Ministro da Fazenda Henrique Meirelles, dia 08/06/2016 (Ueslei Marcelino / Reuters/Reuters)
Da Redação
Publicado em 6 de outubro de 2016 às 20h11.
São Paulo – O governo federal divulgou nesta quarta-feira,15, os detalhes da sua maior medida econômica até o momento: a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de teto dos gastos.
Ela define que a partir de 2017, as despesas de Executivo, Legislativo e Judiciário federais não poderiam ter aumento real, estando limitadas à correção pelo índice de inflação (IPCA) do ano anterior.
Entenda o que está sendo proposto:
Qual é o objetivo da medida?
O objetivo da PEC é reverter a tendência inercial de aumento dos gastos federais e com isso o aumento da dívida pública.
De 1997 a 2015, a expansão anual média das despesas foi de 6% acima da inflação. De 2008 a 2015, isso se acentuou e elas cresceram 50% acima da inflação enquanto a receita subiu apenas 17%.
Esse processo, somado com a queda do crescimento, fez a dívida pública disparar 12 pontos percentuais em relação ao PIB só entre o final de 2013 e de 2015.
Ela já está em 61% do PIB e pode chegar a 80% já no final de 2018, muito acima do padrão dos países emergentes.
Por quanto tempo dura?
O teto terá validade de 20 anos. A partir do décimo ano, o presidente poderá propor ao Congresso uma mudança na metodologia de cálculo que valeria para os anos seguintes.
As previsões anteriores falavam em prazos bem menores, de 3 a 7 anos. Há relatos de que os parlamentares não aceitariam um prazo nem de 10 anos, então é possível que o governo tenha lançado um número alto para ganhar margem na negociação.
“É difícil dizer qual é o prazo ‘ótimo’ porque isso depende da futura tendência de coisas como os juros, mas o importante é que seja o tempo necessário para gerar o declínio da dívida para níveis mais confortáveis. Quanto mais longo, maior a probabilidade que a medida seja bem-sucedida”, diz Felipe Salles, economista do Itaú Unibanco.
Novo Regime Fiscal deverá durar 20 anos, diz ministro da Fazenda:https://t.co/Eo8r3mKxMJ
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Como ficam Educação e Saúde?
Os gastos com Educação e Saúde deixariam de ter porcentagem vinculada à receita e passariam a ser apenas corrigidos pela inflação.
Esse seria o piso e nada impede que o Congresso decida colocar mais recursos nessas áreas, mas para isso teria que retirar de outras. O mérito da medida é explicitar essas escolhas do Legislativo, mas não diz nada sobre como elas serão feitas.
“O teto é parte fácil; a parte política difícil vem depois, quando tiver que decidir o que vai cortar, como gastos sociais. Como querem fazer o ajuste de longo prazo no curto, ele fica muito draconiano para poder trazer credibilidade”, diz André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos.
Entre 2003 e 2015, os gastos com saúde e educação subiram em média 6,25% e 8,5%, respectivamente, ao ano acima da inflação (medida pelo IGP-DI).
A aposta agora é em melhorar gestão e qualidade com o gasto corrente, mas resta saber se isso vai mesmo acontecer e será suficiente.
“O que nós temos que discutir é a gestão da qualidade do gasto público. Isso é que tem que ser o grande foco da sociedade. A mera alocação de recursos não é o problema”, disse Henrique Meirelles, ministro da Fazenda.
Ministro da Fazenda fala sobre limite mínimo para gastos em educação:https://t.co/8G3NDrxU7c
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Quais são as exceções?
Ficam de fora do limite as transferências para Estados e municípios e complementações do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), além de despesas com eleições e capitalizações de estatais.
Algumas estimativas apontam que Petrobras, Eletrobras e outras vão precisar eventualmente de socorro, mas essa exceção no teto não preocupa o mercado porque esse tipo de despesa aconteceria de uma vez só e o centro do problema são os gastos recorrentes.
O que acontece se ele for descumprido?
O poder que descumprir o limite ficará proibido de conceder aumento a servidores, criar novos cargos, mudar carreiras ou realizar concursos.
Em caso de descumprimento no Executivo, fica proibido também o aumento de subsídios ou de desonerações que impliquem em perda de receita.
"O importante é ter o teto. O resto é consequência do teto”, diz Meirelles, mas esse "resto" inclui medidas complicadas de aprovar.
A imprensa diz que o fim do abono salarial é defendido pelo ministro e quase entrou na proposta, e não há solução fiscal de longo prazo para o Brasil sem abordar a Previdência, o maior gasto depois dos juros.
“Para os gastos totais ficarem mais ou menos estáveis em termos reais, outros gastos teriam que cair, e o previdenciário tem uma tendência estrutural de aumento já que o número de beneficiários cresce com o envelhecimento da população. É por isso que uma reforma da Previdência de fato ajudaria na implementação”, diz Felipe Salles, economista do Itaú Unibanco.
O teto não impede uma resposta anticíclica em caso de choques econômicos?
Diante da crise de 2008, o Brasil e muitos outros países reagiram com aumento de gastos – medida que em um primeiro momento foi elogiada e bem-sucedida. Pela regra nova, isso não seria possível, e os especialistas divergem sobre as consequências:
“A regra é muito rígida. Pode acontecer muita coisa no caminho e ela não abre espaço para eventualidades. O governo está certo em não fazer indexação, mas teria que pensar em levar em conta outros parâmetros, como o crescimento do PIB”, diz André.
Salles diz que o teto só seria um entrave para fazer política anticíclica se o Brasil estivesse em um cenário de juro zero e câmbio fixo – ou seja, sem margem de manobra na política monetária.
Mas como o Brasil tem os maiores juros reais do mundo, há espaço para estimular a economia sem precisar relaxar a política fiscal.
O Itaú Unibanco projeta que se o Brasil aprovar o teto e crescer 3% ao ano em média até 2030, o gasto do governo central em relação ao PIB deve cair em 2030 para o nível de 1997. Seria uma diminuição do tamanho do Estado sem precedentes na nossa história.
Veja na figura a projeção com diferentes cenários: