Denyse Godoy
Publicado em 12 de agosto de 2020 às 10h01.
Última atualização em 12 de agosto de 2020 às 12h40.
O secretário especial de Desestatização e Privatização, Salim Mattar, e o de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Paulo Uebel, pediram demissão na terça-feira, 11, elevando para seis o número de baixas da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, nas últimas semanas.
“Houve uma demandada”, disse Guedes. Segundo o ministro, Salim deixou o governo porque está insatisfeito com o ritmo das privatizações, e Ubel, pediu exoneração por discordar da estratégia da administração Bolsonaro de deixar a reforma administrativa para o ano que vem.
Para Aluizio Falcão, colunista da EXAME, o governo perdeu o DNA liberal com a saída dos dois secretários. Como o mercado financeiro, que apostava nessa orientação para acelerar a recuperação da economia brasileira, está reagindo à "debandada"?
Bruno Lima, analista de renda variável da EXAME Research (divisão de análise de investimentos da EXAME):
"Obviamente levanta alguns receios em relação à condução de pautas imporantes, como o ajuste fiscal pós-pandemia, as privatizações etc. Hoje, a bolsa não está sendo impactada pela noticia. Todavia, claramente, o mercado de câmbio foi, dado que as moedas emergentes de forma geral estão ganhando valor perante o dolar e o real é exceção."
André Perfeito, economista-chefe da corretora Necton:
"A saída de Mattar e Uebel deixa claro que não está sendo possível avançar a agenda econômica de Guedes na velocidade que ele e sua equipe entendem como adequada. O cenário, sejamos francos, já estava muito ruim no que concerne à velocidade das reformas e equilíbrio fiscal, mas a credibilidade do governo sempre encontro em Guedes um fiador de peso. Após os acontecimentos de ontem, nos parece que o ministro e sua equipe irão forçar mais fortemente as reformas, caso contrário o clima pode se tornar pesado de vez."
Jason Vieira, economista-chefe da gestora Infinity Asset Management:
"A saída começa a mostrar o forte cansaço do corpo técnico do governo com os avanços políticos. Em ordem de velocidade, do mais rápido ao mais lento, tempos o tempo do mercado, o tempo da economia, o tempo do corpo técnico do governo e, por último, o tempo da política. Infelizmente, o presidente corre o risco de não somente perder mais pessoas relevantes no corpo técnico, como flerta perigosamente com a irresponsabilidade fiscal que pode derrubá-lo, conforme alerta Paulo Guedes. O tempo do mercado para reagir ao descalabro fiscal, infelizmente para o presidente, é rápido demais e todas as consequências das desconfianças dos investidores, locais e internacionais, são pesadas e sem piedade."
Marco Tulli, chefe das mesas de operações da corretora Necton:
"A saída não é positiva. Infelizmente, saiu um remador. Vamos colocar outro, para o melhor da nação sempre. Isso não pode virar recorrência, assusta um pouco, tenhamos atividade e não passividade."
Lucas Carvalho, analista de investimentos da corretora Toro:
"O mercado fica um tanto quanto cético porque os principais expoentes da agenda liberal estão saindo. O Mattar destacou a dificuldade de privatizar algo no país, já que passa pelo Congresso e precisa costurar acordos políticos. É um processo bem complexo. E o Ubel destacou a reforma administrativa, que ficará para 2021. Os holofotes agora virão para a reforma tributária, que é essencial para atrair investimentos. Agora, fica aquela pulguinha atrás da orelha sobre terem saído muitas pessoas próximas do ministro da economia. E o Guedes? Será que ficará até fim do governo Bolsonaro? Essa é uma dúvida crescente desde que Moro saiu. Cresce um certo receio. São nomes ilustres, renomados e bem vistos pelo mercado financeiro.”
Gustavo Cruz, estrategista da gestora RB Investimentos:
"Acredito que aumente a desconfiança do grau de sucesso da agenda de reformas do atual governo. As pesquisas com os próprios deputados já indicavam que a reforma administrativa e as privatizações seriam temas para 2021, o próprio presidente afirmou que em ano eleitoral essas agendas teriam menos espaço. A pergunta que tem que ser feita é quem entra no lugar deles. Caso o ministro Guedes indique seus novos secretários, sua credibilidade é mantida. No entanto, se aparecerem nomes mais ligados a outras alas do governo, veríamos uma piora na bolsa e um câmbio mais desvalorizado. Por enquanto, a leitura do mercado é que o presidente continuando apoiando Guedes e que a agenda segue na direção correta, embora deixe a desejar na velocidade."
Victor Beyruti, economista da corretora Guide:
"A saída dos dois secretários foi interpretada por muitos como mais um sinal da falta de compromisso do governo com a agenda liberal, uma das principais bandeiras que ajudou a eleger o presidente Bolsonaro. Ao mesmo tempo, é importante considerar o momento excepcional que vivemos. A reforma tributária continua ganhando, aos trancos e barrancos, uma robustez que poucos acreditavam ser possível no início do ano. Também está prestes a ser pautada uma série de projetos regulatórios que seguem princípios liberais ao pé da letra: a Lei do Gás, que dispõe sobre medidas para quebrar o monopólio estatal e incentivar a participação da iniciativa privada na indústria do gás natural; a Lei da Recuperação Judicial, que visa atualizar a legislação referente à recuperação judicial e a falência; a Lei Cambial, que trata do mercado de câmbio brasileiro no exterior e o capital estrangeiro no país, entre vários outros. E não devemos esquecer as recentes vitórias registradas com a aprovação do marco legal do saneamento básico e a reforma da Previdência. Em suma, os recentes contratempos adicionam mais incerteza à evolução das reformas governistas nos próximos anos, mas, ao mesmo tempo, o empenho de Paulo Guedes e vontade apresentada pelo Legislativo a fazer as pautas andarem não podem ser ignorados. Assim, vemos um cenário turbulento, mas não ausente de esperança com relação à retomada de confiança na economia brasileira."
Bruno Musa, sócio do escritório de agentes autônomos de investimentos Acqua:
"Parece que pode ter havido um pedido do Centrão para a saída dos dois em troca de aprovar as privatizações e pautar a reforma administrativa. Talvez faça parte do jogo político que o Brasil precisa jogar, dar um passo para trás para dar outros para a frente e, assim, aprovar as privatizações, manter o teto de gastos e a trajetória da dívida, aprovar a reforma administrativa tão importante e necessária para a diminuição do Estado, da burocracia, de benesses e privilégios que mantêm o país ineficiente, improdutivo e com custos horripilantes. Portanto, perde o Brasil, mas esperamos que seja por uma estratégia de aprovação das reformas."