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Por que a China teme cisnes negros e rinocerontes cinzas

O Partido Comunista usou seu jornal para avisar ao mundo que está de olho nos dois animais que podem levar abaixo o seu sistema financeiro

Este é um rinoceronte branco, não cinza, o tipo que preocupa os chineses (Chris Eason/Wikimedia Commons)

João Pedro Caleiro

Publicado em 20 de julho de 2017 às 17h24.

Última atualização em 21 de julho de 2017 às 10h28.

São Paulo - "Tanto o cisne negro quanto o rinoceronte cinza: nenhum tipo de risco pode ser levado de forma leviana".

É o que diz um editorial publicado na primeira página do Diário do Povo, jornal oficial do Partido Comunista da China,na última segunda-feira (17).

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Alguns dias antes, reguladores do país estiveram reunidos a portas fechadas em Pequim para uma conferência sobre risco financeiro que ocorre a cada 5 anos.

O principal resultado concreto foi um novo comitê de regulação financeira, mas o recado do jornal foi notado, já que ele é usado com frequência para comunicar a visão do governo chinês para o mundo.

Rinoceronte e risco

O termo "Rinoceronte cinza" vem de um livro lançado no ano passado pela americana Michele Wucker com o título "O Rinoceronte Cinza: Como Reconhecer e Agir em Relação aos Perigos Óbvios que Ignoramos" (tradução livre; o livro não foi editado em português).

O termo se refere a perigos relevantes que são subestimados apesar de vários sinais de alerta. Um exemplo: a crise financeira de 2008.

No caso da China, o problema é que o crédito fácil e um sistema financeiro paralelo levaram a dívida total não-financeira de 160% do PIB em 2008 para 260% do PIB atualmente.

"A China pensa muito mais à frente do que o Federal Reserve [banco central americano] pensava em 2007. A admissão de que há um rinoceronte cinza significa que eles estão tentando abordar o problema antes que ele exploda. O mundo deveria respirar aliviado de que a China está sendo proativa em controlar o risco da dívida", diz um e-mail para EXAME.com de Ann Lee, ex-professora da Universidade de Pequim atualmente na New York University (NYU).

A favor da China está o fato de que o governo controla quase todo o sistema financeira e a maior parte dos devedores, o que facilita a rolagem da dívida. Mas isso é sustentável quando o crescimento emperra?

As dúvidas do mercado vieram na forma de desvalorização da moeda chinesa, fuga de capitais e quedas fortes nas bolsas do país por longos períodos de 2015 e no início de 2016.

No último dia 24 de maio, a agência de classificação de risco Moody's rebaixou a nota de crédito da China pela primeira vez em quase 30 anos.

"Não acho que a discussão seja uma admissão de derrota pelo partido ou pelo governo. É apenas um alerta para esperar o inesperado. A mensagem tem saído por um bom tempo e de forma bem clara: não é possível garantir um manejo bem-sucedido [do problema]", diz um e-mail para EXAME.com de David Goodman, diretor de Estudos Chineses na Universidade de Xi'an Jiaotong-Liverpool em Suzhouo.

Os especialistas notam que há uma campanha de desalavancagem das autoridades regulatórias chinesas, com movimentos recentes para restringir empréstimos arriscados e aquisições no exterior.

O editorial sinaliza que a campanha vai continuar e que o mercado imobiliário também é fonte de preocupação. Outro alvo pode ser as ações de baixa capitalização, que perderam valor na segunda-feira após a publicação do texto.

Cisne e crescimento

O termo “Cisne negro”, também citado, foi criado pelo líbano-americano Nassim Nicholas Taleb para classificar eventos inesperados e de alto impacto e é de uso mais frequente no debate econômico.

A possibilidade de uma desaceleração brusca da China aparece há anos entre os principais cisnes negros da economia global, relatório trimestral do banco Société Générale.

No entanto, esse risco caiu recentemente. A economia chinesa cresceu 6,9% no segundo trimestre na comparação com o mesmo período do ano anterior, acima do esperado e da meta do governo.

Mas o risco é que a China esteja sustentando números altos alimentando os mesmos desequilíbrios ao invés de rebalancear sua economia para um perfil mais voltado para o consumo e menos dependente de crédito.

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