Economia

Sem verba e contratações, IBGE diz que Censo de 2020 está ameaçado

Receio do instituto é a não aprovação de um concurso público para reposição do quadro de servidores e de emendas ao orçamento ainda pendentes no Congresso

IBGE: a escassez de recursos humanos no instituto ameaça o plano de trabalho e a produção de informações estratégicas para o País (Raul Zito/VEJA)

IBGE: a escassez de recursos humanos no instituto ameaça o plano de trabalho e a produção de informações estratégicas para o País (Raul Zito/VEJA)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 12 de novembro de 2018 às 15h01.

Rio - A realização do Censo Demográfico de 2020 está ameaçada, caso não sejam aprovados um concurso público de reposição do quadro de servidores do instituto e as emendas ao orçamento ainda pendentes de votação no Congresso, declarou nesta segunda-feira o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Conforme antecipou o Broadcast  em 17 de agosto, a equipe econômica do atual governo defendia um censo mais enxuto, por conta de restrições orçamentárias.

O custo total do levantamento foi calculado em R$ 3,4 bilhões pelo IBGE. O órgão enviou ao Ministério do Planejamento um pedido de R$ 344 milhões para investimento em equipamentos e software no ano de 2019. Outros R$ 3,056 bilhões serão estritamente necessários para viabilizar a coleta em 2020.

Em 2018, o órgão recebeu R$ 6,7 milhões em recursos para os preparativos da operação censitária, de uma previsão inicial de R$ 7,5 milhões. Segundo o IBGE, não é possível reduzir o projeto.

"A realização do Censo Demográfico 2020 está ameaçada, diante da avalanche de aposentadorias sem a reposição do quadro. Desde 2017, a direção do IBGE vem empreendendo ações para viabilizar a realização de concurso público para o preenchimento de 1.800 vagas, medida imprescindível para evitar a descontinuidade de atividades essenciais do Instituto. No entanto, até o momento não foram concedidas autorizações para os pleitos apresentados", informou o IBGE, em nota à imprensa.

O instituto diz que vem trabalhando junto ao Congresso Nacional para que acolha e aprove as emendas parlamentares que recompõem o orçamento para a reposição de pessoal, além das atividades do Censo 2020. Não fazer o Censo Demográfico traria prejuízos internos e risco à imagem internacional do Brasil, alertou o IBGE.

A escassez de recursos humanos no IBGE ameaça o plano de trabalho do Instituto e a produção de informações estratégicas para o País, argumenta o instituto, responsável pela produção de mais de 50 pesquisas com informações sobre mercado de trabalho, atividades econômicas e condições de vida da população. O órgão lembra que os indicadores produzidos orientam investimentos e subsidiam políticas implementadas pelas três esferas de governo, mas que a produção de informações depende de recursos financeiros, tecnológicos e humanos.

A redução no quadro de pessoal já teve impacto no funcionamento da rede de agências do IBGE, responsáveis pelas rotinas de entrevistas domiciliares e pela coleta mensal de informações junto a empresas e produtores rurais.

De um total de 583 agências, 232 já operam com apenas dois servidores, elevando o risco de não realização das rotinas administrativas e técnicas. Outras 61 agências possuem apenas um servidor e estão ameaçadas de fechamento já nos próximos meses. Nos últimos quatro anos, 16 agências do IBGE foram fechadas, pois os funcionários responsáveis se aposentaram e não houve como substituí-los.

"Desde 2008, o IBGE perdeu mais de 2.400 servidores, o equivalente a um terço do total. Este quadro pode se agravar ainda mais, chegando a um impasse, pois, hoje, mais de um terço do quadro funcional do IBGE já está apto a requerer aposentadoria. Essa crise ameaça todo o plano de trabalho do Instituto, incluindo a realização do Censo Demográfico 2020, que já se encontra em planejamento", afirma o texto. "As reposições feitas por alguns concursos e as reorganizações técnicas, administrativas e tecnológicas ocorridas ao longo desse período procuraram reduzir as perdas, mas agora, diante da severidade da redução do quadro de servidores, somente um novo concurso público poderá resolver essa situação-limite", complementa.

O Brasil realiza censos demográficos desde o Império, sendo o IBGE responsável pela operação desde 1940. A não realização do Censo impossibilitaria a atualização do conhecimento da realidade demográfica e socioeconômica dos municípios brasileiros, além de impactar a produção de informações contínuas do IBGE e de outras instituições, que são baseadas em pesquisas que têm as amostras atualizadas e calibradas pelos resultados do Censo.

"De forma mais dramática e direta, haveria prejuízo para o cálculo dos fatores para a divisão do Fundo de Participação dos Municípios e a atualização de políticas públicas, como o Bolsa Família e as metas do Plano Nacional de Educação, por exemplo. Ademais, seria um descumprimento da Lei nº 8.184/91 pelo Estado brasileiro, pois esse dispositivo legal determina a realização decenal do Censo Demográfico", declarou o IBGE, na nota.

Quanto aos possíveis prejuízos à imagem do Brasil, o órgão lembra que o País mantém compromissos internacionais estratégicos ancorados na produção de indicadores sociais e econômicos, sendo grande parte deles provenientes do Censo. "O Brasil tem obrigações quanto à disseminação de dados junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI), à Divisão de Estatística das Nações Unidas (UNSD) e à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entre outros, que sofreriam rupturas. Também somos signatários da Agenda 2030 - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, das Nações Unidas, assinada pelo Brasil, o que exige um grande esforço de estruturação do sistema estatístico nacional, a fim de que se possa atender à demanda por 240 diferentes indicadores sociais, ambientais e econômicos para monitorar o cumprimento de suas metas. A ausência do Censo Demográfico de 2020 inviabilizaria um número considerável desses indicadores", acrescentou o órgão.

Há uma semana, o IBGE foi alvo de uma polêmica quando o presidente eleito da República, Jair Bolsonaro, defendeu uma mudança na metodologia da taxa de desemprego no País, dizendo que a pesquisa que atualmente retrata o mercado de trabalho "é uma farsa". "Vou querer que a metodologia para dar o número de desempregados seja alterada no Brasil", disse Bolsonaro, ao conceder entrevista à TV Bandeirantes no início da noite da segunda-feira passada.

Especialistas consideraram que a fala do presidente eleito demonstrava desconhecimento sobre o assunto. A Associação de Servidores do IBGE reforçou, em nota, que o órgão "segue padrões metodológicos internacionais em suas pesquisas, com a finalidade de que as estatísticas brasileiras sejam comparáveis às dos demais países do mundo".

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) também saiu em defesa do órgão estatístico brasileiro: "A OIT apoia fortemente a metodologia seguida pelo IBGE para estimar o emprego e o desemprego, seguindo padrões internacionais", escreveu Rafael Diez de Medina, chefe de estatísticas e diretor do Departamento de Estatísticas da OIT, em mensagens publicadas nas redes sociais.

Em outra mensagem, Diez disse que estava "extremamente preocupado sobre o futuro das estatísticas oficiais no Brasil". "O sistema internacional de estatísticas estará em alerta e pronto para reagir a esses tipos de reações na Era Pós Verdade", criticou.

Acompanhe tudo sobre:CongressoIBGEJair BolsonaroOIT

Mais de Economia

Oi recebe proposta de empresa de tecnologia para venda de ativos de TV por assinatura

Em discurso de despedida, Pacheco diz não ter planos de ser ministro de Lula em 2025

Economia com pacote fiscal caiu até R$ 20 bilhões, estima Maílson da Nóbrega

Reforma tributária beneficia indústria, mas exceções e Custo Brasil limitam impacto, avalia o setor