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Caso Chevron pode complicar planos do Brasil em petróleo

O vazamento poderá atrasar ainda mais a concessão de novas áreas de exploração e aumentar o poder da estatal Petrobras às custas de outras companhias petrolíferas

O Brasil não vende novos direitos sobre o petróleo em alto-mar na região próxima ao Rio de Janeiro e a São Paulo desde 2007 (Arquivo/EXAME)
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Da Redação

Publicado em 24 de novembro de 2011 às 12h14.

Rio de Janeiro - O vazamento de petróleo da Chevron na costa brasileira expõe os grandes riscos ambientais da exploração da nova riqueza petrolífera do país e poderá adiar ainda mais o desenvolvimento do setor ao alimentar uma política nacionalista para o petróleo.

O acidente, pelo qual a empresa petrolífera norte-americana assumiu responsabilidade, rapidamente tornou-se uma questão política, no momento em que o Rio de Janeiro e outros Estados "produtores" travam uma dura campanha contra uma proposta que está no Congresso e prevê uma divisão mais ampla da riqueza obtida com o petróleo.

Ao chamar atenção para os riscos ambientais da exploração em profundidades tão grandes, o vazamento poderá atrasar ainda mais a concessão de novas áreas de exploração e aumentar o poder da estatal Petrobras às custas de outras companhias petrolíferas -- nacionais e estrangeiras.

"A realidade é que esse vazamento vai acelerar a politização da indústria do petróleo no Brasil", afirmou o geólogo Cleveland Jones, do Instituto Nacional de Óleo e Gás da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).

"Não teremos uma discussão real sobre os riscos e benefícios da exploração de petróleo em alto-mar, mas uma discussão política idiota. O risco político vai aumentar na indústria." Um dos primeiros resultados do vazamento pode ser o adiamento ainda maior das vendas de direitos de exploração de petróleo na região do pré-sal, disse Adriano Pires, chefe do Centro Brasileiro de Infraestrutura, um grupo de pesquisas em energia sediado no Rio de Janeiro.

O Brasil não vende novos direitos sobre o petróleo em alto-mar na região próxima ao Rio de Janeiro e a São Paulo desde 2007, evitando que as companhias expandam suas atividades em uma área já responsável por mais de 80 por cento da produção de petróleo brasileira, de 2,1 milhões de barris por dia.

Pré-sal - A área do pré-sal pode ter 100 bilhões de barris de petróleo ou mais, de acordo com um estudo do Instituto Nacional de Óleo e Gás. A quantidade é suficiente para abastecer todas as necessidades dos EUA -- o maior consumidor de petróleo do mundo -- durante mais de 14 anos.


Sem concessões novas para comprar, muitas petrolíferas que se instalaram no Brasil há uma década para desenvolver a costa brasileira provavelmente irão embora, afirmou Pires.

"Há muitas pessoas no governo que não querem vender novas concessões, mesmo que por lei a Petrobras seja a líder de qualquer operação nova no pré-sal," disse Pires.

"Eles adiaram as novas vendas para o ano que vem, mas se tivermos agora um debate sobre as novas regras ambientais para o offshore, ele será adiado ainda mais." O Congresso brasileiro aprovou uma reforma legal do setor de petróleo em dezembro do ano passado que faz da Petrobras, já o ator dominante do setor, a operadora de todos os novos projetos do pré-sal com o direito de no mínimo uma parcela de 30 por cento.

A Chevron diz que o vazamento -- causado por ter subestimado a pressão de um reservatório de petróleo em alto-mar e por ter superestimado a força da rocha nas proximidades - foi de 2,4 mil barris no total e que já vedou a ruptura.

Embora tenha sido bem menor que o desastre da Deepwater Horizon, de 4 milhões de barris, no Golfo do México em 2010, o acidente coloca em evidência os desafios tecnológicos e os riscos ambientes da exploração do petróleo a uma profundidade de até 3 quilômetros debaixo do mar e outros 3 a 4 quilômetros abaixo do leito do mar - um desafio frequentemente comparado aos de uma viagem espacial.

De acordo com George Buck, o chefe da unidade local da Chevron, os sistemas de perfuração funcionaram corretamente, apesar de não terem antecipado a pressão no reservatório de petróleo. O vazamento ocorreu tão longe da plataforma de perfuração que a Chevron inicialmente pensou que ele vinha de uma plataforma próxima da Petrobras ou de um oleoduto da Petrobras no fundo do mar.

Isso suscita questões sobre as alegações feitas pelo governo do Brasil e pela Petrobras de que a perfuração na costa brasileira seja tão segura como eles dizem ser e de que não representam risco ambiental, afirmou Pires.

Debate amargo - A Petrobras - a mais experiente em perfuração na bacia de Campos, onde ocorreu o vazamento, e que por isso foi procurada como parceira pela Chevron - esteve envolvida na aprovação de todos os projetos de exploração usados pela empresa norte-americana.


"A exploração em alto-mar traz um perigo inerente e a perfuração em águas profundas é ainda mais perigosa," disse Pires. "Se você quiser terminar com os vazamentos, você tem de proibir a perfuração no mar." A reação ao vazamento colocou em evidência uma corrente nacionalista na política brasileira para o setor de petróleo.

Embora a Chevron não seja a única proprietária do projeto, foi a única empresa que detém ações no campo que foi atacada por autoridades do governo.

O chefe da Agência Nacional do Petróleo (ANP), que regula o petróleo brasileiro, disse na segunda-feira que apenas a Chevron - e não seus parceiros, a Petrobras e o grupo japonês Frade Japão - será multada pelo vazamento. A Chevron já foi multada em 50 milhões de reais e é objeto de uma investigação da Polícia Federal.

De acordo com a lei brasileira, todos os membros de uma parceria de petróleo são responsáveis "em conjunto e severamente" pelo seu campo ou por sua concessão, disse Marilda Rosado De Sá Ribeiro, advogada de direitos do petróleo e sócia do escritório de advocacia Dória, Jacobina, Rosado, Godinho, no Rio de Janeiro.

Com base no preço do petróleo bruto mexicano Maya em torno de 104 dólares, a multa de 50 milhões de reais da Chevron equivale mais ou menos a 3 dias e meio de produção do campo do Frade, que segundo a Chevron produz 79 mil barris por dia.

Governo do Estado pode abrir ação - O governo do Estado do Rio de Janeiro também planeja obter 100 milhões de reais da Chevron por meio de uma ação civil, de acordo com o secretário do Meio Ambiente Carlos Minc.

O clamor sobre o vazamento caiu no meio de um amargo debate nacional sobre o futuro dos royalties do petróleo.

O Congresso deve aprovar um projeto para repartir os royalties do petróleo de uma forma mais igualitária entre os Estados e municípios - e não apenas pelos Estados produtores. O Estado do Rio diz que prevê perder cerca de 7 bilhões por ano, dinheiro que diz ser necessário para preparar a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 - e para lidar com eventuais acidentes ambientais na sua costa.

O secretário do Meio Ambiente do Rio, Carlos Minc, tem sido o crítico mais atuante da Chevron, ameaçando retirar a licença da Transocean , a operadora da plataforma que detém o equipamento de perfuração da Chevron.

A agência de proteção ambiental do Brasil afirmou que o equipamento de perfuração da Chevron e muitos outros operam sob uma licença federal exclusiva e estão além da autoridade de Minc.

"Isso tem ocorrido há um tempo e agora está acelerando de novo," disse o geólogo Jones.

"Esse vazamento será outra desculpa para limitar o papel de outras empresas que não a Petrobras na indústria de petróleo do Brasil e para os políticos tomarem um controle maior sobre a indústria de petróleo do país." (Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier)

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Rio de Janeiro - O vazamento de petróleo da Chevron na costa brasileira expõe os grandes riscos ambientais da exploração da nova riqueza petrolífera do país e poderá adiar ainda mais o desenvolvimento do setor ao alimentar uma política nacionalista para o petróleo.

O acidente, pelo qual a empresa petrolífera norte-americana assumiu responsabilidade, rapidamente tornou-se uma questão política, no momento em que o Rio de Janeiro e outros Estados "produtores" travam uma dura campanha contra uma proposta que está no Congresso e prevê uma divisão mais ampla da riqueza obtida com o petróleo.

Ao chamar atenção para os riscos ambientais da exploração em profundidades tão grandes, o vazamento poderá atrasar ainda mais a concessão de novas áreas de exploração e aumentar o poder da estatal Petrobras às custas de outras companhias petrolíferas -- nacionais e estrangeiras.

"A realidade é que esse vazamento vai acelerar a politização da indústria do petróleo no Brasil", afirmou o geólogo Cleveland Jones, do Instituto Nacional de Óleo e Gás da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).

"Não teremos uma discussão real sobre os riscos e benefícios da exploração de petróleo em alto-mar, mas uma discussão política idiota. O risco político vai aumentar na indústria." Um dos primeiros resultados do vazamento pode ser o adiamento ainda maior das vendas de direitos de exploração de petróleo na região do pré-sal, disse Adriano Pires, chefe do Centro Brasileiro de Infraestrutura, um grupo de pesquisas em energia sediado no Rio de Janeiro.

O Brasil não vende novos direitos sobre o petróleo em alto-mar na região próxima ao Rio de Janeiro e a São Paulo desde 2007, evitando que as companhias expandam suas atividades em uma área já responsável por mais de 80 por cento da produção de petróleo brasileira, de 2,1 milhões de barris por dia.

Pré-sal - A área do pré-sal pode ter 100 bilhões de barris de petróleo ou mais, de acordo com um estudo do Instituto Nacional de Óleo e Gás. A quantidade é suficiente para abastecer todas as necessidades dos EUA -- o maior consumidor de petróleo do mundo -- durante mais de 14 anos.


Sem concessões novas para comprar, muitas petrolíferas que se instalaram no Brasil há uma década para desenvolver a costa brasileira provavelmente irão embora, afirmou Pires.

"Há muitas pessoas no governo que não querem vender novas concessões, mesmo que por lei a Petrobras seja a líder de qualquer operação nova no pré-sal," disse Pires.

"Eles adiaram as novas vendas para o ano que vem, mas se tivermos agora um debate sobre as novas regras ambientais para o offshore, ele será adiado ainda mais." O Congresso brasileiro aprovou uma reforma legal do setor de petróleo em dezembro do ano passado que faz da Petrobras, já o ator dominante do setor, a operadora de todos os novos projetos do pré-sal com o direito de no mínimo uma parcela de 30 por cento.

A Chevron diz que o vazamento -- causado por ter subestimado a pressão de um reservatório de petróleo em alto-mar e por ter superestimado a força da rocha nas proximidades - foi de 2,4 mil barris no total e que já vedou a ruptura.

Embora tenha sido bem menor que o desastre da Deepwater Horizon, de 4 milhões de barris, no Golfo do México em 2010, o acidente coloca em evidência os desafios tecnológicos e os riscos ambientes da exploração do petróleo a uma profundidade de até 3 quilômetros debaixo do mar e outros 3 a 4 quilômetros abaixo do leito do mar - um desafio frequentemente comparado aos de uma viagem espacial.

De acordo com George Buck, o chefe da unidade local da Chevron, os sistemas de perfuração funcionaram corretamente, apesar de não terem antecipado a pressão no reservatório de petróleo. O vazamento ocorreu tão longe da plataforma de perfuração que a Chevron inicialmente pensou que ele vinha de uma plataforma próxima da Petrobras ou de um oleoduto da Petrobras no fundo do mar.

Isso suscita questões sobre as alegações feitas pelo governo do Brasil e pela Petrobras de que a perfuração na costa brasileira seja tão segura como eles dizem ser e de que não representam risco ambiental, afirmou Pires.

Debate amargo - A Petrobras - a mais experiente em perfuração na bacia de Campos, onde ocorreu o vazamento, e que por isso foi procurada como parceira pela Chevron - esteve envolvida na aprovação de todos os projetos de exploração usados pela empresa norte-americana.


"A exploração em alto-mar traz um perigo inerente e a perfuração em águas profundas é ainda mais perigosa," disse Pires. "Se você quiser terminar com os vazamentos, você tem de proibir a perfuração no mar." A reação ao vazamento colocou em evidência uma corrente nacionalista na política brasileira para o setor de petróleo.

Embora a Chevron não seja a única proprietária do projeto, foi a única empresa que detém ações no campo que foi atacada por autoridades do governo.

O chefe da Agência Nacional do Petróleo (ANP), que regula o petróleo brasileiro, disse na segunda-feira que apenas a Chevron - e não seus parceiros, a Petrobras e o grupo japonês Frade Japão - será multada pelo vazamento. A Chevron já foi multada em 50 milhões de reais e é objeto de uma investigação da Polícia Federal.

De acordo com a lei brasileira, todos os membros de uma parceria de petróleo são responsáveis "em conjunto e severamente" pelo seu campo ou por sua concessão, disse Marilda Rosado De Sá Ribeiro, advogada de direitos do petróleo e sócia do escritório de advocacia Dória, Jacobina, Rosado, Godinho, no Rio de Janeiro.

Com base no preço do petróleo bruto mexicano Maya em torno de 104 dólares, a multa de 50 milhões de reais da Chevron equivale mais ou menos a 3 dias e meio de produção do campo do Frade, que segundo a Chevron produz 79 mil barris por dia.

Governo do Estado pode abrir ação - O governo do Estado do Rio de Janeiro também planeja obter 100 milhões de reais da Chevron por meio de uma ação civil, de acordo com o secretário do Meio Ambiente Carlos Minc.

O clamor sobre o vazamento caiu no meio de um amargo debate nacional sobre o futuro dos royalties do petróleo.

O Congresso deve aprovar um projeto para repartir os royalties do petróleo de uma forma mais igualitária entre os Estados e municípios - e não apenas pelos Estados produtores. O Estado do Rio diz que prevê perder cerca de 7 bilhões por ano, dinheiro que diz ser necessário para preparar a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 - e para lidar com eventuais acidentes ambientais na sua costa.

O secretário do Meio Ambiente do Rio, Carlos Minc, tem sido o crítico mais atuante da Chevron, ameaçando retirar a licença da Transocean , a operadora da plataforma que detém o equipamento de perfuração da Chevron.

A agência de proteção ambiental do Brasil afirmou que o equipamento de perfuração da Chevron e muitos outros operam sob uma licença federal exclusiva e estão além da autoridade de Minc.

"Isso tem ocorrido há um tempo e agora está acelerando de novo," disse o geólogo Jones.

"Esse vazamento será outra desculpa para limitar o papel de outras empresas que não a Petrobras na indústria de petróleo do Brasil e para os políticos tomarem um controle maior sobre a indústria de petróleo do país." (Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier)

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