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Mesmo com redução da Selic, juros do crédito caem em ritmo lento

A taxa média de juros para as famílias caiu 23,6%, ao passar de 74,33% ao ano, em outubro de 2016

A taxa do cheque especial, uma das modalidades de crédito mais caras, passou de 328,52% para 320,96% ao ano (eranicle/Thinkstock)

A taxa do cheque especial, uma das modalidades de crédito mais caras, passou de 328,52% para 320,96% ao ano (eranicle/Thinkstock)

AB

Agência Brasil

Publicado em 16 de junho de 2018 às 16h24.

Mesmo com a redução da taxa básica de juros do país, a Selic, para o menor nível histórico, os juros do crédito ao consumidor caem em ritmo lento. Na próxima semana, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) vai definir a Selic novamente e a expectativa do mercado financeiro é de manutenção da taxa em 6,5% ao ano.

Em maio, após um ciclo de cortes que começou em outubro de 2016, o Copom optou por manter a Selic em 6,5% ao ano. No início desse ciclo de reduções, a taxa passou de 14,25% para 14% ao ano. Entre outubro de 2016 e março deste ano, quando ocorreu o último corte, a Selic caiu 54,4%.

Enquanto isso, a taxa média de juros para as famílias caiu 23,6%, ao passar de 74,33% ao ano, em outubro de 2016, para 56,79% ao ano, em abril de 2018. A taxa do cheque especial, uma das modalidades de crédito mais caras, passou de 328,52% para 320,96% ao ano.

No Relatório de Econômica Bancária, divulgado esta semana, o BC explicou que a Selic afeta os juros do crédito por meio de seu efeito no custo de captação, que é o custo que as instituições têm para conseguir dinheiro. "Entretanto, o custo de captação é uma média de diversas taxas de captação, que possuem maior ou menor ligação com a taxa Selic", diz o BC.

Por exemplo, quando o dinheiro para os empréstimos vêm das cadernetas de poupança, o custo de captação está "bastante" ligado à taxa básica, quando a Selic está abaixo de 8,5% ao ano. Isso acontece porque a remuneração da poupança muda quando a Selic está abaixo de 8,5% ao ano.

"O custo médio de captação depende também do volume de depósitos à vista, que não possuem qualquer remuneração - e, portanto, nenhuma conexão com a taxa Selic. Mas o custo de captação das instituições financeiras envolve também a remuneração de instrumentos de captação bastante ligados à taxa Selic, como CDBs [Certificados de Depósito Bancário] indexados ao CDI [Certificado de Depósito Interbancário]", diz o BC.

Segundo a instituição, mesmo que reduções na taxa Selic sejam repassadas integralmente para as taxas de juros das operações de crédito, a queda nos custos do crédito será menor que dos juros básicos. Isso porque a Selic é apenas um dos ingredientes na formação do custo de crédito. "E, quanto menor for a participação da Selic no custo do crédito, como no caso de modalidades com altas taxas de inadimplência, menor será o impacto em termos percentuais", diz o relatório.

Na composição das taxas de juros, segundo o BC, o custo da inadimplência responde pela maior parte (38,27%), depois vêm as despesas administrativas (25,55%) dos bancos, os tributos (22,13%) e o lucro (14,04%).

Concentração bancária

Para o professor de Finanças da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV) Fabio Gallo, os juros poderiam estar mais baixos porque além de a Selic estar menor, a inadimplência das pessoas físicas também caiu: passou de 6,16%, em outubro de 2016, para 5,08%, em abril de 2017. "Realmente a inadimplência é alta, mas tem sido estabilizada para baixo nos últimos anos. Ainda temos perto de 60 milhões de brasileiros negativados, mas esse número não tem crescido", disse Gallo.

Para o professor, o problema está na concentração bancária, com poucos bancos atuando no mercado. Em 2017, os quatro maiores bancos do país - Itaú-Unibanco, Bradesco, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal - concentraram 78,51% do crédito do país. "A concentração bancária explica muito isso. Os bancos podem manter o nível de ganhos como desejarem", diz Gallo.

O diretor executivos de estudos e pesquisas da Associação Nacional dos Executivos em Finanças (Anefac), Miguel José Ribeiro de Oliveira, também atribui à concentração bancária a dificuldade em reduzir os juros mais rapidamente para o consumidor.

Ele destaca que houve muitas incorporações de bancos nos últimos anos, reduzindo o número de participantes no mercado. Ele cita também outros fatores, como baixa oferta de crédito, carga tributária alta e os depósitos compulsórios (recursos que os bancos são obrigados a deixar depositados no BC). No caso dos depósitos compulsórios, ele lembra que recentemente o BC reduziu o volume que precisa ser recolhido pelos bancos.

Para o BC, maior concorrência entre os bancos não requer necessariamente menor nível de concentração bancária. "O Banco Central monitora a concentração do Sistema Financeiro Nacional e está atento aos riscos para o sistema e aos possíveis efeitos sobre o spread [diferença entre taxa de captação do dinheiro pelos bancos e a taxa cobrada dos clientes] bancário e outros preços. Entretanto, a relação entre concentração e spreads não é tão direta quanto o senso comum pode sugerir", pondera no Relatório de Economia Bancária.

De acordo com o BC, outros fatores estruturais são importantes para se explicar o custo do crédito: despesas administrativas, impostos, margem financeira (lucro) e inadimplência. De acordo com o relatório, em 2016, o Brasil estava no grupo de países com os sistemas bancários mais concentrados, o que inclui Austrália, Canadá, França, Holanda e Suécia.

Queda gradual

Mesmo que a Selic seja mantida no atual patamar nesta semana, Oliveira acredita que os juros ao consumidor vão continuar a cair, mas seguirão em ritmo lento de redução. "As taxas de juros sobem de elevador, bem rápido, e caem como se estivessem de escada, com um passo de cada vez, muito lentamente", disse Oliveira.

Segundo ele, os juros do crédito devem cair porque ainda estão muito altos. "Como subiram muito antes e tem gordura para queimar, a tendência é que as taxas de juros caiam mesmo com a manutenção da Selic. Serão pequenas quedas, gradualmente, a não ser que o quadro externo ou político se agrave. Isso pode trazer insegurança", avaliou.

Para o professor da FGV, os consumidores só devem pegar empréstimos se houver realmente necessidade. "Não é momento para ficar tomando crédito. É um momento de muito risco, um grau de incerteza muito grande", disse.

Em nota, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) disse que as instituições financeiras seguem "comprometidas com a melhoria do ambiente de crédito no Brasil, contribuindo com estudos, propostas e ações concretas para reduzir estruturalmente o spread". "Para isso, é preciso atacar os custos excessivos que oneram a concessão de crédito no Brasil, com ações que envolvam, também, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário", destacou.

Para a Febraban, um estudo recente indicou que a razão principal pela qual os spreads são mais altos no Brasil, em comparação a outros países, está nos custos elevados da intermediação financeira.

"Os custos associados a inadimplência, tributação, depósitos compulsórios e outros elementos do sistema de regulação são bem mais altos no Brasil que em países emergentes relevantes, como Chile e Turquia, por exemplo", diz a federação.

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