Eike Batista: defesa do empresário vai recorrer de condenação por insider trading. (José Cruz/Agência Brasil)
Tais Laporta
Publicado em 2 de outubro de 2019 às 07h00.
Última atualização em 2 de outubro de 2019 às 08h58.
A Justiça Federal do Rio de Janeiro condenou o empresário Eike Batista a oito anos e sete meses de prisão por ter manipulado o mercado de ações, crime conhecido como insider trading. Segundo a sentença, o ex-bilionário teria usado informação privilegiada para obter vantagem na venda de ações da empresa de construção naval OSX.
O empresário vendeu os papéis da companhia no dia 19 de abril de 2013, antes de a empresa divulgar ao mercado mudanças no plano de negócios e problemas financeiros que o grupo enfrentava. A partir daí, a conturbada situação do estaleiro veio à tona e culminou em um pedido de recuperação judicial com R$ 5,5 bilhões em dívidas, levando a uma forte desvalorização na bolsa.
Como a condenação de Eike foi em primeira instância, sua defesa vai questionar a decisão. Desta vez, os crimes não envolvem a operação Lava Jato (que ocasionou a prisão do empresário em 2017), mas a derrocada no Império X, conglomerado de empresas que ruiu após ser desacreditado pelos investidores.
Eike foi condenado pela justiça a pagar uma multa de 82,8 milhões de reais, que em valores corrigidos equivale a 118,2 milhões de reais.
Na sentença, a juíza Rosália Monteiro Figueira argumentou que o ex-bilionário aproveitou sua larga experiência no mercado de capitais “de modo nocivo” e incentivou o investimento dos prejudicados na empreitada. Ela justificou a decisão afirmando que o empresário visou lucro fácil “em prejuízo da coletividade”.
“Qualquer pessoa, nas mesmas condições do acusado, podia compreender que não é permitido negociar títulos mobiliários vinculados a companhia em relação à qual se tenha informações relevantes ainda não divulgadas ao público”, escreveu, concluindo que Eike sabia que a conduta visava praticar o crime pelo qual foi denunciado.
Segundo a juíza, Eike teria se aproveitado da fragilidade dos órgãos de fiscalização para praticar o crime,e citou a proatividade da Securities and Exchange Commission (órgão que regula o mercado de capitais norte-americano) no combate ao uso de informações privilegiadas e à manipulação de mercado.
Pelo Código Penal brasileiro, o insider trading (ou uso de informações privilegiadas) acontece quando investidores compram ou vendem ativos do mercado (ações) em posse de informações relevantes que ainda não vieram a público, com o objetivo de lucrar ou obter vantagem em detrimento dos demais investidores.
Pelas regras da CVM, o xerife do mercado de capitais brasileiro, empresas que possuem ações na Bolsa são obrigadas a comunicar os fatos relevantes que possam influenciar as decisões dos investidores de comprar ou vender as ações que possuem.
Desta forma, o insider que tiver conhecimento de tais fatos deve informá-los ao mercado o quanto antes. Se a revelação do fato colocar em risco o interesse da empresa, ele deve se abster de negociar as ações que têm relação com a informação privilegiada.
A decisão da Justiça divergiu do entendimento do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, subordinado ao Ministério da Economia, e segunda instância das decisões da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O órgão conhecido como Conselhinho absolveu o empresário pelas acusações de insider trading em um processo administrativo na CVM sobre as operações com a OSX, no qual foi multado em R$ 21,3 milhões.
O processo sancionador foi aberto em 2013 e deu origem à ação penal contra o empresário por crime contra o mercado de capitais.
Centenas de processos correm na CVM para investigar suspeitas de insider trading, mas um percentual muito baixo gera condenações, por tratar-se de um crime difícil de ser comprovado, observa o sócio de infraestrutura e societário do Rayes & Fagundes Advogados, Diogo Octavio Nebias
“Pode haver condenações diferentes na Justiça e no órgão regulador. Uma condenação não tem relação com outra”, comenta o advogado.
No âmbito da CVM, as punições possíveis envolvem multa, proibição de operar no mercado e impedimento de exercer cargos em companhias abertas. Há ainda processos civis parelelos na Justiça, movidos pelas partes que se sentiram prejudicadas na negociação.
Já na esfera penal, a prisão se aplica quando o juiz conclui que não há dúvidas sobre a prova material do crime. No caso de Eike, ainda se espera novos desdobramentos em segundo instância antes de uma condenação definitiva.