Economia

Golpes em democracias pioram economia, mas só quando ganham

Evidência histórica mostra que golpes fracassados não afetam economia no longo prazo, mas os bem-sucedidos reduzem o PIB per capita de forma significativa

Pessoas em cima de tanque em Ancara, Turquia, durante ação militar para tomar o poder (Tumay Berkin/Reuters)

Pessoas em cima de tanque em Ancara, Turquia, durante ação militar para tomar o poder (Tumay Berkin/Reuters)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 19 de julho de 2016 às 14h18.

São Paulo - O golpe militar para tirar Tayyip Erdogan do poder na Turquia fracassou, mas o que acontece com a economia depois disso?

O vice-primeiro-ministro, Mehmet Simsek, garantiu que "o Golpe de Estado terá impacto limitado na economia turca" e hoje o Banco Central do país promoveu um novo corte de juros.

Pistas sobre os efeitos de longo prazo aparecem em um estudo publicado em abril no Stockholm Institute for Transition Economics (SITE) pelo economista e professor assistente Erik Meyersson.

Ele conclui que golpes fracassados não afetam a economia de forma relevante no longo prazo e também quebra o mito de que essas tentativas acontecem após longos períodos de crise econômica.

Isso é mais comum em autocracias; nas democracias, golpes são mais frequentes após anos de prosperidade, ainda que muitas vezes com uma crise despontando no fim do ciclo positivo; a própria Turquia cresceu sólidos 4% em 2015.

O golpe levanta dúvidas sobre a estabilidade do país e pode prejudicar setores como o turismo, mas o mercado de ações e a lira turca já estão se recuperando após um forte tombo.

E claro, não é só a economia que importa. O golpe abriu caminho para Erdogan perseguir seus opositores sem trégua, o que sinaliza tempos difíceis para os direitos humanos e a democracia no país.

Banco de dados

No seu trabalho, Meyersson considerou 457 tentativas de golpe em 94 países de 1950 até 2010, definidos como "tentativas ilegais e explícitas de militares ou outras elites dentro do aparato estatal para tirar do poder o Poder Executivo instalado".

O banco de dados foi criado por Jonathan M Powell & Clayton L Thyne, da Universidade do Kentucky. As regiões mais afetadas são África (37% dos casos) e América Latina (32%), seguidas por Ásia (16%) e Oriente Médio (13%).

Há uma distinção entre tentativas bem-sucedidas (que tomaram o poder por mais de 7 dias, e foram metade dos casos) e fracassadas (a outra metade).

Também foram separados golpes que acontecem em ditaduras (três quartos dos casos) e que acontecem em países democráticos ou pelo menos com algumas instituições democráticas (um quarto dos casos).

Isso faz diferença: um golpe que derruba um ditador é de certa forma parte do modus operandi de um regime autocrático, enquanto um golpe com sucesso em uma democracia provavelmente implicará em mudanças institucionais mais profundas ao longo do tempo.

Conclusões

Usando modelos de regressão da econometria, Meyersson conclui que em países mais democráticos, uma derrubada bem-sucedida do governo diminui o crescimento do PIB per capita em 1% a 1,3% em média por ano por uma década.

Em países autocráticos, os efeitos tendem a ser positivos, mas a alta é pequena e imprecisa.

Ele também não encontrou evidências estatísticas de que golpes são boas oportunidades para promover reformas impopulares mas necessárias e que trariam frutos de longo prazo.

Pelo contrário: além de reverterem certas reformas, especialmente no setor financeiro, os golpes tendem a causar mais endividamento, menos investimento, piora nas contas externas financeiras e uma propensão maior a crises econômicas.

Há uma documentada alta no gasto militar em detrimento de educação, saúde e redução da pobreza, além de piora da mortalidade infantil.

O economista nota que isso é consistente com a visão de gente como Daron Acemoglu, do MIT, de que golpes tendem a reequilibrar o poder das massas em direção às elites que se solidificam no poder.

Golpe X Impeachment

Pode ser tentador ver ecos do estudo para o caso brasileiro, já que setores da esquerda e a própria presidente afastada Dilma Rousseff classificam o impeachment de "golpe".

Mas nem daria tempo para Meyersson considerar o caso, já que seu estudo é de abril, e de qualquer forma o impeachment brasileiro não vai entrar no banco de dados utilizado pelo pesquisador.

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