Movimento Passe Livre protesta contra o aumento de tarifas do transporte, (Rovena Rosa / Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 16 de janeiro de 2016 às 15h55.
Sem dúvida, uma política que zerasse o preço do transporte público (o passe livre) tornaria a distribuição de renda mais equitativa.
Afinal, principalmente nas nossas capitais, quem anda de ônibus é, em média, mais pobre do que quem não anda.
Importante: ao zerar o preço da passagem, todo o serviço seria financiado com dinheiro público – que vem dos impostos.
Em outras palavras, com o passe livre, redistribuem-se recursos de toda a população pagadora de impostos para um grupo (como dito, em média mais pobre) de pessoas que se locomovem via transporte público.
Mas isso não é suficiente para dar ao passe livre o carimbo de boa política social.
A pergunta relevante é: existe outra forma de redistribuir esses recursos para os mais pobres, só que de maneira mais eficiente? Esse é o “calcanhar de Aquiles” do passe livre.
Por quê?
Repetindo mais uma vez: o usuário do transporte público é, em média, mais pobre que o restante da população. Note as palavrinhas mágicas: em média.
Há pessoas que não são pobres e andam de transporte público. E há pessoas que são pobres e não andam de transporte público. O passe livre atingiria também esse pessoal, de uma forma perversa da perspectiva da distribuição de renda.
Como assim?
Considere uma pessoa com uma renda consideravelmente alta e que more num lugar bem servido de linhas de ônibus. Para chegar ao trabalho, o trânsito é terrível e estressante. Essa pessoa, então, prefere pegar o ônibus e aproveitar para ler o jornal no caminho.
Esse trabalhador ou trabalhadora está na parte de cima da distribuição de renda e seria beneficiada pela política de passe livre. Ou seja, quantias de todos os pagadores de impostos seriam usadas por esse cidadão, que passaria a pagar um preço mais baixo para se locomover.
O efeito joga contra a redistribuição de renda.
Outro tipo de pessoa: pobre, sim, e são vários, mas que não usam transporte público. Por exemplo, quem trabalha em casa ou se locomove a pé ou de bicicleta.
Supondo que a política não mude seus hábitos de locomoção, essa pessoa sairia perdendo: pagaria mais impostos, mas não se beneficia com a passagem gratuita.
Esses casos mostram como o processo de redistribuição de recursos na sociedade é potencialmente ineficiente com o passe livre. Não parece ser uma boa política social.
E dá para fazer melhor?
Sempre dá. Seria possível transferir a grana diretamente aos mais pobres, por exemplo, em vez de financiar o passe livre. E já temos essa “tecnologia” hoje: ela se chama Bolsa Família.
Com isso, o dinheiro chega também à pessoa que é pobre e que não anda de ônibus; e não beneficia quem é relativamente endinheirado e anda de ônibus.