Economia

Entenda as regras para a construção de portos privados no Brasil

Lei muito rígida tem desestimulado os investimentos privados

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Da Redação

Publicado em 15 de setembro de 2009 às 11h27.

O Brasil tem regulamentações distintas para a operação de portos públicos e privados. O terminal privativo de uso misto, uma espécie de porto privado, tem menor custo de operação, mas, por outro lado, é hoje obrigado a movimentar carga própria e de terceiros. A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) criou uma grande barreira para a o desenvolvimento desses portos ao estabelecer, por meio de resolução, que só habilita a operação de terminais de uso privativo caso a empresa comprove que a movimentação de carga própria por si só já seja suficiente para justificar a construção do terminal. Na resolução, não há um limite mínimo de carga própria a ser movimentado pelo porto, mas a interpretação de especialistas é que mais da metade do volume transportado não pode ser de terceiros.

O porto de Navegantes (Portonave) - o único porto privativo de uso misto em operação no Brasil - foi construído antes que a Antaq divulgasse essa regulamentação - e, portanto, obedece a um regime diferenciado. Do total de receitas de 160 milhões de reais por ano, o porto obtém apenas 30 milhões de reais com cargas próprias.

Ao perceber que as regras eram muito rígidas e engessavam novos investimentos no setor, a Secretaria Especial de Portos (SEP) decidiu, em 2008, editar um novo decreto em que, na prática, suspendeu a obrigatoriedade de que os portos privados movimentem cargas próprias. No entanto, a atuação das empresas privadas passou a ser condicionada a um programa geral de outorgas de áreas em que poderão ser construídos os novos portos. Esse decreto, no entanto, ainda não foi regulamentado e, por enquanto, valem as regras antigas.

A regulamentação divide o setor. De um lado está a Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres de Uso Público (Abratec) - que reúne empresas que arrendaram, por meio de licitação pública, terminais em portos públicos (como o de Santos e o do Rio de Janeiro) e são responsáveis pela movimentação de 98% dos contêineres do país. A Abratec defende a existência apenas dos portos públicos e dos terminais privativos com igualdade de regras para evitar a concorrência desleal. Gestão mais ágil e flexível, isenção de taxas pagas pelos terminais de uso público e liberdade para contratar mão de obra e estabelecer os preços das tarifas seriam algumas das vantagens dos terminais privados que não deveriam existir.

Do outro lado está a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib) - que congrega investidores ligados à construção e ao funcionamento de portos privados no país, entre eles o empresário Eike Batista, a Triunfo (dona da Portonave) e a Thyssen Krupp. Eles defendem o modelo de terminal de uso privativo misto sem a necessidade de movimentação de carga própria, que engessa a realização de novos investimentos. (Continua)


Para os especialistas, as novas regras criam, na prática, um terceiro modelo de terminal portuário no país que não atende plenamente nenhum dos dois lados - mas também está longe de ser o sonho dos investidores. Ao anunciar as novas regras, no entanto, o governo afirmou que o objetivo é atrair investimentos de até 20 bilhões de reais em dez anos.

Para a Abdib, o decreto representa um retrocesso pois traz novas exigências aos investidores e aumenta a ingerência do Estado no setor privado. Além disso, ainda não está claro como será o plano de outorgas que será definido pela Antaq nem as regras para os leilões de concessões das novas áreas portuárias. O vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, Mauro Dias, avalia que essas mudanças tendem a represar novos investimentos em virtude do risco de insegurança jurídica e do alto grau de complexidade das regras.

Especialistas também afirmam que o novo modelo deveria ser criado para resolver antigos problemas da legislação dos portos - e não reproduzir erros do passado apenas para manter a igualdade de condições na competição entre portos públicos e privados. "A pergunta que se faz é qual a competitividade de um modelo que prevê que o setor privado pague taxas idênticas e fique atrelado às mesmas travas burocráticas do setor público?", diz o especialista em logística da Fundação Dom Cabral, Paulo de Tarso Resende.

Mas no mercado também há defensores das mudanças. "É um modelo que se aproxima do adotado pelo setor elétrico por combinar outorga e licitação para atrair o capital privado", diz o analista do setor de logística da Fator Corretora, Vicente Falanga Neto. "Isso deve ajudar o governo a organizar o segmento de portos e atrair terminais de grande porte, os chamados hubports, que comportam mais navios e evitam horas paradas em atracação, reduzindo os custos da atividade."

Já o ministro-chefe da Secretaria Especial de Portos, Pedro Brito, diz que o governo entende que a iniciativa privada é fundamental para a expansão da capacidade portuária do país. Ele defende, no entanto, que o empreendedor privado que queira investir em porto para movimentar carga de terceiros tenha que obedecer as regras de concessão ainda em elaboração. "Não há restrição de investimentos privados em porto. O que existem são regras", afirma.


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