Banco Central divulga carta justificando inflação acima da meta em 2022
Como de praxe quando a inflação fica acima da meta, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, divulgou carta aberta com justificativas; veja os destaques
Carolina Riveira
Publicado em 10 de janeiro de 2023 às 18h58.
Última atualização em 10 de janeiro de 2023 às 19h54.
O presidente do Banco Central , Roberto Campos Neto, divulgou carta aberta nesta terça-feira, 10, com a justificativa para a inflação brasileira ter ficado acima da meta.
A inflação brasileira em 2022 medida pelo IPCA, principal índice inflacionário, fechou em 5,79% no ano, segundo divulgado mais cedo pelo IBGE.
O centro da meta de inflação era de 3,5%, com banda de 1,5 ponto (isto é, a meta seria cumprida se a inflação fosse, no máximo, até 5%). Assim, o desvio em relação ao centro da meta foi de 2,29 pontos percentuais.
O envio da carta do BC é de praxe quando a inflação fica acima do teto da meta. O Brasil usa desde 1999 o chamado regime de "metas de inflação", que ajuda a ancorar as expectativas no controle inflacionário.
Neste ano, a carta assinada por Campos Neto foi endereçada ao novo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e ao Conselho Monetário Nacional. Leia aqui a íntegra.
É o segundo ano seguido que a inflação no Brasil fica acima da meta. Em 2021, o IPCA fechou em 10,06%,a maior inflação desde 2015 e uma das piores desde a implementação do Plano Real.
Apesar de novamente acima da meta, a inflação em 2022 fechou o ano abaixo do período anterior. As pressões foram amenizadas sobretudo a partir do segundo semestre, com uma combinação entre temores de recessão que baixaram o preço do petróleo no exterior, alta de juros promovida pelo Banco Central ( leia abaixo ) e desonerações federais e estaduais sobre o preço dos combustíveis.
O cenário de chuvas mais favorável também ajudou a reduzir os preços da energia elétrica. Enquanto isso, após altas significativas, o preço de alimentos importantes, como o leite, ficou menos pressionado nos últimos meses com o fim do período de entressafra, embora os alimentos tenham contribuído com o maior impacto na inflação no ano, segundo o IBGE.
Motivos para alta da inflação
No texto, Campos Neto citou cinco fatores que pressionaram a inflação para cima:
- Inércia da inflação do ano anterior;
- elevação dos preços de commodities, em especial do petróleo;
- desequilíbrios entre demanda e oferta de insumos e gargalos nas cadeias produtivas globais;
- choques em preços de alimentação, resultantes de questões climáticas;
- retomada na demanda de serviços e no emprego, impulsionada pelo acentuado declínio da quantidade de casos de covid-19 e consequente aumento da mobilidade.
Na outra ponta, afirmou que "vários fatores agiram no sentido contrário, reduzindo o desvio da inflação em relação à meta":
- redução na tributação sobre combustíveis, energia elétrica e telecomunicações;
- comportamento da bandeira de energia elétrica, que passou de escassez hídrica para bandeira verde;
- apreciação cambial;
- hiato do produto no campo negativo (isto é, com o crescimento baixo do PIB brasileiro ).
Campos Neto afirmou que a inércia inflacionária (reajustes que fazem a inflação do ano anterior ser levada ao ano seguinte) respondeu por 2,74 pontos percentuais no desvio em relação à meta. As expectativas responderam por 1,02 p.p., a inflação importada, por 0,11 p.p., e os demais fatores por 2,22 p.p.
Já nas pressões para baixo, as desonerações tributárias ajudaram o IPCA a cair 2,33 p.p., a mudança na bandeira elétrica respondeu por 1,02 p.p. e o hiato, por 0,45 p.p.
Estímulo contracionista "extraordinário"
No texto, Campos Neto falou ainda sobre a alta de juros que vem sendo promovida pelo BC nos esforços de combate à inflação.
"A política monetária, que, em 2021, já havia passado do estímulo extraordinariamente elevado para o território contracionista, avançou substancialmente no terreno contracionista em 2022", escreveu o presidente do BC.
A taxa Selic está atualmente em 13,75% ao ano, em uma série de altas nos últimos dois anos. A Selic havia iniciado 2021 em baixa histórica, de 2%.
Para 2023, a mediana do último boletim Focus nesta semana, que traz o consenso de projeções do mercado financeiro, aponta Selic em 12,25% no fim deste ano e IPCA em 5,36%.
Se o valor se confirmar, o IPCA ficaria novamente acima da meta para 2023, que é de 3,25%, com banda de 1,5 ponto percentual. Apesar da previsão de que os juros começarão a cair já nos próximos meses, a depender da movimentação inflacionária, risco fiscal interno no novo governo e cenário internacional, o Comitê de Política Monetária do Banco Central pode reconfigurar o plano para a Selic em 2023.
O respiro na inflação de 2022 carregou para 2023 alguns alertas. Uma das críticas à tentativa de queda da inflação via desonerações, quando as medidas foram anunciadas no ano passado, foi o alto custo fiscal e o risco de somente adiar parte dos problemas para o futuro. Quando os impostos forem restaurados ( a desoneração federal foi prorrogada por três meses pelo governo Lula, mas a tendência é que seja encerrada total ou parcialmente), possa haver uma pressão inflacionária que era de 2022 mas foi trazida para este ano.
Riscos fiscais internos que pressionem o dólar, além do cenário internacional, incluindo o preço do petróleo no exterior, também seguirão sendo preocupações que podem afetar os preços no Brasil.