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Luiz Inácio Lula da Silva, presidente brasileiro: "O meu governo não terceiriza responsabilidades nem abdica da sua soberania. Já fizemos muito, mas sabemos que é preciso fazer mais" (Michael M. Santiago/AFP)
Repórter de ESG
Publicado em 24 de setembro de 2024 às 12h57.
Última atualização em 24 de setembro de 2024 às 13h30.
Em um mundo marcado pelos crescentes conflitos bélicos e disputas geopolíticas que evidenciam uma insuficiência na cooperação internacional e multilateralismo para combater os desafios globais urgentes, é preciso acelerar a descarbonização e trabalhar por uma economia menos dependente de combustíveis fósseis, destacou Luiz Inácio Lula da Silva, durante o discurso de abertura da 79ª Assembleia Geral da ONU em Nova York. Neste sentido, o Brasil teria vanguarda para liderar a agenda verde e "despontar como um celeiro de oportunidades neste mundo revolucionado pela transição energética", disse.
O presidente brasileiro realiza a fala de abertura dentre os chefes de Estado desde 1955, uma honraria concedida ao país após a participação de Oswaldo Aranha no evento e seu papel decisivo na aprovação da resolução de partilha da Palestina e criação de Israel.
"Em tempos de polarização, expressões como “desglobalização” se tornaram corriqueiras. Mas é impossível “desplanetizar” nossa vida em comum. Estamos condenados à interdependência da mudança climática. O planeta já não espera para cobrar da próxima geração e está farto de acordos climáticos não cumpridos", disse Lula. Além disso, reforçou a necessidade de financiamento climático para os países menos desenvolvidos e pobres no combate à mudança climática e a fome, enquanto os gastos militares globais cresceram pelo nono ano consecutivo e atingiram 2,4 trilhões de dólares.
Segundo ele, o mundo caminha em 2024 para ter o ano mais quente da história moderna, enquanto furacões no Caribe, tufões na Ásia, secas e inundações na África e chuvas torrenciais na Europa deixam um rastro de mortes e de destruição -- e não se pode esquecer dos efeitos dramáticos da emergência climática no Brasil. O presidente citou a maior enchente desde 1941 no Sul, a pior estiagem na Amazônia em 45 anos e as queimadas e incêndios florestais que já se alastram por pelo menos 5 milhões de hectares.
"O meu governo não terceiriza responsabilidades nem abdica da sua soberania. Já fizemos muito, mas sabemos que é preciso fazer mais. Além de enfrentar o desafio da crise climática, lutamos contra quem lucra com a degradação ambiental. Não transigiremos com ilícitos ambientais, com o garimpo ilegal e com o crime organizado", destacou.
Além disso, disse estar certo de que Belém do Pará irá sediar a COP30 em 2025 com a convicção de que "o multilateralismo é o único caminho para superar a urgência climática". Atualmente, o país se destaca com uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo e 90% da eletricidade originada de fontes renováveis -- como a biomassa, a hidrelétrica, a solar e a eólica -- e também se destaca na produção pioneira de hidrogênio verde.
Após o Brasil reduzir o desmatamento na Amazônia pela metade em 2023, a meta é zerar até 2030, segundo Lula. "Não é mais admissível pensar em soluções para as florestas tropicais sem ouvir os povos indígenas, comunidades tradicionais e todos aqueles que vivem nelas. Nossa visão de desenvolvimento sustentável está alicerçada no potencial da bioeconomia", complementou.
Entre outros compromissos, um dos mais urgentes seria acabar com a fome -- como foi conquistado em 2014, acrescentou Lula, antecipando que em novembro será lançada no Rio de Janeiro uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, " que nasce dessa vontade política e desse espírito de solidariedade" e será um dos principais resultados da presidência brasileira do G20 para todos os países.
Outro ponto levantado foi a defesa da democracia brasileira, na luta contra o extremismo e totalitarismo, que para o presidente, se caracterizam por "espalhar o ódio, a intolerância e o ressentimento". "A democracia precisa responder às legítimas aspirações dos que não aceitam mais a fome, a desigualdade, o desemprego e a violência", disse.
A inteligência artificial e o avanço rápido das tecnologias também entraram na pauta, trazendo a preocupação de um aumento das desigualdades sociais. "Nos interessa uma IA emancipadora, que que tenha a cara do Sul Global e que fortaleça a diversidade cultural. Que respeite os direitos humanos, proteja dados pessoais e promova a integridade da informação. E que seja ferramenta para a paz, não para a guerra".
Frente ao que caracterizou como uma ONU cada vez mais esvaziada e paralisada, o presidente reforçou a necessidade de uma reforma abrangente na Carta das Nações Unidas que está prestes a completar 80 anos e não trata de alguns dos desafios mais urgentes da humanidade.
Entre os pontos de mudança, ele sugeriu a transformação do Conselho Econômico e Social no principal foro para o tratamento do desenvolvimento sustentável e do combate à mudança climática, a revitalização do papel da Assembleia Geral em temas de paz e segurança internacionais, o fortalecimento da Comissão de Consolidação da Paz e a reforma do Conselho de Segurança, para torná-lo mais eficaz e representativo. "Recai sobre a Assembleia Geral, expressão maior do multilateralismo, a missão de pavimentar o caminho para o futuro", finalizou.