BC pode aderir à contabilidade criativa, dizem economistas
Boa parte dos economistas recebeu com desconfiança a criação de um novo instrumento de política monetária para o Banco Central
Da Redação
Publicado em 23 de março de 2016 às 11h35.
São Paulo - Boa parte dos economistas recebeu com desconfiança a criação de um novo instrumento de política monetária para o Banco Central (BC).
Ao anunciar a opção, dentro do pacote fiscal, na última segunda-feira, 21, o ministro da Fazenda , Nelson Barbosa, disse que o instrumento pode ajudar a reduzir a dívida pública, que está numa trajetória de alta.
Para especialistas da área, porém, dependendo da forma como for implantado, pode, na verdade, lançar uma nova modalidade de "contabilidade criativa" e "maquiar" a dívida pública.
Ao anunciar a medida, o ministro Barbosa destacou que, se aprovada, ela não deve substituir as operações compromissadas. Seria mais uma opção para o BC. Mas a mudança tem, grosso modo, sutilezas que incomodam os especialistas.
Hoje, para calibrar a quantidade de dinheiro no mercado, o Banco Central oferece títulos públicos, que são comprados principalmente por bancos, com o compromisso de recompra dos papéis, em prazos e mediante uma taxa de remuneração previamente acertados.
Por causa desse "compromisso", essas operações são chamadas de "compromissadas".
A proposta do governo, é reduzir esse tipo intervenção por outra, que dispensaria o uso do títulos públicos.
O BC passaria a receber depósitos do bancos, com o compromisso de devolver o dinheiro em prazos e mediante uma taxa de remuneração previamente acertados - por isso eles têm o nome de depósitos remunerados.
"Na prática, seria a mesma operação, com a diferença de que não haveria o título público", explica o economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal e ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda.
"Não vai ter problema se o governo, antes, mudar a relação que existe hoje entre o Banco Central e o Tesouro e também adotar o cálculo de dívida do Fundo Monetário Internacional, caso o contrário, a mudança pode maquiar a dívida pública", diz Appy
Críticas
O ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central (BC), Alexandre Schwartsman, classificou a proposta como "mais uma pedalada".
Schwartsman lembra que, na carteira de títulos do BC hoje já há algo em torno de R$ 1,3 trilhão ou seja, por fora, a dívida, pelo lado do BC, chegaria a R$ 1,03 trilhão.
"Se for trocada compromissada por depósito, vai ser escondida uma dívida de mais de R$ 1 trilhão. Nada mais é do que mais uma pedalada do governo", disse.
O economista Gustavo Franco, ex-presidente Banco Central e sócio da Rio Bravo Investimentos, tem o mesmo receio. Para Franco, em princípio, "não é uma má ideia" a mudança.
Porém, chamou a atenção para o fato de a operação ter o mesmo efeito das compromissadas na gestão de liquidez (oferta de dinheiro no mercado), mas não entra na estatística da dívida.
"Aí me desculpe, estamos fazendo uma pedalada, uma criatividade contábil. Se o BC está criando um passivo deste tipo, isso deveria constar da estatística de dívida. Quando você estiver com a autoridade, pergunte a ela: o senhor faria o depósito voluntário se ele contasse para a dívida pública? Aí vamos ver o que o ministro responde", disse Franco.
Os cálculos do economista Marcos Mendes, consultor Legislativo do Senado, concluiu que o risco é real. Mendes fez várias simulações de impacto sobre a dívida.
Os resultados foram a divulgados na terça-feira pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa, um artigo intitulado "Depósito remunerado no Banco Central: avanço institucional ou contabilidade criativa?"
A conclusão: "Adotar os depósitos remunerados sem mudar o sistema de transferência de lucros do Banco Central ao Tesouro Nacional consistirá em mais uma medida de contabilidade criativa: os indicadores de dívida pública passarão a mostrar uma dívida menor que a dívida real", diz o texto de Mendes.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
São Paulo - Boa parte dos economistas recebeu com desconfiança a criação de um novo instrumento de política monetária para o Banco Central (BC).
Ao anunciar a opção, dentro do pacote fiscal, na última segunda-feira, 21, o ministro da Fazenda , Nelson Barbosa, disse que o instrumento pode ajudar a reduzir a dívida pública, que está numa trajetória de alta.
Para especialistas da área, porém, dependendo da forma como for implantado, pode, na verdade, lançar uma nova modalidade de "contabilidade criativa" e "maquiar" a dívida pública.
Ao anunciar a medida, o ministro Barbosa destacou que, se aprovada, ela não deve substituir as operações compromissadas. Seria mais uma opção para o BC. Mas a mudança tem, grosso modo, sutilezas que incomodam os especialistas.
Hoje, para calibrar a quantidade de dinheiro no mercado, o Banco Central oferece títulos públicos, que são comprados principalmente por bancos, com o compromisso de recompra dos papéis, em prazos e mediante uma taxa de remuneração previamente acertados.
Por causa desse "compromisso", essas operações são chamadas de "compromissadas".
A proposta do governo, é reduzir esse tipo intervenção por outra, que dispensaria o uso do títulos públicos.
O BC passaria a receber depósitos do bancos, com o compromisso de devolver o dinheiro em prazos e mediante uma taxa de remuneração previamente acertados - por isso eles têm o nome de depósitos remunerados.
"Na prática, seria a mesma operação, com a diferença de que não haveria o título público", explica o economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal e ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda.
"Não vai ter problema se o governo, antes, mudar a relação que existe hoje entre o Banco Central e o Tesouro e também adotar o cálculo de dívida do Fundo Monetário Internacional, caso o contrário, a mudança pode maquiar a dívida pública", diz Appy
Críticas
O ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central (BC), Alexandre Schwartsman, classificou a proposta como "mais uma pedalada".
Schwartsman lembra que, na carteira de títulos do BC hoje já há algo em torno de R$ 1,3 trilhão ou seja, por fora, a dívida, pelo lado do BC, chegaria a R$ 1,03 trilhão.
"Se for trocada compromissada por depósito, vai ser escondida uma dívida de mais de R$ 1 trilhão. Nada mais é do que mais uma pedalada do governo", disse.
O economista Gustavo Franco, ex-presidente Banco Central e sócio da Rio Bravo Investimentos, tem o mesmo receio. Para Franco, em princípio, "não é uma má ideia" a mudança.
Porém, chamou a atenção para o fato de a operação ter o mesmo efeito das compromissadas na gestão de liquidez (oferta de dinheiro no mercado), mas não entra na estatística da dívida.
"Aí me desculpe, estamos fazendo uma pedalada, uma criatividade contábil. Se o BC está criando um passivo deste tipo, isso deveria constar da estatística de dívida. Quando você estiver com a autoridade, pergunte a ela: o senhor faria o depósito voluntário se ele contasse para a dívida pública? Aí vamos ver o que o ministro responde", disse Franco.
Os cálculos do economista Marcos Mendes, consultor Legislativo do Senado, concluiu que o risco é real. Mendes fez várias simulações de impacto sobre a dívida.
Os resultados foram a divulgados na terça-feira pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa, um artigo intitulado "Depósito remunerado no Banco Central: avanço institucional ou contabilidade criativa?"
A conclusão: "Adotar os depósitos remunerados sem mudar o sistema de transferência de lucros do Banco Central ao Tesouro Nacional consistirá em mais uma medida de contabilidade criativa: os indicadores de dívida pública passarão a mostrar uma dívida menor que a dívida real", diz o texto de Mendes.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.