Chipre: operação turca no Chipre causou mais de quatro mil mortes (REUTERS/Yorgos Karahalis)
Da Redação
Publicado em 18 de julho de 2014 às 09h09.
Nicósia - O Chipre lembra no domingo o 40º aniversário da invasão turca ao norte do país, que causou a separação das comunidades greco e turco-cipriotas e na divisão da ilha.
Em 20 julho de 1974, cinco dias depois de o Chipre enfrentar um golpe de Estado organizado pela junta militar grega, Ancara enviou suas tropas ao norte do país, dando início à chamada "operação Attila", que buscava, segundo o governo turco, restabelecer a ordem constitucional.
"Estávamos em um campo militar na montanha de Pentadaktilos quando nos demos conta de que aviões turcos bombardeavam a cidade de Kerinia (no norte). De onde estava naquele momento, podia ver o mar e consegui contar à primeira vista 35 embarcações", contou à Agência Efe, Filippos Filippu, de 59 anos.
O greco-cipriota Fillippu não se esquece o momento em que um dos aviões começou a metralhar o campo onde estava.
"Morreram pelo menos 30 pessoas das cem que estavam lá. Não consigo esquecer os gritos do homem que morreu ao meu lado", relatou.
Um mês depois, a Turquia dava por encerrada a operação, que causou mais de quatro mil mortes, deixou 1.500 desaparecidos e 240 mil deslocados - greco-cipriotas expulsos do norte, e turco-cipriotas, do sul.
Três anos depois, começaram as primeiras negociações entre o então presidente greco-cipriota, Makarios III, e o líder turco-cipriota, Raouf Denktash.
A proclamação unilateral da República Turca do Norte do Chipre (RTNC) na parte norte da ilha, em 1983, complicou ainda mais a questão cipriota, embora o Estado tenha sido reconhecido somente pela Turquia.
Ao longo das décadas, o diálogo entre as duas comunidades, realizado sob apoio da ONU, sofreu altos e baixos, e em 2004 o Chipre até chegou a flertar com a possibilidade de uma reunificação, com o denominado Plano Annan, que, no entanto, foi rapidamente abandonado quando a parte greco-cipriota se negou a aceitá-lo em um referendo.
Muitos analistas veem pouco sentido nestas negociações, porque consideram o problema é que "a parte greco-cipriota nunca pôde negociar com a fonte da anomalia, que era a Turquia", alegou à Agência Efe Jristos Iakovu, diretor do centro de estudos políticos greco-cipriota Kykem.
"O que foi possível nestes 40 anos de negociações bicomunais?" perguntou Iakovu, que considera que o tempo joga a favor da Turquia que "através da tática da estagnação põe em prática seus interesses estratégicos".
Outra questão espinhosa, surgida nos 40 anos de ocupação, é a inserção no norte de mais de 200 mil colonos trazidos da Anatólia, o que alterou substancialmente o caráter demográfico do norte.
À imigração de turcos na RTCN se uniu a emigração de muitos turco-cipriotas que se viram obrigados a buscar um futuro melhor fora de casa, na Grã-Bretanha ou na Austrália, como consequência da crise econômica que afetou o norte do Chipre por ficar internacionalmente isolado.
Nos 40 anos da invasão, alguns cipriotas - tanto no norte como no sul - recuperaram o sonho de voltar a conviver em paz uns com os outros, como fizeram durante séculos.
"Uma recente visita à ilha grega de Chios (próxima à costa da Turquia) me fez repensar sobre nosso problema", disse à Efe Andreas Ioannu, um deslocado greco-cipriota de 77 anos, nascido em Famagusta, no norte do país.
"Vi que lá ensinam turco, que nas lojas também falam turco. Vendo isso, disse a mim mesmo: por que não podemos viver em harmonia? Claro que podemos", acrescentou.
Foi com essa simplicidade que Ioannu resumiu o sentimento de muitos deslocados: "Sim para a reunificação, para a convivência pacífica com os verdadeiros turco-cipriotas. Que nos deixem voltar aos nossos lares, que nos deixem viver em paz para desfrutar desta nossa terra".
Como trabalhar com um possível retorno de deslocados, a devolução ou indenização das terras desapropriadas, são alguns dos muitos pontos que precisarão ser resolvidos nas recém retomadas negociações para a reunificação.