Ainda que ocorra certa liquidação na Evergrande, especialistas acreditam que o risco não é sistêmico | Foto: Wang Gang / Costfoto/Barcroft Media via Getty Images (Wang Gang / Costfoto/Barcroft Media via/Getty Images)
Beatriz Quesada
Publicado em 21 de setembro de 2021 às 15h37.
Última atualização em 21 de setembro de 2021 às 18h33.
A crise da incorporadora imobiliária chinesa Evergrande está longe de terminar. Segundo a Bloomberg, a companhia não realizou pagamentos de juros que venciam na segunda-feira, dia 20, para pelo menos dois de seus maiores credores bancários, o que deixa a empresa mais perto de dar um calote em sua dívida de 300 bilhões de dólares.
O caso, no entanto, ainda está longe de ter a dimensão do Lehman Brothers, banco americano que quebrou em 2008 e jogou os mercados globais na maior crise financeira do século. Isso porque grande parte dessa dívida está nas mãos dos próprios chineses, e não espalhada pelo sistema financeiro mundial, limitando os efeitos negativos.
“Entre os cerca de 300 bilhões de dólares de passivo da empresa, apenas 19 bilhões de dólares são em bonds, que é como se concentra a exposição global. Essa exposição ao crédito corporativo chinês é muito mais tímida do que se tinha ao mercado americano na década passada”, explica Arthur Mota, estrategista internacional do BTG Pactual digital.
A grande incerteza que ainda permanece no caso é como o governo chinês pretende estancar a crise. Em live realizada pela EXAME Invest e pelo BTG Pactual digital nesta terça, dia 21, Mota avaliou que a Evergrande, seus acionistas e seus credores ainda devem sofrer um pouco mais antes de receber socorro estatal.
Essa seria uma forma de desestimular o chamado moral hazard, ou seja, que outras empresas adotem posições tão alavancadas de endividamento. A Evergrande é líder mundial em volume de passivos. Porém a expectativa ainda é a de que o governo chinês atue no caso, tentando acomodar o ciclo de crédito para proteger a economia.
Veja abaixo a íntegra da live com os analistas Arthur Mota e Bruno Lima, do BTG Pactual digital, com moderação de Carlo Cauti, editor Multimídia da EXAME Invest:
https://www.youtube.com/watch?v=atM92UirVyM
A maior parte das incertezas continua justamente porque ainda não se sabe como o governo chinês irá agir para estancar a crise. Ainda assim, analistas acreditam que existem incentivos suficientes para justificar uma intervenção.
“Ainda que ocorra certa liquidação na Evergrande, o risco não é sistêmico. Não é interessante para o governo ter uma crise financeira às vésperas de dois grandes eventos em 2022, que são os Jogos Olímpicos de Inverno, em fevereiro, e a recondução do presidente Xi Jinping para seu terceiro mandato em outubro”, afirma Mota.
Ações brasileiras que são muito dependentes da demanda chinesa, como as da Vale (VALE3), devem continuar operando em compasso de espera enquanto a situação não se resolve na China.
“Hoje o cenário é de incerteza e isso é horroroso para a bolsa. Enquanto a China não estancar a crise, o mercado vai continuar pedindo prêmio [pelas ações afetadas]”, explica Bruno Lima, analista-chefe de ações do BTG Pactual digital.
Isso explica porque a Vale tem sofrido além do que seria razoável segundo a análise fundamentalista. “O preço do minério que está implícito na cotação da Vale hoje está em torno de 60 dólares a tonelada. Só que esse valor é o preço do custo de produção da commodity. Não parece fazer sentido”, diz Lima.
Outra distorção está ocorrendo entre as siderúrgicas. “Essas empresas seguem o preço do aço, que continua firme apesar da queda do minério de ferro. Só que as siderúrgicas estão caindo junto com a Vale”, argumenta.
Até o pregão da véspera, a Vale já havia perdido 40 bilhões de dólares em valor de mercado desde sua máxima no final de julho. A queda de 3,3% na segunda tirou da empresa o posto de empresa mais valiosa da América Latina.
Nesta terça-feira, as ações da mineradora subiram 0,97% e recuperaram parte das perdas, mas as siderúrgicas continuaram entre as maiores quedas do Ibovespa.