Economia

Investida chinesa no Brasil vai de sementes a hospitais

Grupos chineses já investiram mais de 10 bilhões de dólares em aquisições de empresas brasileiras em 2017

DRAGÃO CHINÊS: o país passou a ser o segundo maior investidor global, com 183 bilhões de dólares investidos em 2016 / Hong Kong Tourism Board via REUTERS (Hong Kong Tourism Board via REUTERS/Reuters)

DRAGÃO CHINÊS: o país passou a ser o segundo maior investidor global, com 183 bilhões de dólares investidos em 2016 / Hong Kong Tourism Board via REUTERS (Hong Kong Tourism Board via REUTERS/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 2 de dezembro de 2017 às 07h01.

Última atualização em 2 de dezembro de 2017 às 17h37.

O apetite chinês pelo Brasil não tem data para terminar e, em 2018, deve ir além do pacote básico, que inclui ativos de infra-estrutura e de energia. Na quarta-feira 29, o presidente da Agência Nacional de Telecomunicação, Juarez Quadros, afirmou que mais um grande grupo chinês está de olho na operadora de telefonia Oi. Depois de a China Telecom manifestar interesse na empresa, a China Mobile entrou na disputa. Outro potencial investidor é o Banco de Desenvolvimento da China, que já é credor da Oi.

A Oi tem a maior dívida do país, de 65 bilhões de reais, e perdeu 6 milhões de clientes em um ano. A disputa chinesa pela companhia é simbólica: além de mostrar a intensidade do interesse chinês no Brasil, revela que as empresas e grupos de investimento do país estão de olho em toda e qualquer oportunidade de negócios no Brasil, por mais enrolada que seja. Setores ligados ao consumo também já não assustam: depois de anos pesquisando o mercado nacional, chegou, na visão de analistas, a hora de a China ampliar sua presença no país.

Grupos chineses já investiram mais de 10 bilhões de dólares em aquisições de empresas brasileiras em 2017. Entre 2009 e 2016, a China respondia por no máximo 4% do dinheiro investido em fusões e aquisições no Brasil. De janeiro a setembro deste ano a cota subiu para 35%, segundo a consultoria Dealogic. É uma tendência global. Desde 2009, a China passou de 12o para segundo país com mais investimentos produtivos no exterior, atrás apenas dos Estados Unidos. No total, os chineses investiram 183 bilhões de dólares pelo mundo em 2016, uma alta de 44% em relação a 2015.

Nessa toada, o Brasil virou o segundo maior destino de investimentos chineses em infraestrutura desde o ano passado. Os principais negócios, até aqui, ainda estão ligados à infraestrutura e ao campo. Entre os principais negócios de 2017 estão a compra da distribuidora de energia CPFL pela chinesa State Grid, num acordo de 14 bilhões de reais. Nesta quinta-feira a State Grid faria a conclusão da operação com uma oferta das ações ainda listadas na bolsa, mas o negócio foi cancelado por um erro operacional.

Grupos chineses também compraram a TCP, que opera o terminal de contêineres do porto de Paranaguá, a fatia da Odebrecht no aeroporto Galeão, de usinas hidrelétricas, de blocos de petróleo e gás, de tradings agrícolas. “É um ciclo natural, que começa no investimento básico e tende a ficar mais sofisticado com o passar dos anos. Em 2018 haverá maior interesse em outros segmentos que não estavam no radar”, diz Alan Fernandes, presidente no Brasil do banco de investimentos Haitong, um dos mais ativos na conclusão de investimentos chineses no país.

Um dos precursores dessa estratégia é o grupo chinês Fosun, que tem 70 bilhões de dólares em ativos pelo mundo e colocou os dois pés no Brasil ao comprar a gestora Rio Bravo, em 2016. De lá pra cá, o Fosun fechou negócios como a compra da corretora Guide Investimentos e de uma torre comercial no Parque da Cidade, em São Paulo. As negociações em outros setores continuam. A coluna Primeiro Lugar da última edição de EXAME revelou que o Fosun bateu à porta de redes de hospitais em São Paulo, Paraná, Bahia e Pernambuco.

A estratégia do Fosun, segundo Diogo Castro e Silva, seu presidente no Brasil, é investir em negócios ligados à classe média, tanto na China, quanto no resto do mundo. E o Brasil é uma das prioridades, apesar da instabilidade política. “A relação comercial dos dois países tende a ir além da complementariedade das economias, da venda de matéria-prima, do investimento em infraestrutura”, disse em agosto a EXAME. Segundo ele, há um potencial muito grande ainda não explorado na economia digital, que a China lidera.

Até em drones

Um exemplo concreto de como empresas chinesas estão de olho no poder do mercado de consumo brasileiro é a chegada da DJI, a maior fabricante de drones do planeta, está trazendo sua rede de lojas para o Brasil, em parceria com o grupo gaúcho Herval, o maior distribuidor da Apple na América do Sul. A primeira unidade vai ser aberta em dezembro, no Rio de Janeiro. Em entrevista a EXAME, Kevin On, diretor de comunicações DJI, afirmou que o Brasil é uma das prioridades da empresa, especialmente por seu potencial agrícola — a empresa está desenvolvendo drones para tarefas como monitoramento e pulverização de fazendas.

A diversificação deve ser vista também numa obsessão chinesa: o agronegócio. Como existem impeditivos legais para a compra de terras no Brasil, investidores e empresas chinesas têm investido em vários pontos importantes da cadeia agrícola, como grãos, sementes e logística. Nos últimos, fecharam negócios bilionários nestes segmentos no Brasil e no mundo.

Nesta sexta-feira, o fundo chinês Citic Agri Fund concluiu por 1,1 bilhão de dólares a compra do negócio de sementes de milho da empresa química Dow no Brasil. Agora, a subsidiária passa a se chamar LP Sementes. A venda do negócio foi uma exigência do Cade, o conselho de defesa da concorrência, como remédio para a fusão global entre a Dow e a Dupont, outro grande conglomerado químico.

A trading chinesa de grãos Cofco International, por exemplo, investiu mais de 3 bilhões de dólares nos últimos três anos para comprar as trading Nidera, da Holanda, e a asiática Noble Agri. Em novembro, a Cofco anunciou a venda da unidade de sementes da Nidera para a empresa suíça Syngenta, de sementes e químicos agrícolas, num ajuste após a expansão acelerada dos últimos anos. Detalhe importante: a própria Syngenta foi comprada este ano pelo grupo químico chinês ChemChina.

Outra companhia chinesa, a Hunan Dakang, comprou em 2016 a trading e processadora de grãos brasileira Fiagril, do Mato Grosso, uma das líderes do setor no Brasil. Em maio deste ano, a Hunan Dakang comprou a trading paranaense Belagrícola, que faturou 2,8 bilhões de reais em 2016.

“A evolução natural seria o avanço sobre o mercado de carnes. O momento difícil de gigantes como JBS e Marfrig e de frigoríficos menores faz com que sejam alvos óbvios no mínimo para compra de participação”, diz Anderson Galvão, presidente da consultoria de agronegócio Céleres. “Em outros dois países em que a China tem pesados investimentos agrícolas, a Austrália e a Nova Zelândia, a proteína animal já virou um alvo”.

Investimentos na compra de terras, uma dos grandes polêmicas no Brasil e no mundo, têm sido mais restritos. Por lei, pessoas físicas e jurídicas de outros países só podem comprar 25% da área de um município, com limite de 10% para estrangeiros de um mesmo país. Um projeto de lei para liberar a venda de terras está em tramitação na Câmara. Mesmo em regiões com intenso investimento chinês em terras, como alguns países da África, pouco mais de 1% está nas mãos do país liderado por Xi Jinping.

As compras de terras brasileiras, portanto, estão em banho maria, esperando definições políticas. Em dezenas de outras áreas de negócio, a presença chinesa tende a se fazer cada vez mais intensa.

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