Na pandemia, mundo ganhou um novo bilionário a cada 26 horas, diz Oxfam
Relatório da Oxfam mostra que há 55 bilionários no Brasil, com uma riqueza total de US$ 176 bilhões, que subiu 30% no mesmo período
Agência O Globo
Publicado em 17 de janeiro de 2022 às 10h57.
Última atualização em 18 de janeiro de 2022 às 09h55.
Desde o início da pandemia de Covid-19, decretada em março de 2020, um novo bilionário surgiu a cada 26 horas. Já os dez homens mais ricos do planeta mais que dobraram suas fortunas, de US$ 700 bilhões para US$ 1,5 trilhão, um crescimento de US$ 15 mil por segundo, ou US$ 1,3 bilhão por dia no mesmo período.
Fazem parte dessa lista Elon Musk, da montadora Tesla, de carros elétricos; Jeff Bezos, da gigante do varejo Amazon; Bernard Arnault & família, um dos controladores do grupo LVMH, com 75 marcas; Bill Gates, da Microsoft; Larry Ellison, da Oracle; Larry Page e Sergey Brin, ambos do Google; Mark Zuckerberg, do Facebook; Steve Ballmer, também da Microsoft; e o megainvestidor Warren Buffet.
A pequena elite mundial de 2.755 bilionários viu sua fortuna crescer mais durante a pandemia do que nos últimos 14 anos.
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Já a renda de 99% da população global caiu, e mais de 160 milhões de pessoas foram empurradas para a pobreza no mesmo período. A desigualdade de renda contribuiu para a morte de uma pessoa a cada quatro segundos, e estima-se que 17 milhões de pessoas morreram de Covid-19 no mundo, uma escalada de mortes que não era vista desde a Segunda Guerra Mundial.
Os dados foram levantados pela Oxfam, ONG que atua em mais de 90 países na busca de soluções para a pobreza e a desigualdade social. Os dados sobre a desigualdade global foram compilados para embasar as discussões do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça.
O Fórum começaria presencialmente hoje, mas foi adiado por causa do crescimento de infecções pela variante Ômicron. O encontro deverá acontecer no início do verão no Hemisfério Norte, no fim de junho. Ainda assim, hoje haverá um seminário on-line com várias autoridades sobre as preocupações globais mais urgentes.
— Se os dez homens mais ricos do mundo perdessem 99,99% de sua riqueza amanhã, eles continuariam mais ricos do que 99% de todas as pessoas do planeta. Eles têm hoje seis vezes mais riqueza do que os 3,1 bilhões mais pobres do mundo — afirma Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil.
Mais dez bilionários no Brasil
No Brasil, a Oxfam calcula haver atualmente 55 bilionários, com uma riqueza total de US$ 176 bilhões. Desde março de 2020, o país ganhou dez novos bilionários. A riqueza deles cresceu 30% na pandemia, o equivalente a US$ 39,6 bilhões. Os 20 maiores bilionários do país têm mais riqueza (US$ 121 bilhões) do que 128 milhões de brasileiros (cerca de 60% da população).
— No Brasil, também há uma ampla discrepância entre um grupo que prosperou muito exatamente em um momento de crise, em um cenário de desemprego elevado e aumento da fome — diz Jefferson Nascimento, coordenador da área de Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil.
Segundo a ONG, a miséria e a fome explodiram no Brasil durante a pandemia. Em dezembro de 2020, 55% da população brasileira se encontravam em situação de insegurança alimentar, o equivalente a 116,8 milhões de pessoas, e 9% se encontravam em situação de fome, ou 19,1 milhões de pessoas. Trata-se de um retrocesso a patamares de 2004.
No Brasil, a fome afeta mais as mulheres e pessoas negras. A entidade aponta que 11,1% dos lares chefiados por mulheres e 10,7% dos chefiados por pessoas negras estavam passando fome no fim de 2020, frente a 7,7% dos lares chefiados por homens e 7,5% dos lares liderados por pessoas brancas.
— Regredimos 17 anos na questão da insegurança alimentar e fome, e neste momento vemos reduções de políticas públicas nesse sentido. O Bolsa Família, um programa de 2003 e que era reconhecido internacionalmente, foi extinto e substituído pelo Auxílio Brasil, em um ano eleitoral — afirma Nascimento.
O relatório da Oxfam, intitulado “A Desigualdade Mata”, revela que a alta concentração de renda contribui para a morte de pelo menos 21 mil pessoas por dia no mundo. Segundo a entidade, a conta é conservadora e se baseia nas mortes globais provocadas por falta de acesso à saúde pública, violência de gênero, fome e crise climática.
O documento aponta ainda que a pandemia atingiu grupos raciais de maneira desigual. No Brasil, por exemplo, mesmo com o avanço da vacinação, a maior parte das mortes por Covid-19 se concentra nas periferias de grandes cidades. De acordo com Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), pessoas negras no Brasil têm uma vez e meia mais chance de morrer de Covid-19 do que as pessoas brancas.
— As desigualdades têm solução, porque elas são fruto de escolhas políticas. Do jeito que a economia global está estruturada, os mais ricos continuarão se beneficiando e lucrando, enquanto bilhões de pessoas, principalmente mulheres e população negra e de etnias minoritárias, ficarão no final da fila, sujeitas à pobreza extrema, à violência e à morte — afirma Katia.
A Oxfam defende que os governos “devem reescrever as regras dentro de suas economias que criam essas diferenças colossais, além de agir de modo a pré-distribuir a renda”, afirma o relatório.
Mais tributação sobre os ricos
A ONG também argumenta que os governos deveriam recuperar os ganhos obtidos pelos bilionários durante a pandemia, tributando essa nova riqueza por meio de impostos sobre o capital. Esse dinheiro, diz a Oxfam, deveria ser investido em políticas de saúde pública universal e proteção social, além de adaptação climática e prevenção contra violência de gênero.
Os cálculos da Oxfam têm por base fontes como a lista de bilionários da revista Forbes 2021, o Global Wealth Databook 2021 do Instituto de Pesquisa do Credit Suisse, que trata de dados sobre riqueza, além de dados divulgados pelo Banco Mundial.
A ONG lembra que as desigualdades também têm efeitos sobre as mudanças climáticas globais. Estima-se que as emissões dos 20 bilionários mais ricos do mundo sejam, em média, 8 mil vezes maiores que as emissões de bilhões de pessoas mais pobres. Toda a população global sofre com o aquecimento do planeta, mas os países ricos não conseguem lidar com os efeitos de sua responsabilidade por cerca de 92% de todas as emissões históricas.