Paulo Guedes: futuro ministro da economia em encontro com industriais na sede da Firjan (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
Reuters
Publicado em 17 de dezembro de 2018 às 16h06.
Última atualização em 17 de dezembro de 2018 às 19h34.
Rio de Janeiro — A uma plateia formada por empresários e executivos ligados a indústria, o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, declarou nesta segunda-feira que pretende mexer no Sistema S, e defendeu "meter a faca" na fonte bilionária de financiamento aos serviços de treinamento, cultura e lazer mantidos por federações e confederações patronais.
A fala do futuro ministro causou frisson e burburinho na plateia de aproximadamente 400 pessoas, ao sugerir que poderia cortar ao menos 30 por cento dos recursos do Sistema S, mas admitindo que o percentual poderia chegar a 50 por cento.
"Como você pode falar em cortar isso e aquilo e não cortar o Sistema S? Tem que meter a faca no Sistema S também. Vocês estão achando que a CUT perde o sindicato e aqui fica tudo igual… Acho que tem que cortar pouco para não doer muito", disse ele.
"Ouvi dizer até que financia a reforma política, não sei se é verdade", afirmou o economista durante evento na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro, que é parte do Sistema S.
Todos os anos, a Receita Federal repassa bilhões de reais para o financiamento dos serviços sociais e de treinamento profissional mantidos pelas confederações nacionais da indústria, do comércio, dos transportes, da agricultura e para a Organização das Cooperativas do Brasil. Em 2017, o valor ultrapassou 16 bilhões de reais.
Com base em lei do governo de Getúlio Vargas, o Sistema S busca fornecer treinamento e oferta de lazer e cultura aos trabalhadores.
Os valores são recolhidos na forma de contribuição paga pelos funcionários, por isso a Receita repassada o dinheiro para as entidades patronais.
Durante o evento, realizado na Federação das Indústrias do Rio de Janeiro, Guedes disse ainda que o atual regime de Previdência, de repartição, é uma "bomba", mas ressaltou que antes de fazer o trânsito para o regime de capitalização é necessário "acertar o modelo que está aí".
Guedes afirmou que as prioridades econômicas no governo do presidente eleito Jair Bolsonaro serão acelerar privatizações e a reforma da Previdência.
O economista voltou a citar o sistema chileno de capitalização na Previdência como inspiração para a reforma do setor no futuro governo. Guedes chegou a cogitar a possibilidade de tentar viabilizar a reforma enviada ao Congresso por Michel Temer, mas disse que ficou convencido que não seria possível.
O futuro ministro criticou o modelo atual, que se mostrou esgotado antes mesmo de um maior envelhecimento da população.
"Tem esse avião antigo que é essa Previdência que já quebrou financeiramente a população antes dela envelhecer. Então, defendi abertamente que o primeiro passo seria tentar botar esse avião para voar de novo por pelo menos três ou quatro mandatos antes de descer outra vez por que ela está... condenada", disse ele durante evento da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro.
"Qualquer sistema de repartição tem uma bomba demográfica e essa ainda tem defeitos maiores. Para criar um emprego tem que destruir os outros. Tem 40 milhões de empregos com carteira e 46 milhões sem carteira. Que diabo de sistema que destroi um emprego para segurar a velhice do trabalhador... não é legal", acrescentou ele.
Guedes frisou que a ideia é primeiro "consertar" o regime de repartição vigente no Brasil para viabilizar a futura implementação do sistema de capitalização.
"Temos que transitar para um sistema de capitalização. Demoramos tanto tempo que não dá mais para ser disponível para todo mundo. Temos que proteger agora a geração futura."
"Vamos então tentar acertar esse que este aí e depois a gente aprofunda e vai para libertação das gerações futuras para um sistema de capitalização que democratize o ato de poupança, liberte as empresas dos encargos trabalhistas na direção de um choque de criação de empregos", destacou ele.
Guedes afirmou que suas prioridades serão acelerar as privatizações, fazer a reforma da Previdência, simplificar impostos, promover um novo pacto federativo e realizar uma abertura gradual da economia brasileira.
O futuro ministro indicou que buscará apoio político de Estados e prefeitos para aprovação de reformas, numa nova forma de governar, sinalizando que não dará apoio a entes federativos em dificuldade caso não receba suporte para as reformas que irá propor.
"Temos que fazer uma reforma do Estado, mas eles --estados e municípios--, têm que nos apoiar para fazer a reforma, se não fizer não tenho o que dar para ele. Vai apoiar? Não? Então foi um prazer e vai lá pagar sua folha."
"Como vou ajudar alguém que não está me ajudando? Essa é a governabilidade: a troca de apoio mútuo na direção do federalismo", afirmou.
Guedes acrescentou que teria "o maior prazer em ajudar, e em toda reforma que tiver eu quero fazer questão que o dinheiro vá para Estados e municípios". "Mas me dá a reforma primeiro", argumentou.
Ele espera inaugurar uma nova relação com a classe política para aprovar projetos de interesse do país no Congresso Nacional e, segundo ele, é imperativo que os políticos ajudem a superar a situação das contas públicas.
Guedes frisou que o ponto de partida dessa relação será o pacto federativo e não irá ceder a pedidos "estranhos" de políticos por recursos federais
"Não vai ser mais quem bater no Ministério da Fazenda que vai levar grana. Não vai, porque eu jogo a chave fora antes."
"Vamos desossar e descentralizar o governo federal. Então aprova esse negócio aí senão estou indo para casa", complementou ele, dizendo que a classe política precisa se reinventar.
O futuro ministro destacou preocupação com a rigidez das contas públicas ao lembrar que 96 por cento do Orçamento são vinculados a gastos obrigatórios.
Se nada for feito, disse ele, em dois anos 100 por cento do Orçamento ficaria carimbado e a classe política no Brasil perderia sua função
"Assim esterelizamos a classe política."
Durante discurso de quase uma hora na Firjan, Guedes chegou a mencionar que o economista Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central que estava na plateia, iria para o governo.
Mais tarde, à Reuters, Langoni negou a possibilidade.
"O que posso contribuir é com uma consultoria para o governo, especialmente na abertura da economia. Mas algo formal no governo, não", afirmou ele à Reuters.