Dólar vai subir mais? 3 fatores que explicam para onde vai a moeda
Moeda americana bate R$ 5,70 pela primeira vez em 30 meses e chega a acumular 17,5% de alta no ano; preocupações fiscais e discursos recentes do presidente Lula têm mexido com o mercado de câmbio nas últimas semanas
Repórter
Publicado em 2 de julho de 2024 às 16h11.
Última atualização em 4 de julho de 2024 às 15h09.
Embora o mercado veja justificativas para o dólar mais alto, o consenso dos economistas ainda indica uma queda da moeda até o fim do ano. A projeção mediana, segundo o Focus divulgado nesta semana, é de dólar a R$ 5,20 no fim do ano e a R$ 5,19 em 2025. Ainda que bem abaixo do patamar atual, as expectativas para o câmbio vêm se deteriorando rapidamente. Há quatro semanas, o consenso para o dólar ainda era de R$ 5,05 para este e para o próximo ano.
A piora é resultado das recentes revisões para cima nas projeções de dólar das instituições financeiras. Um dos bancos que passaram a projetar dólar mais caro para este ano é o BTG, que revisou sua expectativa de R$ 5 para R$ 5,20. "A revisão da projeção da taxa de câmbio encontra maior explicação na postergação do ciclo de corte de juros pelo Fed e na deterioração da percepção fiscal de longo prazo." Nessa mesma linha está o Itaú, que revisou o dólar para o fim do ano de R$ 5 para R$ 5,15 e para o fim de 2025 de R$ 5,15 para R$ 5,25.
Uma das projeções mais pessimistas do mercado para o real é a de Alfredo Menezes, CEO da gestora Armor Capital. Menezes, que é uma das referências no mercado de câmbio, projeta a moeda entre R$ 5,40 e R$ 5,60 para o fim do ano. Em entrevista recente à Exame Invest, o gestor afirmou que a moeda pode chegar "facilmente" a R$ 6, caso o governo não mude o discurso.
Sinalização fiscal
A avaliação de Menezes é de que seriam necessárias sinalizações de cortes de gastos para o dólar apresentar um movimento consistente de queda frente ao real. Uma das maiores críticas é que não há mais espaço para atingir um equilíbrio fiscal por meio de aumento de impostos. Lula, no entanto, tem dado indicações contrárias aos interesses do mercado. Em entrevista recente ao jornal mineiro O Tempo, o presidente chegou a afirmar que gostaria de fazer o "ajuste fiscal sobre a rentabilidade dos banqueiros". Ainda na semana passada, Lula chegou a afirmar em entrevista ao UOL que "o problema é saber se precisa efetivamente cortar ou se precisa aumentar a arrecadação".
"Nas últimas vezes que o Lula chegou a flertar com corte de gastos, o real reagiu positivamente. Então, uma sinalização mais firme de corte de gastos poderia ajudar a moeda brasileira. Mas acho difícil o governo mudar o discurso", diz Fernando Siqueira, head de research da Guide Investimentos.
Novo Banco Central
As últimas semanas também foram marcadas pelo conflito entre Lula e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a quem o presidente tem se referido como "este rapaz". Campos Neto, indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, tem sido um alvo constante do Executivo. Mas o tom escalou após as últimas duas decisões do Comitê de Política Monetária (Copom), em que os diretores assumiram uma postura mais contracionista, reduzindo o ritmo de corte de juros e, posteriormente, interrompendo-o. No mercado, um dos temores é de que o Banco Central aceite uma inflação mais alta em troca de uma menor taxa de juros a partir do ano que vem, quando os diretores indicados por Lula passarão a ser maioria no Copom.
O nome favorito para substituir Roberto Campos Neto, quando seu mandato encerrar no fim do ano, é o de Gabriel Galípolo, indicado por Lula para o Copom no ano passado. Galípolo foi um dos que votaram pela manutenção da queda de 0,5 ponto percentual (p.p.) quando o Copom decidiu reduzir para 0,25 p.p o ritmo de corte. A divisão suscitou dúvidas sobre a nova diretoria do Copom, que só foram amenizadas após a decisão unânime na reunião passada de interromper o ciclo de corte de juros diante do aumento dos riscos inflacionários. Porém, a incerteza sobre o que será do Banco Central a partir do ano que vem continua. " Um nome pior que o de Galípolo faria o mercado entrar em pânico imediatamente ", afirma Marília Fontes, sócia-fundadora da Nord.
Federal Reserve
Nenhum ativo no mundo tem mais influência sobre os mercados globais do que os juros americanos. Como a dívida do Tesouro americano é considerada a mais segura do mundo, quanto maior sua rentabilidade, maior é a tendência de valorização do dólar, dada a concentração de investimentos nos Estados Unidos. No caso brasileiro, ainda houve o agravante de os juros internos terem caído, enquanto as taxas americanas se mantiveram inalteradas, tornando o diferencial de juros menos atrativo para investimentos atrelados à Selic. No fim do ano passado, o mercado chegou a precificar sete cortes do Fed neste ano.
Hoje, a precificação é de apenas dois cortes, iniciando em setembro. Caso confirmada, a queda do juro americano daqui a dois meses deve contribuir para a valorização do real e de outras moedas emergentes, segundo Alfredo Menezes. Mas a aposta do gestor é de que o afrouxamento do juro americano fique para novembro. Hoje, a probabilidade indicada nas curvas de juros americanas é de 69% de chance de corte em setembro e de 65% de ao menos dois cortes até o fim do ano. Para o Bank of America, no entanto, o espaço para cortes deve se abrir apenas em dezembro, após as eleições presidenciais nos Estados Unidos. "O Fed está preparado para manter a taxa onde está pelo tempo que for necessário, mas espera cortar antes do final deste ano.
"O Fed está preparado para manter sua posição pelo tempo que for necessário, e aliviará as condições quando os dados de inflação indicarem que deve fazê-lo. Acreditamos que o primeiro corte de juros ocorrerá em dezembro e continuamos a esperar que o Fed encerre o ciclo com o juro de 3,50-3,75% em meados de 2026", diz o BofA em relatório.