Campo de novos negócios na Índia
A Índia começa a colher os frutos econômicos e sociais de investimentos privados em agricultura, mais eficientes do que as políticas protecionistas e de subsídios do governo
Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.
Ao chegar à Índia, em 1996, os executivos do McDonald's, maior rede global de fast food, tiveram de suar a camisa para conseguir suprir localmente a demanda de batatas congeladas fritas em suas lojas. McDonald's sem McFritas? Parecia loucura, sobretudo na Índia, terceiro maior produtor de batatas do mundo. A importação de batatas processadas, numa economia conhecida por seu protecionismo, revelou-se outro suplício e foram necessários anos e 100 milhões de dólares em investimentos até que o McDonald's conseguisse montar uma cadeia de fornecedores para suas 170 lojas indianas. A estratégia de produção das McFritas na Índia envolveu a chegada de fornecedores estrangeiros, a parceria com empresas locais e a melhoria na produtividade e na qualidade de agricultores. Hoje, a McCain Foods, uma das principais fornecedoras globais do McDonald's, atende à demanda total da rede na Índia graças a contratos estabelecidos ao longo dos anos com os pequenos agricultores da região, que produzem a matéria-prima para abastecer sua fábrica instalada na cidade de Mehsana, no estado de Guzerate, no oeste da Índia.
Trata-se de um dos mais bem-sucedidos exemplos de como os investimentos privados têm promovido o progresso e aumentado a renda no campo indiano. A McCain Foods tem contrato com 400 pequenos proprietários rurais, que produzem batata numa área que soma cerca de 810 hectares. Eles receberam treinamento e investimentos em infraestrutura de irrigação e foram parceiros da companhia em diversos experimentos nos últimos anos para aperfeiçoar o produto. Outras empresas, como Pepsico, Nestlé, Unilever e Cargill, têm atuado de forma semelhante na Índia - até por questão de sobrevivência. "Esse modelo de parceria tem se provado um sucesso para as empresas e os agricultores", afirma Alessandro Magnoli Bocchi, economista especializado em Ásia do KCIC, banco de investimento com sede no Ku wait.
Cada vez mais empresas tentam desbravar a enorme promessa indiana, atraídas pelo crescente mercado consumidor do país. O PIB da Índia cresceu 6,6% no ano passado e as projeções para 2010 e 2011 são de uma taxa de expansão média de 8%. A multiplicação de redes de restaurantes e supermercados tem estimulado pouco a pouco os avanços na agricultura. Dona de um dos mais vastos territórios agricultáveis do mundo - atrás apenas dos Estados Unidos em área de lavouras -, a Índia tem potencial não apenas para suprir sua grande demanda interna por alimentos mas também para se tornar uma potência internacional do setor. Líder na produção de alimentos como arroz, trigo, cana- de-açúcar e batata, o país ainda agrega pouco valor a esses produtos e exporta apenas uma fração do que Estados Unidos, Brasil, China, Canadá e Rússia vendem no mercado internacional.
Parte dessa defasagem se deve a uma produção predominantemente rudimentar e extremamente fragmentada (a área média das propriedades rurais na Índia é de apenas 1,3 hectare) e a grandes defi ciên cias de infraestrutura (só 30% das terras possuem sistemas de irrigação). O país das contradições no campo produz mais tratores do que qualquer outra nação. No entanto, pode-se viajar por ho ras nas zonas rurais sem notar nenhum sinal de tecnologia. "A Índia reserva oportuni da des extraordinárias no agronegócio. A produtividade média de cereais no país é de cerca de 3 toneladas por hectare, enquanto a média mundial é de 4,5 tone la das. Não seria difícil trazer o país aos patamares globais com investimentos em tecnologia e capacitação", diz Magnoli Bocchi.
Estados como Karnataka, Rajastão e Guzerate - onde foram aprovadas regras para facilitar a entrada de investidores privados e estrangeiros por meio de parcerias com fazendeiros e cooperativas sem envolver a propriedade das terras - crescem a um passo mais acelerado do que outras regiões rurais do país ainda dominadas pelo protecionismo. Nessas localidades, o governo defende que a presença de grandes empresas no agronegócio pode sufocar famílias que, assim como mais de 50% da população indiana, tiram seu sustento de atividades agrícolas. A política estatal subsidia a produção e a compra de fertilizantes, além de estipular preços fixos para determinadas commodities, medidas que, segundo organizações como o Banco Mundial, desencorajam a diversificação do uso das terras e o aumento da produtividade. De acordo com um estudo do International Food Policy Research Institute, órgão que elabora soluções políticas para suprir a necessidade de alimentos nos países em desenvolvimento, investimentos em pesquisa agrícola e capacitação se revertem em dez vezes mais renda no campo do que valores gastos em subsídios para fertilizantes, por exemplo. Mas governantes protecionistas quase nunca se dobram ao poder das estatísticas.