Michel Temer: o Brasil prefere o diálogo, mas não descarta essa possibilidade (Adriano Machado/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 3 de março de 2018 às 10h14.
Brasília - O governo brasileiro aguarda a publicação da medida anunciada na quinta-feira pelo governo dos Estados Unidos, que imporá uma sobretaxa de 25% sobre suas importações de aço, para decidir o que fazer a respeito. A medida, uma promessa de campanha do presidente Donald Trump para a indústria siderúrgica local, prejudica fortemente as exportações do Brasil, que é o segundo maior fornecedor daquele mercado.
"Vamos esperar para ver e reagir com serenidade", disse o subsecretário-geral de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores, embaixador Ronaldo Costa. "Queremos ver o que vai ser publicado antes de tomar uma decisão."
A reação de vários países potencialmente prejudicados pela medida foi indicar a intenção de ingressar com ações na Organização Mundial do Comércio (OMC). O Brasil prefere o diálogo, mas não descarta essa possibilidade. Porém, como a medida foi apenas anunciada, sem mais detalhes, não é possível saber se e como esse questionamento se dará.
Para tentar driblar uma eventual condenação na OMC, que pune restrições ao comércio como essa sobretaxa, os Estados Unidos alegaram risco à segurança nacional. Isso coloca um desafio para o organismo multilateral. Até o momento, apenas a Rússia usou esse dispositivo para restringir o trânsito de mercadorias da Ucrânia. Houve questionamento, mas ainda não há decisão. Ou seja, não se sabe até que ponto um país pode usar o risco à segurança como argumento para barrar o comércio.
O anúncio da sobretaxa às importações de aço levantou resistências dentro do próprio mercado americano. O Brasil aguarda para ver se o lobby contrário dos segmentos da indústria local que serão prejudicadas pela medida mudará a decisão.
A restrição às importações de aço é discutida pelos escalões técnicos do Departamento de Comércio desde o início do governo Trump. Integrantes do governo brasileiro e da indústria siderúrgica nacional vinham apresentando argumentos para tentar livrar o produto nacional da limitação.
O principal argumento é de que 80% do que o Brasil exporta para o mercado americano são produtos semiacabados de aço. Ou seja, são insumos para a própria indústria siderúrgica local, que Trump quer proteger. Na última terça-feira, o ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Jorge, reuniu-se com o secretário de Comércio norte-americano, Wilbur Ross, para um último esforço de preservar o Brasil de eventuais novas barreiras ao aço.
Ele alegou que, dada a complementaridade das cadeias produtivas, o produto brasileiro não representa risco à indústria local, nem à segurança dos Estados Unidos. Outro ponto levantado pelos brasileiros é que a indústria siderúrgica nacional utiliza carvão americano na sua produção. Ou seja, a restrição prejudicaria os dois lados do comércio.
A sobretaxa de 25% é próxima a uma das três alternativas sugeridas pelo Departamento de Comércio ao presidente Trump. Os técnicos haviam proposto uma sobretaxa de 24% a ser aplicada sobre todos os fornecedores internacionais de aço dos EUA.
Outra opção, ainda mais prejudicial às exportações brasileiras, seria a imposição de uma sobretaxa de 53% para apenas 12 países, inclusive o Brasil. Uma terceira alternativa seria limitar as importações de aço pelos EUA a 63% do que havia sido importado no ano passado. Em 2017, o Brasil exportou US$ 2,6 bilhões em produtos de aço para os Estados Unidos, segundo dados do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC).
O consultor Welber Barral avaliou que a sobretaxa de 25% pode tornar inviáveis as vendas de aço brasileiro para aquele mercado. Ele comentou também que a restrição de compra por parte dos EUA, que são o segundo maior consumidor global de aço, vai agravar o problema de sobreoferta do produto que se verifica desde 2009. Assim, o aço brasileiro deverá enfrentar uma concorrência ainda mais forte em outros mercados para os quais é exportado. Há risco, ainda, de o próprio mercado brasileiro ser inundado com aço importado.
Se a decisão dos EUA provocar uma guerra comercial planetária, as consequências poderão ser ainda mais severas, alertou o consultor. Ele observou que a crise de 1930 começou justamente com o governo norte-americano adotou tarifas elevadas no comércio exterior e sofreu retaliações de outros países, levando à quebra da Bolsa de Nova York.