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Fundos imobiliários refletem um desastre que não houve, diz gestor da Mauá

Para Brunno Bagnariolli, head de Real Estate da Mauá, descolamento de preços dos ativos da economia real no mercado de imóveis traz oportunidades

Nova postura com FIIs: Mauá começa a colocar de novo o pé em segmentos como lajes corporativas e shoppings | Foto: Leandro Fonseca/EXAME (Leandro Fonseca/Exame)

Nova postura com FIIs: Mauá começa a colocar de novo o pé em segmentos como lajes corporativas e shoppings | Foto: Leandro Fonseca/EXAME (Leandro Fonseca/Exame)

Marília Almeida

Marília Almeida

Publicado em 19 de novembro de 2021 às 06h20.

Última atualização em 19 de novembro de 2021 às 06h40.

Fundos imobiliários (FIIs) passa por uma crise. O índice que reflete a performance dos ativos mais negociados do segmento, o IFIX, acumula queda perto de 10% no ano e recuou ao menor patamar desde maio de 2020 nesta quinta-feira, dia 18. Mas não aconteceu um desastre no mercado imobiliário para que os FIIs sofram todo esse impacto nos preços das cotas, afirma o sócio e head de Real Estate da Mauá Capital, Brunno Bagnariolli.

A Mauá é gestora de dois fundos imobiliários: um de papel, que investe em CRIs (MCCI11), e um fundo de fundos (MCHF11). E tomou uma postura mais defensiva desde o meio da pandemia. Essa cautela se traduziu na saída de fundos de tijolo e na compra de cotas de fundos de CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários), especialmente indexados à inflação. "Era claro para a gente que o CDI só iria subir após a inflação aumentar. Acertamos e a inflação foi muito maior do que imaginamos. Hoje, 85% dos ativos de dívida do fundo de CRIs são indexados à inflação", contou.

A posição em fundos de tijolo do fundo de fundos da gestora, por outro lado, se concentrou em ativos que investem em galpões logísticos. Mas agora com o descasamento de preços das cotas em relação à economia real, Bagnariolli começa a enxergar oportunidades em outros segmentos, como o de shoppings e o de lajes corporativas.

"Continuamos com a maior parte da carteira em CRIs, mas começamos a migrar parte dela para lajes e segmentos mais arriscados, como shoppings. Deixamos de ser conservadores. As lajes estão baratas e mal precificadas. No caso dos shoppings, a perspectiva não é nem de longe boa, mas o descolamento também foi muito grande."

Veja abaixo a entrevista completa do gestor da Mauá concedida à EXAME Invest:

Os fundos imobiliários que investem em CRIs são as estrelas do ano. O dividend yield anualizado médio dos fundos está em cerca de 12%. Isso pode mudar em 2022?

Os FIIs de papel estão se valorizando nos últimos dois anos por dois motivos. O primeiro, por causa da crise econômica, na qual é melhor se posicionar em dívida do que diretamente nos ativos. O segundo motivo é porque os fundos de papel passaram a ser destaque em termos de distribuição de dividendos por causa de alocações felizes dos gestores e também pelo aumento da inflação no país.

A maioria deles têm 2/3 dos ativos posicionados em inflação e 1/3 no CDI, e o repasse da alta dos preços acontece imediatamente nesses fundos. Se o IPCA tem alta de 0,5 ponto porcentual, dois meses depois essa alta estará refletida na distribuição de dividendos desses fundos. Nos fundos de tijolo também existe esse repasse, mas ele é menos tangível. São reajustes de contratos de aluguel, que acontecem anualmente. E esse aumento pode não atingir todos: há negociações para cima e para baixo.

Nesse cenário, novos investidores optaram por fundos de CRIs porque tiveram a impressão correta de que seus resultados seriam majorados pela inflação. Além disso, na crise, esse é o segmento mais defensivo. Como são negociados em bolsa, há uma pressão compradora e a cota sobe. É o único segmento do IFIX que está neste ano no zero a zero depois de se valorizar em 2020. Fundos de papel já representam 40% do IFIX. Antes, a situação era inversa. Há cinco anos, os fundos não representavam nem 20% do índice.

É necessário olhar no detalhe os fundos de papel? Como escolher com mais segurança?

Hoje o mercado já oferece diversos tipos de fundos de CRIs. O investidor tem de olhar risco e retorno. Há os high yield e high grade, os mais híbridos (que também investem em cotas de FIIs) e os menos híbridos.

Em um momento no qual as curvas de juros estavam fechando, os híbridos tinham uma performance melhor: compravam cotas de fundos, que estavam subindo, e faziam muito giro com os ganhos porque os juros estavam caindo. Com os juros subindo e as cotas de fundos caindo fica mais difícil gerar resultados.

Além disso as taxas pagas pelos fundo high grade e high yield se aproximaram, porque houve um movimento nos títulos Tesouro IPCA que se refletiram em uma magnitude diferente entre os dois papéis. Enquanto os papéis high grade repassaram de 50% a 60% da alta de rendimento dos títulos do Tesouro, que subiu de 4% para 5% ao ano, o CRI de risco equivalente subiu de 6% para 6,5%. Ou seja, metade do movimento. Já em títulos high yield o repasse foi quase nulo.

Então, em resumo, temos crédito com bom risco pagando 12% ao ano, algo que no passado era restrito a títulos high yield. Isso torna o risco-retorno de títulos high grade melhor.

Quais as perspectivas para distribuição de dividendos para cada segmento em 2022?

A perspectiva de curto e médio prazo é que os fundos de CRIs, que foram detentores da maior distribuição de dividendos entre os segmentos de FIIs, mantenham esse patamar.

Outro segmento que começa a ter destaque é o de fundos de fundos, que tem o segundo maior dividend yield do IFIX, na casa dos 9% ao ano. Esses fundos sofrem um duplo desconto: estão descontados frente a sua cota patrimonial e investem em cotas de fundos que também estão descontadas em relação ao seu patrimônio. À medida que o mercado se recupera, eles também se destacam.

Os fundos de lajes corporativas estão oferecendo dividendos na casa de 8% ao ano. Não acho que o segmento terá uma performance brilhante, mas essa distribuição de dividendos deve cair porque o preço de suas cotas será reajustado para cima. A concentração de imóveis em regiões premium continua, mesmo com o trabalho híbrido. Por causa dele, o entorno continua sendo importante.

Já o dividend yield dos shoppings está baixo, mas subindo. Atualmente eles pagam de 6% a 7% ao ano aos cotistas. Os shoppings estão sem receita, mas seu faturamento está voltando forte. É o segmento que tem o maior risco de o cenário positivo não se concretizar. Mas, se tudo der certo, será o que mais vai se valorizar.

Por fim, o segmento de logística perde um pouco da atratividade. Os fundos de galpões com bons ativos pagam dividendos menores, entre 6% a 7%, enquanto os medianos pagam 8%. É um setor muito defensivo, mas que tem um risco de sobreoferta. A construção de um galpão demora de um a dois anos. Como o setor está 'bombando' há quase dois anos, devem ocorrer agora muitas entregas de ativos. O reflexo poderá ser o aumento da vacância e redução do dividend yield.

Os fundos de CRIs navegam melhor no atual ciclo da economia. Mas se houver uma deterioração maior do cenário, podem sofrer com a inadimplência das operações de crédito. O investidor deve se preocupar?

Os CRIs são operações estruturadas que têm imóveis como garantia e um bom risco de crédito. Se a operação foi feita da maneira correta, em nível de alavancagem confortável, gera recursos por alocação e o risco de default é baixo. No começo da pandemia houve uma grande preocupação com a inadimplência, mas todos passaram incólumes ao período. Existiram poucas renegociações, mas nenhum default.

Isso acontece porque a economia real do mercado imobiliário não está tão ruim como a percepção. Vemos bons números de lançamentos residenciais, vendas, aluguéis, ocupação e vacância. Não há um desastre no setor.

No segmento de shoppings, por exemplo, os últimos resultados foram bons: os ativos estão recuperando os níveis de venda de 2019. Já vemos também hotéis com ocupação acima de 50%, 70%. Há locações acontecendo em escritórios, enquanto no segmento logístico, o único que não parou, a demanda continua forte. Quando olhamos as negociações, os ativos estão sendo vendidos por bons preços.

Existe hoje um deslocamento grande entre o preço de tela, o ativo financeiro e o preço real desses ativos. No preço de tela há a influência do noticiário ruim, que inclui risco fiscal, política, juros, dólar e inflação. Mas na economia real essa desvalorização não acontece na mesma intensidade. Existem coisas boas por bons preços. Quando o mercado está aquecido, elas ficam caras.

Com queda dos juros e inflação baixa, os FIIs decolaram entre os investidores. Eles estavam preparados para o repique? O que é necessário saber sobre o produto? 

O segmento de fundos imobiliários ainda é um mercado em amadurecimento. Está mais maduro do que há cinco anos, mas ainda costuma negociar com correlação maior a componentes macroeconômicos a despeito de seus fundamentos. Sempre será impactado pela Selic. Se a taxa básica de juros fica abaixo de 7% ao ano, se torna pujante. Acima de 9%, o mercado se retrai.

Os FIIs são comparáveis a alternativas de renda fixa e pagam, em média, entre 7% e 9% ao ano em dividendos. Em alguns momentos pagam mais, em outros, menos. Ter 9% de renda isenta de Imposto de Renda é bacana, mas o pequeno investidor olha o CDI futuro a 11% e fica ressabiado. Mas não necessariamente esse pensamento está correto. A referência não deveria ser o CDI, mas o Tesouro IPCA. Se comparar com esses títulos do Tesouro, os FIIs estão pagando quatro pontos porcentuais acima. Isso é atrativo.

Mais investidores devem entrar em FIIs, mas essa velocidade irá diminuir, enquanto mais gente irá sair.

Nos últimos anos, houve um crescimento nas emissões de FIIs. Em 2020, verificou-se um recorde no volume e no número de ofertas. É esperado que elas diminuam no ano que vem por causa das incertezas do cenário?

Já existem ofertas que estão sendo canceladas. Tem menos gente entrando no segmento, menos dinheiro novo, e os fundos estão negociando com menos ágio, um componente importante da maioria das emissões.

O mercado está com dificuldade de crescer e a janela de emissões fechou parcialmente. Mas temos ainda uma janela boa, ainda que curta, no começo do ano que vem. Isso acontecerá por causa do arrefecimento de expectativas para a eleição, que foi muito antecipada pelo mercado. Essa janela deve durar, no máximo, até maio.

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