Economia

Selic caiu para nível perigoso com risco fiscal, diz ex-diretor do BC

Para José Julio Senna, "se o mercado entender que estamos perdendo a âncora fiscal, a gente não sabe até onde vai o prêmio de risco”

BC: no ciclo de alívio monetário iniciado um ano atrás, a taxa Selic caiu de 6,5% para o atual piso histórico de 2%. (Ueslei Marcelino/Reuters)

BC: no ciclo de alívio monetário iniciado um ano atrás, a taxa Selic caiu de 6,5% para o atual piso histórico de 2%. (Ueslei Marcelino/Reuters)

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Bloomberg

Publicado em 11 de agosto de 2020 às 17h44.

Última atualização em 11 de agosto de 2020 às 17h50.

A queda dos juros para perto de zero no Brasil gera instabilidade no câmbio num momento em que os gastos para enfrentar a pandemia e ameaças ao teto de gastos elevam o risco de deterioração fiscal, diz José Julio Senna, chefe do Centro de Estudos Monetários do FGV-Ibre e ex-diretor do Banco Central.

“É claro que se a inflação cai o BC pode cortar juros. O que discutimos é essa região perigosa em que chegamos com juro perto de zero para um país que tem um prêmio de risco muito alto”, diz Senna em entrevista por telefone. “Segurar o juro um pouco mais alto teria sido mais prudente, um sinal de cautela, de preocupação com a estabilidade do câmbio.”

Segundo ele, “é mais perdoável” uma inflação abaixo do que acima da meta, como ocorreu na maior parte do período do regime de metas inflacionárias.

Meta superada na maior parte do tempo de vigência do regime

Meta superada na maior parte do tempo de vigência do regime (Divulgação/Bloomberg)

O real é a segunda moeda mais volátil do mundo e, mesmo após o dólar voltar do recorde de quase R$ 6 em maio, a divisa brasileira ainda acumula desvalorização de 25% neste ano, a maior perda em um ranking de 31 principais moedas fortes e de países emergentes compiladas pela Bloomberg.

No ciclo de alívio monetário iniciado um ano atrás, a taxa Selic caiu de 6,5% para o atual piso histórico de 2%.

Senna diz que a volatilidade do câmbio também está associada aos riscos fiscais, agravados com os programas governamentais durante a pandemia e que podem ter nova deterioração caso propostas de descumprir o teto de gastos tenham efeito.

“Se o mercado entender que estamos perdendo a âncora fiscal, a gente não sabe até onde vai o prêmio de risco, mas que vai subir não parece ter dúvida.”

Os sinais de recuperação da economia, tanto no Brasil como no exterior, também não seriam suficientes para gerar otimismo porque estão sendo “mascarados” pelos estímulos dos governos. “Muita gente se entusiasma com a recuperação próxima de V, mas isso é uma ilusão.”

O economista acredita que nos próximos meses os governos enfrentarão o dilema de prosseguir com os estímulos, mas agravando o endividamento público, ou retirá-los, o que traria riscos sociais dado que a economia global não deve ter retomado um crescimento sustentado.

No Brasil, onde se discute o prolongamento do auxílio emergencial, esse debate é ainda mais complexo pois o governo terá de fazer um ajuste fiscal para conter a deterioração das contas públicas, segundo o ex-diretor do BC.

“Se não faz o ajuste fiscal, o mercado entende que as contas públicas vão para o brejo. Por outro lado, se retira os estímulos muito rápido, muitas pessoas não conseguem sobreviver”, diz.

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