Cuba: país busca evitar a fuga de centenas de milhões de dólares, devido às crescentes importações particulares. (Henry Romero/Reuters)
AFP
Publicado em 22 de outubro de 2019 às 17h15.
Última atualização em 22 de outubro de 2019 às 17h24.
A partir desta semana, a população de Cuba podem abrir contas em dólares em bancos locais para adquirir eletrodomésticos, motos elétricas e até encomendar equipamentos específicos usando um cartão de débito.
O governo vai comercializar os produtos e procura, assim, arrecadar divisas, tentando driblar o bloqueio aplicado pelos Estados Unidos desde 1962.
Veja a seguir alguns pontos cruciais para entender as medidas:
Até o fim do mês, começará a funcionar uma rede de lojas estatais para a venda em dólares e outras moedas estrangeiras de produtos de forte demanda de importação, como equipamentos elétricos, eletrodomésticos de luxo, autopeças e ciclomotores.
O pagamento será feito com cartão de débito, que poderá receber transferências do exterior ou de outras contas (em dólares e outras moedas), livre de impostos.
Também poderão importar alguns bens específicos através de empresas estatais (sob a mesma modalidade de conta bancária), sem depender da caixa central estatal.
2. O que se busca?
O governo procura captar divisas, em um contexto em que o governo do presidente americano, Donald Trump, intensifica o embargo, com medidas que afetam o turismo, os investimentos, o envio de remessas e a importação de combustível.
"O país necessita de divisas para financiar" seu "desenvolvimento econômico e social" explicou o ministro da Economia, Alejandro Gil.
Cuba, governada pelo Partido Comunista (PCC, único), busca evitar a fuga de centenas de milhões de dólares, devido às crescentes importações particulares.
Segundo a consultoria privada Auge, apenas na Zona Livre de Colón (Panamá) os cubanos gastaram neste ano em média de "20 milhões de dólares mensalmente".
Com o dinheiro arrecadado, o governo poderia fazer frente à falta de liquidez de seu sistema econômico, pagar a tempo seus provedores e adquirir insumos de que o país precisa.
"É previsível que efeitos positivos sejam observados no curto prazo", prevê o economista cubano Pavel Vidal, da Universidade Javeriana de Cali.
Os bancos estatais poderão fortalecer sua liquidez em dólares e outras moedas estrangeiras, e o governo garantirá uma oferta de produtos deficitários na rede de varejo, sem precisar usar as moedas que aloca para despesas prioritárias.
Por sua vez, os cubanos terão acesso a produtos que até agora só podiam ser comprados em mercados informais e a preços competitivos, enquanto o setor privado local (13% da economia) gastaria menos em viagens para estocar suprimentos.
Gil nega que a venda interna de moedas leve à dolarização de Cuba, que já recorreu à moeda americana entre 1993 e 2004 para superar a grave crise econômica dos anos 90.
Segundo o ministro, as duas moedas nacionais - o peso cubano (CUP) e o peso conversível (CUC, equivalente a 24 pesos cubanos) - continuam circulando e o comércio em dólares será realizado apenas eletronicamente.
Mas os economistas apontam que o processo de dolarização não depende do suporte utilizado, mas do fato de o dólar suplantar as moedas domésticas em algumas funções.
"Autorizar operações com moedas em alguns mercados consumidores e em alguns setores é abrir a caixa de Pandora para uma redolarização acelerada do resto da economia", diz Vidal.
Gil enfatizou que as medidas não impedirão o processo de unificação das duas moedas nacionais, planejado desde 2013, mas colocarão o país em "melhores condições" para atingir esse objetivo, com uma indústria e o comércio fortalecidos.
A moeda dupla é acompanhada de taxas de câmbio preferenciais para o setor estatal, o que distorce a economia.
Vidal alerta que, longe de resolver "o sistema (atual) complexo e distorcido de múltiplas taxas de câmbio e de dualidade monetária", as novas medidas agora "levam a economia a operar não com duas, mas com três moedas".
"A anunciada redolarização cancela a unificação das moedas", considera.