Economia

Competitividade: Brasil só fica à frente de África do Sul, Mongólia, Argentina e Venezuela

País ficou na 60ª posição em relatório global do IMD sobre competitividade econômica com 64 países. Dinamarca é o país mais competitivo do mundo

Infraestrutura segue como um dos principais desafios à competitividade da economia brasileira (Adriano Machado/Reuters)

Infraestrutura segue como um dos principais desafios à competitividade da economia brasileira (Adriano Machado/Reuters)

Luciano Pádua
Luciano Pádua

Editor de Macroeconomia

Publicado em 19 de junho de 2023 às 19h02.

O Brasil perdeu uma posição e ficou em 60º lugar no Anuário de Competitividade de 2023, um dos principais estudos sobre o tema no mundo e elaborado pelo IMD Competitiveness Center, da escola de administração Lausanne, na Suíça, em parceria com a Fundação Dom Cabral (FDC) no Brasil. Com o resultado, o país ficou à frente apenas da África do Sul, Mongólia, Argentina e Venezuela dentre os 64 países analisados. 

Assim como no ano passado, o Brasil segue entre as nações menos competitivas do mundo, segundo a nova edição do estudo, divulgado globalmente nesta segunda-feira, 19. O estudo compara 64 nações, com base em dados estatísticos e pesquisa de opinião executiva (realizada de fevereiro a abril de 2023), em termos de capacidades em gerenciar fatores e competências que possibilitem alcançar um crescimento econômico de longo-prazo.

O país mais competitivo no estudo deste ano foi a Dinamarca, que foi líder do ranking pela segunda vez nas 34 edições publicadas até agora. Já a Irlanda subiu 9 posições, da 11ª para a 2ª colocação no ranking. Completa o pódio a Suíça, que caiu da segunda para a terceira colocação.

Além dos pequenos países asiáticos e nórdicos, que dominam os primeiros lugares, na lista de grandes economias que também conseguiram figurar no topo do ranking estão Estados Unidos (9º), Alemanha (23º) e China (21º).

O desafio do Brasil

"O Brasil permanece entre os piores resultados do ranking (60º de 64 nações), à frente apenas da África do Sul, Mongólia, Argentina e Venezuela, países com graves problemas institucionais e econômicos", diz Carlos Arruda, professor associado da Fundação Dom Cabral.

Segundo ele, em alguns pilares, não houve muitas mudanças em termos de resultado. "Mas é importante lembrar que, em um ranking, estabilidade dos resultados pode implicar em uma queda caso outro país avance", afirma.

De maneira geral, o desempenho nacional leva às últimas posições em indicadores como Eficiência do Governo (62º), sobretudo na avaliação de indicadores de Finanças Públicas (64º) e Legislação Empresarial (62º), que consideram, por exemplo, o número de procedimentos médio para abrir uma empresa (60º).

"Uma queda que chamou atenção nessa edição foi no pilar de Eficiência dos Negócios (de 52º para 61º), que avalia como o ambiente nacional incentiva a atuação inovadora, lucrativa e responsável das empresas", diz Arruda. "A queda é resultado, principalmente, da dificuldade do país em reter seus talentos (estamos em 49º no indicador de fuga dos cérebros, ou seja, somos o 13º país que mais perde talentos entre as nações do ranking), e também da baixa produtividade da mão de obra brasileira, fator fortemente associado aos níveis de educação."

O professor associado da Fundação Dom Cabral pondera que, embora o país se destaque no gasto total investido, a qualidade da educação brasileira está "bem distante da desejável" -- como mostram os resultados nacionais no teste PISA. "Isso demonstra relativa ineficiência dos investimentos públicos realizados na área e explica parcialmente a última colocação do Brasil no fator de Educação", afirma.

Eterno vilão da capacidade competitiva nacional, a infraestrutura segue como desafio. "Em especial na básica, que são as instalações e estruturas necessárias para o funcionamento do país, como rodovias, saneamento básico, energia etc", afirma Arruda.

Apesar do avanço em infraestrutura científica, com bons resultados em indicadores de produção de Pesquisa e Desenvolvimento, a interação do setor acadêmico com a indústria ainda é baixa, o que dificulta o progresso do desempenho inovativo brasileiro.

Caminhos para o crescimento

Arruda ressalta que, na última década, a economia brasileira apresentou o pior desempenho de sua história em termos de crescimento econômico, como mostrado por EXAME em novembro de 2022. "Tudo isso tanto por fatores internos, amplamente apresentados no relatório (Finanças Públicas, Estruturas Institucionais, Educação, Infraestrutura, entre outros), como também por fatores externos (Guerra comercial entre EUA e China, Guerra na Ucrânia, Crise Argentina, Incerteza Internacional)", afirma.

Para ele, alguns caminhos de reversão do cenário de estagnação econômica dependem, sobretudo, de um pacote de reformas estruturantes, que andam "muito devagar", em sua avaliação. "Esse pacote constituiria medidas que melhorem o ambiente de negócios brasileiro (facilitando processos burocráticos de abertura de empresas, por exemplo) e que reduza incertezas acerca do cenário das contas públicas e apresente melhorias na eficiência dos gastos governamentais, em especial em áreas como infraestrutura básica e educação de qualidade", diz.

Além disso, para o professor, o Brasil deve também saber aproveitar as novas oportunidades que surgem no cenário competitivo internacional. "O Brasil é protagonista quando o assunto é pauta ambiental, e há possibilidade de atração de investimentos importantes nesse setor, como produção de energia limpa, bioeletrônica, e outros projetos que, aliados às reformas estruturantes necessárias, podem reverter o quadro recessivo brasileiro", afirma.

Como foi o mundo?

No topo do ranking, a predominância é de economias europeias e asiáticas. A Dinamarca continua na liderança, seguida da Irlanda (2º), que foi um dos destaques do ano ao subir da décima primeira posição para a segunda colocação -- superando a Suíça, que caiu para o terceiro lugar. Os Estados Unidos, maior economia do mundo, subiu uma posição (de 10º para 9º).

Segundo os pesquisadores, a Irlanda se destaca por ter avançado em todos os pilares do estudo, ficando em 1oº lugar Desempenho Econômico (de 7º para 1º), e 3º lugar nos pilares Eficiência Governamental e Eficiência dos negócios (de 11º para 3º em ambos).

"A economia irlandesa, que foi fortemente afetada pela crise de 2008, com deterioração das contas públicas e altas taxas de desemprego, apresenta em 2023 um cenário completamente diferente após reformas econômicas realizadas pelo governo irlandês", diz trecho do relatório. "Diversas filiais (headquarters) de multinacionais na Europa foram atraídas para o país, principalmente pelo tributo corporativo relativamente baixo, além de fácil acesso ao mercado europeu, mão de obra qualificada, e boa infraestrutura. Com melhoras no quadro econômico, foram criados fundos de emergência com recursos provenientes dos recentes superávits primários com o intuito de reverter ou mitigar possíveis quadros de recessão econômica, o que favorece a uma estabilidade da economia e atração de investimentos."

O país liderou o crescimento real do PIB per capita e fluxos de investimento direto no exterior entre as nações analisadas. Em 2022, o PIB irlandês cresceu 12%, segundo o escritório central de estatísticas.

Outros destaques do estudo:

  • Indonésia, que registrou o maior aumento (de 44º para 34º)
  • Letônia, que registrou a maior queda (de 35º para 51º).

Como foram os BRICS?

Entre os BRICS, com exceção de Rússia e a Ucrânia, que não foram incluídas nessa edição do anuário, as colocações ficaram da seguinte maneira:

  • China (21ª)
  • Índia (40º),
  • Brasil (60º)
  • África do Sul (61º)

China caiu quatro posições

No caso da China, embora liderança incontestável entre os membros do bloco, o gigante asiático perdeu 4 posições (de 17º para 21º) no ranking ao ter piores posições em todos os pilares, com exceção da avaliação de Infraestrutura, que se manteve estável.

"O fator Emprego foi o de maior queda (de 15º para 29º), com aumento do desemprego de 3,96% para 5,60% e de 11,35% para 14,25% entre os mais jovens. Segundo OCDE, a previsão de crescimento de longo prazo da empregabilidade para os próximos cinco anos deve ser negativa, de –3,18%", ressaltam os pesquisadores. "O nível de desemprego juvenil no país é preocupante e acompanha o cenário de mudança econômica recente do país, de um país com foco na produção de manufatura de baixo custo
para exportação de produtos de média-alta tecnologia, afetando principalmente os novos ingressantes no mercado de trabalho."

Também pesou no desempenho chinês o aumento do déficit primário do governo, de –5,90% para 7,60% do PIB em 2022, consequência do aumento dos gastos públicos e queda na arrecadação de tributos no contexto da política “covid zero”.

Crescimento asiático - e declínio latino

O anuário do IMD destaca que os países asiáticos têm demonstrado avanços constantes nos rankings desde sua criação. Projeções do Banco Mundial divulgadas no relatório Perspectivas Econômicas Global 20235 preveem crescimento do PIB em torno de 1,5% para a América Latina, enquanto o Leste Asiático e Pacífico espera crescer 5,5%.

"Um dos destaques da nossa análise deste ano é a estagnação dos países latino-americanos entre as últimas colocações, enquanto alguns países asiáticos sustentam boas colocações e, até mesmo, crescimento, como foi o caso da Indonésia, país emergente do sudeste asiático que avançou 10 posições. A China, apesar da queda na maioria dos pilares e altas taxas de desemprego entre os jovens, possui um dinamismo econômico sólido e uma economia doméstica em destaque", diz Arruda, da Fundação Dom Cabral.

Já na América Latina, com exceção do Chile (44º), todos os demais se encontram entre os dez últimos colocados, incluindo as duas últimas posições. Desde o início dos estudos, nações latino-americanas vêm perdendo terreno e sendo "desafiadas" por economias emergentes da Ásia, mais competitivas.

Em 1980, o PIB per capita do Brasil era de U$ 8.248, enquanto o da Coreia do Sul alcançava apenas U$ 6.064. Após 38 anos, em 2018, o valor foi de U$ 14.033 para o Brasil e U$ 37.927 para o país asiático, segundo dados apontados pela base de dados da Universidade de Groningen (confira o gráfico abaixo).

Anuário de Competitividade

Os quatro principais critérios analisados no ranking do IMD são 

(i) o desempenho da economia;

(ii) a eficiência do governo;

(iii) a eficiência dos negócios;

(iv) infraestrutura, divididos em mais de 300 subitens.

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