Guerra comercial: por que aço, por que agora e o que vem por aí
"A produção de aço tem ressonância emocional em partes do Meio-Oeste", diz Ian Bremmer, presidente da consultoria Eurasia
João Pedro Caleiro
Publicado em 2 de março de 2018 às 13h23.
Última atualização em 29 de março de 2018 às 15h50.
São Paulo — Donald Trump chocou o mundo mais uma vez nesta quinta-feira (01) ao anunciar uma taxa de 25% sobre a importação de aço e de 10% sobre a de alumínio pelos Estados Unidos.
O presidente americano ainda colocou mais gasolina no fogo ao tuitar que "guerras comerciais são boas e fáceis de ganhar" e o mercado reagiu negativamente, com queda das bolsas ao redor do mundo.
"Foi uma decisão inesperada, porque havia quem especulasse sobre uma normalização da presidência Trump após sua participação em Davos. Ao contrário, ele agora está aplicando a opção mais dramática diretamente na largada", diz Marcos Troyjo, economista e diplomata que dirige o BRIClab da Universidade de Columbia.
O medo do protecionismo sempre foi um ponto de atenção com a administração, mas por que o aço e por que agora?
"Trump escolheu aço e alumínio porque são commodities industriais que ele entende e com que se importa, e porque a produção de aço tem ressonância emocional em partes do Meio-Oeste", diz Ian Bremmer, presidente da Eurasia, consultoria de risco político.
Ele nota que Wilbur Ross, o secretário de Comércio, fez grandes investimentos em siderúrgicas americanas e que elas já tinham prontas a suas demandas por tarifas assim que Trump assumiu.
As ações das siderúrgicas americanas estão disparando enquanto despencam as de fabricantes como de cerveja e automóveis, que preveem alta de preços na sua matéria-prima.
Economistas apontam para o risco de pressões inflacionárias em uma economia que já está superaquecida, além da retaliação de parceiros comerciais.
"Não faz sentido econômico. Vai simplesmente aumentar a estrutura de custos para a indústria americana", diz Troyjo.
O Brasil pode ser um dos mais afetados, já que foi o segundo maior exportador de aço para os Estados Unidos entre janeiro e setembro de 2017, atrás apenas do Canadá.
Timing
O Departamento de Comércio americano concluiu em fevereiro uma investigação para determinar se a dependência de aço e alumínio estrangeiro representava um "risco de segurança nacional".
A recomendação foi por tarifas (levemente menores que as anunciadas) e Trump só precisaria tomar uma decisão sobre o tema até abril, mas já vinha dando sinais da sua direção.
Peter Navarro, um dos assessores econômicos do presidente mais associados ao protecionismo, foi "promovido" recentemente dentro de uma equipe muito dividida sobre o tema:
"Membros seniores da equipe tentaram dissuadir o presidente porque é algo que obviamente prejudica a economia, mas é politicamente útil para Trump ter alguns inimigos externos. America First, aquela coisa", diz Bremmer citando o slogan da campanha.
"Trump está sob muita pressão por causa de todo o caos na Casa Branca, mas no final do dia essa era uma posição que ele queria tomar".
Reação
Chrystia Freeland, ministra de Relações Exteriores do Canadá, disse que "é totalmente inapropriado ver qualquer comércio com o Canadá como uma ameaça de segurança nacional para os EUA" e também disse considerar medidas retaliatórias.
O país é o principal exportador de aço para o seu vizinho, mas a exportação também é alta do lado americano.
Jean Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia, disse que políticas de retaliação seriam anunciadas "nos próximos dias" de forma a "rebalancear" a situação comercial.
A China pediu ao governo americano para “conter” o uso de medidas protecionistas e “respeitar as regras”.
Um dos maiores alvos da retórtica de Trump desde a campanha, a China não está nem no top 10 dos maiores exportadores de aço para os EUA, mas exporta muito alumínio.
A reação também foi fortemente negativa no próprio Partido Republicano: "O presidente está propondo uma alta de impostos massiva para as famílias americanas", disse Ben Sasse, senador por Nebraska.
"Toda vez que se faz isso, vem uma retaliação, e agricultura é o alvo número 1. Acho que é contraproducente para a economia agrícola e não estou muito feliz", disse o Senador Pat Roberts, do Kansas.
Mas como a medida é baseada em segurança nacional, há pouco que o Legislativo possa fazer para barrá-la.