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El-Assal, do CBoC: a imigração é vital para o Canadá

Camila Almeida No ano que vem, 300.000 novos imigrantes poderão entrar no Canadá. A notícia foi dada esta semana pelo ministro de Imigração do país, John McCallum. Dessas vagas, 14% – ou 42.000 – serão destinadas a refugiados. O número é baixo se comparado à Alemanha, que recebeu mais de 1 milhão de refugiados no […]

KAREEM EL-ASSAL: Pesquisador fala do programa canadense para receber cada vez mais imigrantes / Arquivo Pessoal

KAREEM EL-ASSAL: Pesquisador fala do programa canadense para receber cada vez mais imigrantes / Arquivo Pessoal

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Da Redação

Publicado em 3 de novembro de 2016 às 11h28.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h46.

Camila Almeida

No ano que vem, 300.000 novos imigrantes poderão entrar no Canadá. A notícia foi dada esta semana pelo ministro de Imigração do país, John McCallum. Dessas vagas, 14% – ou 42.000 – serão destinadas a refugiados. O número é baixo se comparado à Alemanha, que recebeu mais de 1 milhão de refugiados no ano passado, mas é alto em relação à média do Canadá. Na última década, o país recebeu 25.000 refugiados todos os anos.

Para o pesquisador Kareem el-Assal, do The Conference Board of Canada (CBoC), a política canadense de acolhimento a refugiados e imigrantes é consistente, duradoura e está em plena expansão. De acordo com a pesquisa mais recente da instituição, que se dedica a construir estratégias para que a economia do país seja cada vez mais competitiva, o país vai precisar receber 350.000 imigrantes todos os anos, até 2030, para compensar o envelhecimento da população. Na edição de 29 de outubro da revista The Economist, o país aparecia na capa, como “exemplo para o mundo”.

Em entrevista a EXAME Hoje, Kareem el-Assad, especialista em imigração, falou sobre a necessidade de receber mais imigrantes, da seleção de pessoas para a classe econômica, das políticas para refugiados canadenses e do porquê não ser possível comparar a abertura a refugiados do Canadá com a de países europeus.

O ministro disse que, para o ano que vem, o Canadá tem o plano de receber 300.000 imigrantes. Por que esse número? E por que não mais pessoas?

Esse número já é bem alto para o Canadá. É o mais alto desde 1913 – em mais de 100 anos. Precisamos ter isso em mente quando nos questionamos porque o número não é maior. Mas o Canadá vai precisar receber mais imigrantes no futuro. Baseado no relatório do Conference Board, acreditamos que o Canadá vai precisar de 350.000 imigrantes por ano até 2030. A população está envelhecendo muito rapidamente, como em todos os países da OCDE. Cerca de 25% dos trabalhadores canadenses vão se aposentar nos próximos 20 anos, o que equivale a 4,5 milhões de pessoas a menos num mercado de trabalho de 19 milhões de pessoas. E é impossível substituir as pessoas que estão se aposentando naturalmente. A taxa de natalidade do Canadá é muito baixa – é apenas a 181ª do mundo, com 1,6 filhos por família. Nós precisamos de mais imigrantes para manter essa força de trabalho e para crescer a população. O maior benefício é a geração de mais atividade econômica e o aumento da arrecadação, que possibilita mais investimento nas áreas sociais, como saúde e educação.

O Canadá já está fazendo várias campanhas para atrair novos moradores. As universidades têm incentivado intercâmbios, empresas têm chamado trabalhadores de fora. Essas políticas têm conseguido atrair mais pessoas?

Nós temos muito mais pessoas tentando migrar para o Canadá do que vagas disponíveis. A demanda global é gigantesca. Até a pouco, qualquer imigrante que quisesse vir para o Canadá como um imigrante econômico tinha que esperar na fila por sete anos. Em janeiro de 2014, o governo instituiu o sistema de entrada express, uma plataforma de imigração online, com um formulário tão simples quanto o de uma vaga de emprego. O tempo de espera caiu para seis meses. A maioria dos imigrantes que entra no país na classe econômica são muito bem preparados. Eles têm educação universitária e são trabalhadores experientes.

O que são os imigrantes econômicos? Como funciona essa categoria?

O Canadá tem três categorias de imigrantes. A primeira é a categoria econômica, que reúne os imigrantes que o país aceita por acreditar que eles vão contribuir para o crescimento econômico. São cerca de 65% dos imigrantes que chegam ao Canadá. A segunda é a classe família, composta pelos imigrantes que têm parentes no Canadá e querem se juntar a eles – representam cerca de 25% dos imigrantes. A terceira categoria é de refugiados, que representam 10% dos imigrantes que chegam ao Canadá todos os anos.

Então as 300.000 vagas que o Canadá anunciou para o ano que vem como medida de apoio aos refugiados não são vagas para refugiados?

Não, são para as três categorias que eu mencionei. Para 2017, 58% serão econômicos, 28% familiares e 14% refugiados.

Mas se o Canadá está precisando de pessoas e se existe uma crise global de migração, com pessoas precisando se estabelecer em outros lugares, por que o país não aumenta a porcentagem para refugiados?

Esse número já é alto para o que o Canadá costuma receber anualmente. Nos últimos dez anos, temos recebido uma média de 25.000 refugiados por ano. Para o próximo ano, o plano é receber mais de 42.000. Em relação à crise ao redor do mundo, o Canadá já está atuando. Desde que a guerra do Iraque estourou, em 2003, o Canadá se comprometeu a receber refugiados iraquianos; o mesmo com os afegãos, desde 2001. E, no último ano, o Canadá recebeu 31.000 refugiados da Síria. O Canadá tem sido um grande receptor de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial, é importante olhar esse comprometimento histórico nos últimos 60 anos. Tem sido um compromisso consistente.

Você acredita que o Canadá poderia estar fazendo mais para o próximo ano? Por que, quando a gente olha para a Alemanha, que já recebeu mais de 1 milhão de refugiados, não parece que o país poderia estar ampliando ainda mais esses esforços?

Eu acho que o Canadá já demonstrou comprometimento significativo. Não é justo comparar o Canadá com países da Europa porque lá o que está acontecendo é um fluxo de entrada muito grande de imigrantes ilegais, sem que esses países tenham políticas ou lugares para recebê-los. É menos planejado na Europa que no Canadá. É benéfico para os refugiados que o sistema seja assim, porque significa que o país está recebendo as pessoas com as condições para que elas recebam todo o suporte necessário. O governo gasta muito dinheiro todos os anos para ajudar os refugiados a se integrarem à sociedade e muitos deles se tornam muito bem-sucedidos.

Como é a política de integração de refugiados no Canadá? Vocês têm campos de refugiados?

Não, absolutamente não. Nós não temos campos. Essa é a vantagem da proposta canadense: nos asseguramos de que temos casas o bastante para que eles estejam bem cuidados e seguros; os refugiados recebem um ano de apoio financeiro, para que possam se estabelecer, colocar comida na mesa, comprar remédios, roupas para os filhos; eles também recebem três anos de aulas de inglês ou de francês, o que é muito importante para a integração; e o Canadá é muito bom em dar cidadania aos refugiados. Cerca de 87% de todos os imigrantes e refugiados que chegam ao Canadá se tornam cidadãos em cerca de 4 anos. Agora, o governo está mudando a lei para que a cidadania seja entregue em três. E, mesmo que o Canadá seja um país rico, é importante lembrar que é um país muito pequeno. A população é de apenas 36 milhões de pessoas. Com um PIB de 1.7 trilhão de dólares, gastamos centenas de milhões de dólares todos os anos em assistência ao desenvolvimento de outros países do mundo e mais centenas de milhões de dólares para receber refugiados.

E como tem sido a integração desses refugiados ao mercado de trabalho? 

Os refugiados são trazidos ao Canadá com base em suas necessidades, não em suas habilidades. A gente não pergunta se a pessoa fez faculdade ou se ela fala inglês. Vemos se ela precisa de ajuda e nos certificamos de que, uma vez aqui, ela seja integrada economicamente. O que nós descobrimos é que as rendas e os trabalhos dos refugiados não são tão bons que o de outras classes de imigrantes. Eles geralmente ganham salários menores que outros imigrantes. Entretanto, depois de cinco ou dez anos, a renda deles começa a melhorar. E isso é porque, depois de um certo período de tempo, eles melhoram suas habilidades linguísticas, talvez tenham avançado na educação, talvez tenham criado redes maiores que os ajudam a encontrar empregos melhores. Então, ao longo do tempo, eles são melhor integrados à economia.

É possível saber os benefícios que os imigrantes têm trazido à economia canadense? Essas políticas já têm produzido resultados mensuráveis?

É muito difícil de medir porque o Canadá é um país muito novo. Ano que vem é o aniversário de 150 anos do país. E a população ainda é muito pequena. Porém, há amplo consenso entre governo, pessoas e empresas de que imigração é bom para o Canadá. Vou te dar uma estatística: 8 em cada 10 pessoas no Canadá acreditam que a imigração é boa para a economia. É um número muito alto. A razão pela qual o Canadá é capaz de selecionar ou admitir 300.000 imigrantes todos os anos é porque há suporte da população e porque há evidências de que precisamos de mais pessoas devido às aposentadorias que virão. A imigração vai ser absolutamente vital para a economia canadense.

Em que setores vocês precisam de mais pessoas trabalhando?

O que ouvimos das empresas é que eles querem políticas mais flexíveis, para contratar mais rápido. Sobre os setores: as empresas sentem que podem usar mais imigrantes na área de ICT (Informação, Comunicação e Tecnologia) e é onde mais precisam de trabalhadores de modo geral. Também tem sido difícil contratar executivos. Imagine que você quer contratar alguém para pagar um salário de 1 ou 2 milhões de dólares por ano. Pouquíssimas pessoas no mundo estão aptas a ocupar um cargo como esse. Então, as empresas precisam ter a capacidade de procurar essas pessoas lá fora e trazê-las rapidamente, mas elas acham que o nosso sistema de imigração pode ser muito lento. Esta semana, o ministro da economia anunciou uma nova política, para que as empresas consigam trazer profissionais muito capacitados e especializados em apenas duas semanas. Essa política não é para imigrantes, mas para trabalhadores temporários.

E sobre o sistema de seleção de imigrantes: ele pode ser racista ou xenofóbico? Vocês estão conseguindo diversidade por meio desse processo?

Nosso sistema eliminou a discriminação na decáda de 1960. Em 1967, o avanço mais importante na história do sistema de imigração canadense foi alcançado, quando introduzimos o point system, que eliminou qualquer enviesamento na seleção. Qualquer pessoa do mundo pode aplicar, e o ranqueamento é feito com base em educação, domínio língua, idade, tamanho da família. O Canadá estatisticamente é um dos países mais diversos do planeta. Uma em cada cinco pessoas que vivem aqui nasceram em outro país. Toronto, de onde eu sou, é uma das cidades mais diversas que você pode visitar no mundo: 50% das pessoas são de fora. Andar pelas ruas é como andar por uma assembleia geral da ONU. Essa é a beleza do Canadá. Somos muito abertos às pessoas do mundo inteiro. O governo fez uma pesquisa, anos atrás, em que perguntava: você se sente mais leal ao Canadá ou ao país onde nasceu? E 77% das pessoas se diziam mais leais ao Canadá. Uma vez que as pessoas estão aqui e têm a oportunidade de serem bem-sucedidas, elas são muito gratas ao país.

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