Economia

"Brasil deixou de ser coadjuvante para ser protagonista", diz Mantega

No discurso de encerramento da festa de MELHORES E MAIORES, ministro diz que a atual crise foi diferente porque o país pôde adotar políticas anticíclicas

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 8 de julho de 2009 às 00h08.

Coube ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, fazer o discurso de encerramento da cerimônia de premiação de MELHORES E MAIORES, o maior ranking de empresas do país, produzido pela revista EXAME. Mantega afirmou que na atual crise "o Brasil deixou de ser coadjuvante para ser protagonista". Leia abaixo as íntegras do discurso e da entrevista concedida após a premiação:

"Quero cumprimentar Roberto Civita e, através dele, toda a equipe da Revista Exame e da Editora Abril. Quero Cumprimentar meu amigo Luciano Coutinho, presidente do BNDES, e, através dele, todas as autoridades aqui presentes. Quero cumprimentar as empresas que estão sendo homenageadas e, através delas, todos os trabalhadores e empresários que ajudaram a impulsionar a economia brasileira em 2008 e a estão impulsionando em 2009.

Senhoras e senhores,

Os empresários, assim como os políticos e os governantes, estão sempre enfrentando novos problemas e cada vez maiores desafios. Mesmo nos melhores momentos, os empresários enfrentam a concorrência e os políticos enfrentam os conflitos inerentes aos regimes democráticos.

Certamente, quando eclode uma crise mundial com a amplitude da que estamos vivendo, a situação fica muito difícil e os desafios tornam-se muito maiores. No entanto, se esta crise nos trouxe muita dor de cabeça e interrompeu o mais longo ciclo de crescimento do Brasil desde os anos 70, também nos trouxe oportunidades.

Em primeiro lugar, a oportunidade de mostrar ao mundo que o Brasil é um outro País. E que podemos enfrentar a crise em condições muito mais favoráveis do que outros países. Não é a primeira vez que o País se depara com uma crise internacional. Nas vezes anteriores, a fragilidade econômica levava a adoção de medidas pró-cíclicas, que pioravam o quadro econômico.

As taxas de juros eram aumentadas para impedir a fuga de capitais, o endividamento crescia, o governo era obrigado a aumentar o superávit primário e a cortar investimentos e gastos correntes. Assim, o PIB caía, o desemprego aumentava e a economia se enfraquecia.

A crise atual demonstrou que o Brasil é efetivamente um País muito diferente do passado. Um País mais maduro que se preparou nos últimos anos, controlou a inflação, equilibrou as contas públicas, reduziu a dependência externa, com a diversificação do comércio e, especialmente, com a acumulação de reservas. Iniciou um processo de distribuição de renda e, enfim, colocou o País na rota do desenvolvimento.

O Brasil deixou de ser um coadjuvante para ser protagonista dos processos históricos globais. Basta ver nossa liderança na transformação do G-20 em fórum central, na discussão da crise financeira e na articulação da ação comum dos governos.

A crise trouxe uma novidade em relação às crises passadas. Revelou a possibilidade de realizarmos políticas anti-cíclicas ou anti-crise, como há muito não se fazia. Nosso governo adotou rapidamente uma série de medidas de estímulo nos campos fiscal e monetário, com resultados palpáveis.

A pronta reação à crise e a resposta positiva da sociedade mostraram a criatividade e a pró-atividade do Brasil. Mostrou um País mais forte em relação a outros países do mundo, tanto avançados, quanto emergentes. Há hoje um reconhecimento internacional da solidez e atratividade de nossa economia. Como temos reiterado, o Brasil foi um dos últimos países a entrar na crise e será um dos primeiros a sair dela.

A crise exigiu ousadia, para enfrentar o medo, rapidez nas decisões, para impedir que a crise se implantasse, e confiança nas ações a serem adotadas. Creio que esses ingredientes estão presentes nas ações do governo no comportamento dos empresários e em toda sociedade brasileira.

A massa salarial manteve o consumo elevado e as medidas de crédito e a desoneração tributária impulsionaram vários setores, entre os quais o setor automobilístico, responsável por uma cadeia que representa mais de 20% do produto de indústria de transformação. As vendas de janeiro a julho representaram o melhor resultado já alcançado pela indústria automobilística. No mês de julho, foram licenciados 300 mil veículos, contra 256 mil de julho passado.

Somente a China e a Alemanha tiveram êxito em manter esse desempenho do setor automotivo e a um custo muito mais alto. A China fez um programa de gastos públicos de US$ 580 bilhões, enquanto a Alemanha distribuiu cheques de até 5 mil euros para os compradores de carros novos.

E ainda há medidas cujo impacto ainda não se fez sentir, como o Programa Minha Casa Minha Vida, que garante a demanda de cerca de um milhão de habitações com subsídios do governo e coloca um desafio para o setor de construção ampliar sua capacidade de oferta. Na semana passada, reduzimos a TJLP e todos os juros para o setor de bens de capital, inovação e exportação, de modo a criar um forte estímulo para a retomada dos investimentos.

A equalização dos juros do BNDES pelo Tesouro permitirá uma redução de até 50% no juro final para a aquisição de máquinas, equipamentos e caminhões. A maioria das linhas de crédito poderá operar com juro real próximo de 4,5% ao ano. Portanto, estamos falando de juro real quase zero, o que é raro no nosso sistema financeiro. Gostaria de ressaltar que essas desonerações e subsídios não comprometem nossa situação fiscal, que continuará sólida e muito melhor que a maioria dos países.

A redução provisória do superávit primário de 2009 para 2,5% do PIB, devido também à retirada da Petrobras desse cálculo, não afetará o endividamento do Estado brasileiro, mesmo porque acumulamos lastro e os gastos com juros estão caindo. No próximo ano, voltaremos ao superávit primário de 3,3%, que é o mesmo dos anos anteriores, excluídas a Petrobras.

Na verdade, a relação dívida/PIB continuará caindo nos próximos anos, como está caindo desde o primeiro mandato do Presidente Lula. Na contramão dos principais países, cuja dívida pública está subindo meteoricamente. Para se ter uma idéia do bom desempenho fiscal brasileiro, basta ver que, pelas estimativas do FMI, o Brasil terá o melhor desempenho fiscal de todos os países do G-20.

A previsão para 2009 é de um déficit nominal de aproximadamente 2,0% e em 2010 de 0,8% do PIB. Para se ter uma idéia, a previsão para os Estados Unidos é de um déficit fiscal de 13,6% em 2009 e de 9,7% em 2010. Basta dizer que o resultado fiscal brasileiro de 2009 e 2010 será melhor que o da Rússia, da China e da Índia, para ficarmos apenas na órbita dos BRICs.

Senhoras e Senhores,

Iniciamos o segundo semestre de 2009 com a economia se recuperando e já dando sinais de que caminhamos em direção a um final de ano com crescimento no último trimestre de mais de 3%. Não tenho dúvidas que em 2010 estaremos crescendo a mais de 4% ao ano, retomando o dinamismo dos últimos 5 anos.

Está se aproximando o momento em que a crise deixará de ser um problema e se transformará em uma grande oportunidade para o Brasil e para os brasileiros. A oportunidade de sair na frente - de ocupar o espaço deixado pelos países que continuarão patinando e atrair investimentos externos -, oferecendo talvez a melhor combinação entre solidez e rentabilidade.

Certamente, isso não virá de graça e nem por inércia. Mas vai depender da ousadia e de um trabalho árduo dos senhores, dos trabalhadores, do Governo, da imprensa e de toda sociedade brasileira pela permanente transformação de nosso País.

Muito obrigado e parabéns a todos!"

Leia a seguir a entrevista concedida por Guido Mantega após a cerimônia de premiação de MELHORES E MAIORES 2009:

Pergunta - Nós acompanhamos um vídeo que mostra que o Brasil deixou de ser o país do futuro para ser um país do presente. O senhor concorda?

Mantega - É o que todos estão dizendo. O Brasil é considerado hoje um país de oportunidade. Um país sólido que oferece possibilidades e condições. Portanto, será um endereço privilegiado para investimentos externos.

Pergunta - O mundo viveu uma das suas piores crises mundiais. A que o senhor atribui a grande reação do país nessa crise?

Mantega - Talvez pela primeira vez nos últimos anos o Brasil estava preparado para enfrentar uma crise dessas proporções. Nós estávamos crescendo, tínhamos fortalecido as finanças públicas, a inflação estava sob controle e o sistema financeiro brasileiro estava melhor que o dos outros países. Por causa disso, nós fomos os últimos a entrar nessa crise e seremos um dos primeiros a sair dela.

Pergunta - O senhor disse que para manter o superávit fiscal é preciso cortar despesas. Quais seriam elas?

Mantega - Para mantermos o equilíbrio fiscal e o superávit prometido nos próximos anos, nós temos que vigiar as despesas e cortar aquelas que não comprometem os principais programas do governo, ou seja, o Bolsa Família, os investimentos, etc.
 

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