Economia

Comunicação do governo e inflação: os recados de Haddad para 2026

Em entrevista à GloboNews nesta terça-feira, 7, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deu alguns recados importantes que podem reverberar no caminho de Lula na busca da reeleição

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (à direita), e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em reunião no Palácio do Planalto, em Brasília, em novembro de 2024. (AFP/AFP)

O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (à direita), e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em reunião no Palácio do Planalto, em Brasília, em novembro de 2024. (AFP/AFP)

Antonio Temóteo
Antonio Temóteo

Repórter especial de Macroeconomia

Publicado em 7 de janeiro de 2025 às 18h26.

Última atualização em 7 de janeiro de 2025 às 19h13.

Em entrevista à GloboNews nesta terça-feira, 7, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deu alguns recados pontuais que precisam ser amarrados e analisados dentro de um contexto maior: o projeto de reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2026.

Haddad é o ministro com maior prestígio junto a Lula. Coube a ele a tarefa de convencer o presidente a enviar ao Congresso um pacote de corte de gastos e se manter no no esforço de reconstruir as pontes do PT com o mercado.

Lula enxerga no ministro da Fazenda uma figura de renovação entre os petistas e tem dado carta – quase – branca ao auxiliar para comandar a política fiscal brasileira. A decisão final sempre é do chefe do Executivo.

Toda essa proximidade, entretanto, não evita ruídos. Seja pelo fogo amigo de correligionários petistas, de ministros ou pelas declarações do próprio presidente, Haddad tem gastado parte significativa de seu tempo para tentar conter as repercussões negativas que se materializam no preço do dólar, nos juros futuros, nos prêmios de risco e no Ibovespa.

Eis então o primeiro recado da entrevista desta terça-feira: a comunicação. Haddad reconheceu haver um problema de comunicação no governo que precisa ser enfrentado. O ministro fez um mea culpa e afirmou que ele e os próprios auxiliares também têm errado em se comunicar com a sociedade.

“Temos de nos comunicar melhor. [O governo] tem de ser coerente e resoluto na sua comunicação. Não podemos deixar brecha para os resultados que queremos atingir. Não vale só resultado de emprego e crescimento. Crescimento é bom, mas temos de olhar para o déficit em transações correntes, por exemplo”, disse.

O esforço de Haddad para tentar melhorar a comunicação do governo ganhou mais força após o ruído que intensificou a crise de confiança na economia brasileira, decorrente do anúncio simultâneo do pacote de cortes de gastos e da proposta de isenção de Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) para quem ganha R$ 5 mil mensais. O mercado interpretou a medida, divulgada conjuntamente, como eleitoreira — e pouco eficaz para equilibrar as contas públicas.

Após a aprovação do pacote, Lula gravou um vídeo ao Lado de Haddad, do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, do ministro da Casa Civil, Rui Costa, e da ministra do Planejamento, Simone Tebet. Na ocasião, o presidente fez um gesto a Galípolo e afirmou que não haverá interferência do governo na autoridade monetária. O ministro da Fazenda teve papel determinante para que Lula gravasse o vídeo.

Comunicação e unidade para 2026

A mudança na comunicação tem por objetivo melhorar os índices de popularidade de Lula para que ele chegue competitivo no processo eleitoral de 2026. O presidente tem dito publicamente que a população não tem conhecimento dos feitos do governo.

A guinada na comunicação do governo e de Lula, que começou com a divulgação do vídeo ao lado do presidente do BC, terá como segundo ato a substituição do ministro Paulo Pimenta do comando da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República pelo publicitário Sidônio Palmeira. Na transição entre as equipes, Ricardo Stuckert, secretário de Audiovisual e fotógrafo oficial de Lula, é o único ou um dos poucos que permanecerão em um posto-chave da pasta.

Segundo auxiliares do presidente, Sidônio recomendou a Lula que evite confrontos com o mercado e que busque maior unidade entre os ministros para potencializar a execução dos projetos de cada área. Não à toa, na confraternização de fim de ano no Palácio da Alvorada em 20 de dezembro o presidente reuniu os 38 ministros – e Sidônio. Uma foto da equipe ministerial foi um passo nessa direção.

Na prática, o recado é de que o governo precisa trabalhar unido, com entregas de obras, projetos e alcançar resultados em 2025 que terão potencial de cacifar Lula a disputar a reeleição em 2026. Lula inclusive, já determinou ao ministro da Casa Civil, Rui Costa, que intensifique o acompanhamento das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em todos os estados do Brasil. O plano de Lula é inaugurar o maior número de obras ao longo de 2025.

Reunião de ministros no Alvorada: ideia é comunicar união da equipe do Executivo (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

É a economia!

Além de reforçar a existência de um problema de comunicação no governo, Haddad enviou outro recado direto e importante: “A economia sempre vai fazer a diferença em qualquer eleição”.

Significa dizer que a reeleição de Lula depende de inflação controlada, juros baixos, crescimento econômico, geração de empregos, atração de investimentos e bom ambiente de negócios.

Com a inflação próxima de 5%, nas projeções do mercado, e expectativas desancoradas até 2027, Haddad sabe que há um risco à reeleição de Lula e aos seus próprios projetos políticos.

O ministro, naturalmente, evita sinalizar publicamente qualquer disposição em ser candidato à Presidência da República, mas dez entre dez políticos sabem que sua ida para o Ministério da Fazenda é um passo determinante nas ambições de suceder Lula no Palácio do Planalto.

Tanto Haddad quanto Lula sabem que a alta generalizada de preços tem peso eleitoral desde a redemocratização do país e o processo de estabilização econômica com o Plano Real.

Galípolo, por sua vez, demonstrou publicamente que trabalhará para conter a escalada de preços, se comprometeu em levar os juros a 14,25% ao ano já em março, e não dá sinais de que abrirá mão da credibilidade pessoal e do BC. Agora, a bola está com o ministro da Fazenda. E mais ainda com Lula.

A batalha constante do controle da inflação passa, em partes, pela comunicação do governo e mais pela disposição concreta de Lula em sinalizar um compromisso com o equilíbrio das contas públicas. Esse compromisso dispensa a criação de programas sociais fora das regras fiscais ou de medidas que relembrem a contabilidade criativa usada excessivamente durante a gestão petista de Dilma Rousseff.

Os problemas de comunicação e as decisões do governo são parte importante no processo que retroalimenta a inflação. A desancoragem das expectativas começou quando a equipe econômica, com o aval de Lula, flexibilizou o arcabouço fiscal em abril do ano passado, com a mudança das metas fiscais dos próximos anos. A previsão inicial era de zerar o déficit público no ano passado e essa meta foi adiada para 2025.

Além disso, a gestão petista se comprometeu em alcançar superávits consecutivos de 0,25%, 0,5% e 1% do produto interno bruto (PIB), respectivamente, nos anos de 2026, 2027 e 2028. Essa decisão foi mal-recebida pelo mercado e se refletiu nas expectativas de inflação e no preço do dólar. Ao adiar os planos de zerar o déficit público, o governo sinaliza que gastará mais, o que pressiona a inflação.

O atual governo vai até 2026. Para cumprir com o cronograma de superávits prometidos para 2027 e 2028, é preciso garantir um novo mandato em uma eleição que se desenha como acirrada. Os recados de Haddad tentam organizar o caminho petista até lá. Mas a decisão final é sempre do chefe do Executivo.

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