da Natura. O conceito de sustentabilidade permeia todos os negócios da empresa, desde a criação de produtos, passando pelas embalagens até o compromisso de diminuição das emissões de gás carbônico na cadeia produtiva. Vamos continuar baseando nosso desenvolvimento na sustentabilidade, pois acreditamos que ela é o caminho para a inovação, além de ser uma forte ferramenta de criação de valor, inclusive econômico, diz Carlucci. Mas se for necessária uma maior cautela nos investimentos globais da empresa, a sustentabilidade fará parte disso também, complementa.
Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano Papel e Celulose
Para a Suzano, sustentabilidade também é sinônimo de aumento de lucro. A empresa, que já tem 100% de sua floresta plantada certificada, absorve hoje quatro vezes a quantidade de carbono que produz, o que lhe garante créditos de carbono para comercializar. A companhia já acumula 3 milhões de toneladas de crédito de carbono e pretende elevar esse número a 5 milhões de toneladas até 2010. Se esses créditos fossem vendidos hoje, garantiriam uma receita extra de 25 milhões de dólares à empresa. Por isso, a Suzano mantém firme seus planos de expansão apesar da crise financeira, e estima crescer 150% até 2015. Estamos na fase de formação florestal, que envolve valores menores de investimento que a fase industrial. Isso nos traz certo conforto, diz Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano.
Ricardo Menezes, diretor de relações institucionais da Perdigão
"Para nós, sustentabilidade não é modismo, é uma questão cultural que permeia a companhia e faz parte de nossos valores. Estamos discutindo a perenidade dos nossos valores, do nosso negócio, em como transformá-lo em mais rentável, ético e transparente possível aos nossos acionistas. Criamos o Instituto Perdigão de Sustentabilidade em 2005 e este é o quarto ano que a companhia é premiada. O instituto levou para uma área específica essa preocupação de congregar numa única área a gestão de todos os outros programas que estavam muito pulverizados . Sobre a continuidade do programa e a manutenção de seu orçamento, o instituto não possui um orçamento específico. Tudo que é necessário para as atividades do programa de sustentabilidade sai do orçamento global - nada é considerado despesa, entra no balanço como investimento. Nossa expectativa é de que não seja necessário mexer, interromper ou alterar qualquer uma dessas iniciativas, até porque algumas delas têm impacto positivo, retornam em economia para a empresa, como e o caso de programa de reuso da água e de economia de energia. Vamos continuar trabalhando para que todas as iniciativas possam continuar acontecendo. Acreditamos que esse turbilhão de fatos vai passar. Nosso grande desafio para 2009 será a implementação de um novo programa de consumo sustentável. Estamos iniciando ainda, vai deslanchar em 2009. Nessa primeira fase, vamos investir na conscientização de nossos funcionários a evitar o desperdício nas refeições realizadas nas fábricas. Acreditamos que teremos um efeito multiplicador importante, cada um levando essa conscientização para suas casas - são 42 fábricas com funcionamento 24 horas que fornecem cinco refeições diárias a mais de 60 mil funcionários."
Marcos Bicudo, presidente da Amanco
"Vamos continuar com nossos programas de sustentabilidade, social e ambiental, por dois motivos. Primeiro, do ponto de vista ambiental, nossa atividade tem baixo impacto e a Amanco já tem investimentos que a colocam como referencia no mercado em índices de ecoeficiência. Em segundo lugar, está a nossa plataforma social, que visa capacitar a mão-de-obra da construção civil. Trata-se de atender a um dos principais gargalos do setor, que por sua vez é um dos grandes incentivadores do crescimento do PIB nacional. Enquanto o PIB cresce ao ritmo de 6% ao ano, a construção civil cresce ao ritmo de 9,5%. Estamos convictos de que o setor vai continuar crescendo pois seus fundamentos transcendem essa crise. Três fatores comprovam isso: as operações de credito, que hoje equivalem a apenas 3% do PIB e em 10 anos devem chegar a 15%; os investimentos no PAC [Programa de Aceleração do Crescimento], que o governo já anunciou que serão mantidos; e o enorme déficit habitacional do pais, que hoje é de 8 milhões de residências."
Milton Vargas, vice-presidente executivo do Bradesco
"Não podemos pensar a curtíssimo prazo. Estamos muito otimistas a médio e longo prazo em relação à continuidade do crescimento da economia do país nos próximos 10 anos. Não temos dúvidas disso e o Bradesco está muito identificado com esse movimento. Nosso programa de sustentabilidade não é filantropia; é investimento social privado. Há envolvimento dos diretores e de todos os funcionários. A Fundação Bradesco possui mais de 50 anos. O banco é um expoente incomparável em termos de investimento na área sócio-ambiental. Temos projeto de educação, esporte, manutenção de florestas, como o Projeto Amazônico, Mata Adentro, a Fundação Bradesco e o Projeto Finasa. Em termos globais, esses programas recebem mais de R$ 350 milhões por ano, dos quais ações em educação consomem cerca de R$ 200 milhões em valores auditados e que vêm crescendo ano-a-ano. E os investimentos vão continuar acompanhando os resultados do banco. Como eles vêm sempre crescendo, considero prematuro pensar que teremos alguma mudança nesse ritmo. Nossos projetos são todos produtos muito vinculados ao banco, estão em nosso DNA. Já passamos por várias crises piores no país e nossos projetos se mantiveram. Não será uma crise de um ano que vai mudar isso."
Antonio Matias, vice-presidente do Itaú
"Exatamente nos momentos de crise que se torna mais clara a necessidade da séria agenda de sustentabilidade nas organizações porque esse esforço lhes assegura as condições para superar todos os tipos de cenários. A visão do Itaú é de que o mais importante numa empresa é a perenidade e a sustentabilidade de seus resultados. Por isso, nossa agenda de sustentabilidade não será reduzida, pelo contrário, será reforçada. Não há um orçamento específico, mas os investimentos serão mantidos, são mais de R$ 100 milhões anuais no total. No caso dos investimentos sociais da Fundação Itaú, em torno hoje de R$ 50 milhões anuais, com certeza serão até superiores no próximo ano porque o patrimônio da fundação gera recursos para as ações. O Instituto Itaú Cultural também não terá seu orçamento reduzido. Ele está em discussão e serão criados outros projetos."
Antônio Pita de Abreu, diretor-presidente da EDP
"Consideramos que os investimentos em projetos de sustentabilidade são recorrentes e orgânicos, fazem parte das atividades normais da empresa. Não há nenhuma previsão de alteração nem de rumo nem de ritmo, volume ou valor. Nosso plano é que em 2009 e 2010, os investimentos se mantenham na mesma proporção. O orçamento anual do Instituto EDP Energias do Brasil, criado em novembro de 2007, abrange 0,1% do faturamento da empresa, percentual que este ano está sendo estimado em R$ 9 milhões. Esse valor está sendo investido principalmente nos projetos Letras de Luz e Dentistas do Bem, ambos voltados a crianças e adolescentes de baixa renda, e no Prêmio Energias na Arte, de estímulo à arte contemporânea. Estamos estudando formas de obter um autofinanciamento, sendo uma delas a venda de crédito de carbono, que implica em menor pressão e restrição às nossas atividades. Nossa estimativa é de que a venda de crédito de carbono podem vir a equivaler a 20% do orçamento do instituto, ou seja, em torno de R$ 1,8 milhão. Além disso, temos também vários investimentos via lei de incentivo, como a Lei Rouanet, e cerca de R$ 40 milhões investidos em ações de compensação e minimização de impacto ambiental."
Jorge Luiz Busato, vice-presidente da AES Tietê
Como a sustentabilidade é uma estratégia da empresa, não vemos por que mudar em função de uma crise conjuntural. Vamos continuar na linha do orçamento anual com projetos que recebem mais investimento, como a Casas da Cultura e Cidadania, voltadas a educação de crianças e adolescentes de várias localidades, e também à área de meio ambiente, como o reflorestamento de bordas dos rios - cujo valor investido pela AES Tietê é de quase quatro vezes o obrigatório [pela lei, a empresa é obrigada a reflorestar um total de 12 mil hectares nos próximos cinco anos]. Por enquanto, não temos definido nenhum tipo de corte. Nossa intenção é manter o programa porque fazem parte da forma que a Tietê buscou para dar sustentabilidade social e ambiental à empresa.