Luiz Barsi Filho tem mais de R$ 1 bilhão aplicado na Bolsa brasileira (Anderson Figo/Site Exame)
Anderson Figo
Publicado em 23 de junho de 2017 às 18h04.
Última atualização em 23 de junho de 2017 às 18h32.
São Paulo - A estrutura previdenciária do Brasil é “capenga” e não há motivos para não investir em ações, principalmente durante a crise. A avaliação é do advogado e economista Luiz Barsi Filho, 77, um dos maiores investidores da Bolsa brasileira, com mais de 1 bilhão de reais aplicado em papéis na B3.
Barsi esteve na última quinta-feira (22) na Expert 2017, evento sobre investimentos organizado pela corretora XP, em São Paulo, e sua palestra foi uma das mais disputadas tanto entre investidores novatos quanto os mais experientes. Todos estavam ansiosos para tirar um selfie com o ídolo.
Considerado um Warren Buffett brasileiro, Barsi investe em ações há mais de 50 anos e fez fortuna com a estratégia de formar uma carteira previdenciária com papéis de empresas que pagam bons dividendos —parte do lucro distribuída entre os acionistas. Segundo o investidor, ele não quer ser dono de nenhuma companhia, mas, sim, um parceiro.
Durante a palestra, Barsi criticou a estrutura previdenciária no Brasil e disse que todas as pessoas podem aplicar em ações com objetivo de longo prazo, se beneficiando dos dividendos. Ele também ressaltou que, sabendo investir em Bolsa, ninguém precisa do que ele chamou de “perda fixa” —uma brincadeira com as aplicações de renda fixa.
Entre as empresas em que investe, ele ressaltou a produtora de celulose Klabin. “Ela tem um histórico de gestão de mais de 100 anos”, explica. Barsi também disse estar otimista com as ações da mineradora Vale.
“A Vale pode ser uma boa opção para aposentadoria. Ela está em valor de patrimônio. Mas é preciso ficar atento com uma coisa: a mineradora vai transformar suas ações preferenciais em ordinárias. Isso deve atrair estrangeiros para os papéis. Se for comprar Vale, tem que ser as ações ordinárias, e não as preferenciais”, afirmou.
O investidor destacou que foge das ações de setores como o aéreo ou de eletrodomésticos, já que são formados por empresas sem longos históricos. Ele também mencionou que, ao contrário do que muitos pensam, ele também sofreu alguns reveses.
”Nunca perdi dinheiro, mas já tive que devolver parte do que ganhei. Aconteceu com os papéis do Banco Nacional e do Banco do Progresso, por exemplo. Faz parte da parceria”, disse. Segundo ele, qualquer um pode se tornar o “rei da Bolsa”, assim como ele. “Quem tiver disciplina, ficará milionário. Ninguém anda um quilômetro se não der o primeiro passo.”
Após a palestra na Expert 2017, Barsi conversou com EXAME.com e avaliou o cenário atual para investimento em ações. Ele também comentou sobre o que percebeu de mudança nos últimos anos e deu dicas para quem quer seguir seus passos. Confira abaixo os principais trechos da entrevista.
EXAME.com - Há três anos, o senhor me concedeu uma entrevista em que disse que gostaria de dar um beijo na boca da ex-presidente Dilma Rousseff porque ela tinha aprovado a revisão tarifária, o que diminuiu o valor das contas de energia e derrubou as ações do setor na Bolsa, gerando uma oportunidade de compra. O senhor ainda acha que foi um bom negócio? Continua com esses papéis?
Luiz Barsi Filho - A decisão da Dilma nos permitiu comprar as ações da Eletrobras em um preço extraordinário. Eu não poderia agradecê-la de outra forma a não ser dando um beijo nela. Claro que falei de uma forma jocosa, não tinha a real intenção de fazer isso.
Foi uma forma de tentar demonstrar o quanto ela fez bem para mim, proporcionando um cenário que jogou o preço das ações para baixo. As ações caíram de 22 reais para 4,50 reais. Olha o estrago que ela fez.
A maioria das ações do setor de energia elétrica tiveram uma queda expressiva, mas a mais significativa foi a da Eletrobras. De lá para cá, as ações foram se recuperando gradualmente. A Eletrobras acabou saindo de 5 ou 6 reais e foi para 30 reais.
A lógica da Bolsa é comprar na baixa e vender na alta, mas é muito difícil a pessoa física conseguir fazer isso. Quando está caindo, você sempre acha que vai cair mais. Quando está subindo, você sempre acha que vai subir mais. Então, você dificilmente vai entrar ou sair de um papel na hora certa.
Quando você tem a intenção de especular, o importante é você comprar e estipular um patamar em que já esteja valendo a pena a venda da ação. E então, você deve realizar lucro [vender] quando o preço chegar nesse nível. Não espere subir mais.
Já quando você compra uma ação pensando em dividendos [parte do lucro da empresa distribuída aos acionistas], você não fica sujeito a essas oscilações do mercado. O máximo que dá para fazer é torcer para que o preço da ação de uma boa pagadora de dividendos caia, assim você pode comprar mais papéis. Eu não acho que as ações da Eletrobras vão voltar ao patamar de 4 reais, como ocorreu naquela época.
EXAME.com - O senhor nunca quis ser dono de empresas, mas, sim, parceiro de bons projetos. Há três anos, o senhor me disse que as parcerias resistem a momentos de crise, e até se fortalecem nessas ocasiões. Hoje, estamos tentando nos recuperar de uma crise bem violenta. Como o senhor avalia o cenário atual?
Luiz Barsi Filho - Sem dúvida nenhuma a parceria resiste a momentos de crise. Eu aumentei a minha participação em algumas ações porque essa crise gerou cotações que se transformaram em boas oportunidades.
No início, quando começou o processo de impeachment [da ex-presidente Dilma Rousseff], os papéis do Banco do Brasil, por exemplo, custavam 3 reais. Depois, foram para 34 reais. A Vale custava 10,50 reais, e foi para 30 reais, 32 reais, 34 reais. Aliás, nós prevemos um futuro muito bom para a mineradora. Ela vai ingressar em mares menos tumultuados e problemáticos.
Já o Banco do Brasil subiu muito. Foi uma subida violenta. Talvez isso possa ter sido uma forma de a maioria dos fundos de pensão resolverem suas questões atuariais. A Previ por exemplo, tinha um problema muito sério com o papel [do BB] a 13 reais, 14 reais, mas com o papel a 25 reais, 26 reais, ela recupera parte dessa estrutura atuarial. O mercado melhorou.
EXAME.com - Mas as ações brasileiras, no geral, voltaram a ficar caras, na opinião do senhor, ou seguem em um patamar interessante para a compra?
Luiz Barsi Filho - As ações, no geral, continuam dentro de um padrão baixo de preço. As cotações já estiveram bem menores, obviamente, mas na minha avaliação elas já estão refletindo os resultados que foram apresentados.
A única companhia que talvez possa ter um resultado que apresente mais lenta recuperação é o Banco do Brasil, porque ele tem uma série de provisionamentos a serem incluídos nos balanços e isso vai provavelmente afetar parte do lucro que poderia ser distribuído aos acionistas.
Temos percebido isso nas distribuições que o banco tem feito. Em 2014, 2015, ele distribuiu entre 1,70 real e 2 reais por ação. Em 2016, foram 50 ou 60 centavos. Houve uma queda fortíssima. Em 2017, as distribuições estão sendo tímidas como foram em 2016.
Se isso está acontecendo, é porque os resultados também estão sendo tímidos. Não acho que o Banco do Brasil esteja estacionado em seu patamar mínimo [de preço da ação], mas também não acredito que volte a 13 reais, 14 reais.
EXAME.com - O senhor comentou que acha que o mercado brasileiro de ações tem mais oportunidades do que o mercado americano. Mas, comparativamente, o nosso mercado é muito menor do que o de lá. O que está faltando para o mercado de ações do Brasil crescer mais?
Luiz Barsi Filho - O mercado brasileiro deveria ser muito maior. Nós deveríamos ter uma estrutura de investimento muito superior do que a que temos hoje no nosso país..
Até um certo ponto, o baixo volume de pessoas favorece aqueles que querem comprar, porque na razão direta que o mercado oscila, se você não tem comprador, quando o preço cai você consegue comprar mais barato. É uma dinâmica que você vai descobrindo e se beneficiando dela ao longo do tempo.
Falta cultura de investimento. O brasileiro não tem cultura de investimento porque ele foi seduzido, induzido e conduzido a ser um agiota. Empresta para receber um ‘jurinho’. Empresta para amigos, parentes.
Isso não cria valor. Pelo contrário, estimula o recurso a cair em atividades que não são benéficas para o país, nem para a economia. Eu direciono os meus recursos para um mercado de circulação, geração de riqueza, de valor.
EXAME.com - O senhor já me disse uma vez que qualquer um poderia se tornar o rei da Bolsa, mas como chegar lá?
Luiz Barsi Filho - Sim, qualquer um pode [se tornar o rei da Bolsa]. A primeira coisa que a pessoa precisa fazer é incorporar a mentalidade de investimento. Ele tem que falar para si próprio: eu vou ser um investidor. Ele tem que se conscientizar dessa essência.
A partir daí, ele vai tentar na medida do possível direcionar os recursos que sobram entre aquilo que ele ganha e aquilo que ele gasta para as ações. Ele não tem que tornar isso uma ideia fixa ou uma neurose, mas ele tem que começar a pensar no seguinte: se eu quiser gastar no futuro, tenho que poupar agora, tenho que investir.
Lamentavelmente, a Bolsa de Valores não estimula você a investir. Ela estimula você a especular, porque cada operação que você faz você gera corretagem, você gera emolumentos, e é isso o que ela quer. Ela não quer que você seja investidor, ela quer que você seja especulador. Faltam eventos como este de hoje para atrair a atenção das pessoas.
Faltam referências também, exemplos. Faltam pessoas como eu no mercado brasileiro que mostrem que é possível ser investidor. Precisamos de exemplos verdadeiros. Eu não falo, por exemplo, para alguém comprar uma ação para ganhar 50% daqui a pouco. Eu falo, na verdade, para a pessoa comprar agora porque um dia ela vai gerar dinheiro.