Soldado das Forças Militares da Ucrânia caminha em uma trincheira na linha de frente com separatistas apoiados pela Rússia perto de Avdiivka, Donetsk, sudeste da Ucrânia, em 9 de janeiro de 2022. (Anatolii STEPANOV/AFP)
Bloomberg
Publicado em 24 de janeiro de 2022 às 12h05.
Carente de energia, a Europa tenta estimar o tamanho do estrago no caso de a Rússia invadir a Ucrânia. Esse cálculo depende muito da reação do presidente dos EUA.
A Rússia enviou gás para a Europa durante toda a Guerra Fria e após a anexação da Crimeia no período mais recente. Dificilmente o governo russo colocará em risco a reputação do país como fornecedor confiável de energia, segundo a Uniper, que é uma das maiores compradoras de gás russo na Europa.
No entanto, Joe Biden alertou para severas restrições econômicas se tropas russas entrarem na Ucrânia. O fluxo de gás para a Europa seria ameaçado por sanções que impeçam a Rússia de fazer negócio em moeda estrangeira ou por outras restrições bancárias.
“Temos que nos preparar para quase todos os cenários”, afirmou Gregor Pett, vice-presidente executivo de análise de mercado da Uniper, em entrevista.
Alguns desses cenários são discutidos a seguir. O continente depende da Rússia para obter cerca de um terço do gás que consome. A Europa já enfrenta sua pior crise de energia desde a década de 1970 e os estoques de gás estão perigosamente baixos. Os preços mais que dobraram nos últimos seis meses, com temores de guerra e de limitação dos suprimentos da Rússia — apesar das repetidas afirmações do presidente Vladimir Putin de que não planeja invadir a Ucrânia.
Potências ocidentais avisaram que podem desconectar a Rússia do sistema de pagamentos internacionais Swift, ainda que a ideia enfrente oposição de vários países europeus.
Bancos russos também podem ser alvo das restrições, mas com a possibilidade de isenções para preservar as transações de energia — muitas das quais são realizadas em dólares ou euros.
No cenário mais extremo, a Gazprom poderia retaliar sanções cortando o fornecimento de gás à Europa. Isso paralisaria os sistemas de energia do continente e provocaria enorme aumento dos preços. Para muitos especialistas, é improvável que a Rússia vá tão longe.
No caso de uma invasão, o recém-construído Nord Stream 2, gasoduto multibilionário que liga a Rússia à Alemanha, pode ser prejudicado. A expectativa era que o gasoduto submarino aumentasse o fornecimento de energia, mas seu processo de aprovação virou palco de disputas políticas acirradas.
Biden apoia sanções ao Nord Stream 2 no caso de uma invasão, mas o governo do novo chanceler alemão, Olaf Scholz, sinalizou que uma escalada da crise pode significar o fim do gasoduto.
Talvez a maior incerteza seja o que acontece com a enorme quantidade de gás que a Rússia transporta através da Ucrânia. Moscou poderia interromper esses fluxos no caso de um conflito, disse Volodymyr Omelchenko, chefe de pesquisa de energia no Centro Razumkov da Ucrânia. Isso daria à Rússia influência para “impor suas condições à Ucrânia e à União Europeia”.
Trata-se do cenário menos provável, na visão de Omelchenko. “Isso só é possível se a tubulação for danificada”, disse ele. Mas a Rússia poderia usar essa situação para promover o Nord Stream 2.
Embora os fluxos de gás russo para a Europa tenham sido interrompidos no passado durante disputas com a Ucrânia em torno de preços, esses fluxos ficaram praticamente constantes mesmo após a anexação da Crimeia em 2014.
No entanto, os riscos são enormes, com consequências para os preços. Se o trânsito ucraniano for afetado, não será fácil substituir esses volumes de gás.
Em qualquer conflito, há risco de danos à infraestrutura — de propósito ou por acidente. Isso pode afetar a oferta e os preços na Europa durante muitos anos.