Economia

A Moema do ABC

O Bairro Jardim, em Santo André, surge como pólo de serviços e de empreendimentos residenciais de alto padrão

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 10h29.

A região do ABC paulista não é mais a mesma. Sua face mais visível continua sendo a de capital do automóvel e do sindicalismo, mas, à sombra da fachada industrial, consolida-se um vigoroso setor de serviços, alimentado pelo quarto mercado do país em potencial de consumo -- 6,4 bilhões de dólares por ano, segundo a Target, empresa de pesquisas. É nesse cenário que o Bairro Jardim, em Santo André, se destaca como um promissor pólo de comércio, serviços e residências para a classe média. Muitos empresários apontam semelhanças entre a expansão do Bairro Jardim e a que ocorreu no distrito paulistano de Moema, há 20 anos: rápido adensamento residencial de alto padrão acompanhado da explosão de novos negócios em área favorecida pela topografia e por ruas com traçado cartesiano. "O Bairro Jardim vai ser uma nova Moema daqui a três ou quatro anos", diz André Cywinski, diretor técnico de expansão do Sé Supermercados.

Num estudo comparativo dos gastos médios em supermercados de São Paulo e Santo André realizado em 1998, o Sé verificou que o Bairro Jardim tem o potencial de consumo idêntico ao de bairros paulistanos nobres como Moema, Itaim e Jardins. A rede decidiu então investir 7 milhões de reais para abrir ali uma loja, há um ano e meio. O plano de ser o primeiro supermercado da região foi frustrado: as negociações com a prefeitura e a Câmara de Vereadores para mudanças necessárias na lei de zoneamento foram tão demoradas que o Extra inaugurou sua loja antes. A concorrência afetou o faturamento -- está 25% abaixo do previsto --, mas o Sé confia no potencial da região. "Mesmo com o Extra, o Bairro Jardim continua promissor para nós", diz Cywinski.

Além das vantagens logísticas -- fica próximo do centro de Santo André e na convergência de corredores viários que o ligam diretamente a São Bernardo e São Caetano --, o Bairro Jardim oferece outros atrativos: população com elevado poder aquisitivo e escolaridade e também disponibilidade de áreas para construção de prédios e expansão comercial (o índice de verticalização é de apenas 28,5%). Antigo reduto de casas de altos executivos das multinacionais instaladas no ABC, o bairro de 1 milhão de metros quadrados é, desde meados dos anos 90, o endereço dos apartamentos classe A. A Brazil Realty, do grupo Cyrela, está investindo 37,2 milhões de reais em três torres de apartamento de alto padrão e dois hotéis de três e quatro estrelas, em parceria com a Accor. As torres residenciais e os hotéis Íbis e Mercure começam a ser construídos em frente ao Shopping ABC Plaza, em terreno de 18 000 metros quadrados ao lado do Parque Celso Daniel, a área verde mais valorizada da cidade. A inauguração está prevista para dezembro de 2003. Os hotéis devem preencher uma lacuna no mix de serviços essenciais do bairro. "A proximidade entre o shopping e os hotéis vai criar uma boa simbiose", afirma Eduardo Coelho, diretor comercial da Brazil Realty.

A empresa descobriu o bairro há cinco anos, quando inaugurou o ABC Plaza, um empreendimento de 70 milhões de dólares. Com 306 lojas, o shopping recebe 720 000 visitantes por mês. Desde 1999, o crescimento médio das vendas tem sido superior a 30% ao ano. "Atingimos não somente o ABC mas também parte da região leste de São Paulo, Vila Prudente, Ipiranga e Sacom", diz Walter Tassetto, superintendente do ABC Plaza.

A avenida Industrial, que concentra os empreendimentos da Brazil Realty numa ponta e o campus da Universidade do Grande ABC (UniABC) na outra, pode se constituir em importante eixo de expansão. De acordo com a prefeitura, as áreas disponíveis para grandes empreendimentos -- em geral terrenos de indústrias desativadas -- somam 250 000 metros quadrados. Quando a Brazil Realty começou a construir o ABC Plaza, o preço do metro quadrado na avenida girava em torno de 70 reais. Desde então, o valor quadruplicou. "A avenida Industrial vai ser o marco do comércio local", afirma Carlos Coimbra, dono da rede de serviços automotivos Casa do Escapamento e da imobiliária Quinta Avenida, cuja nova sede, avaliada em 1 milhão de reais, foi inaugurada em fevereiro no Bairro Jardim.

Além dos lançamentos do Cyrela, outros 15 edifícios residenciais estão em construção, envolvendo investimentos em torno de 130 milhões de reais. A maioria das unidades tem mais de 200 metros quadrados de área útil e preço superior a 200 000 reais. A demanda crescente por terrenos para prédios fez com que o preço do metro quadrado residencial dobrasse, atingindo 600 reais -- valor que sobe para 800 reais em áreas especialmente bem localizadas. Exemplo do padrão das construções é o Maison Champs-Elysées. Com entrega prevista para junho, o edifício de 20 apartamentos (um por andar), com 325 metros quadrados de área útil, possui infra-estrutura comandada por sistemas inteligentes de última geração. "Escolhemos a região porque é a que mais valoriza nosso empreendimento", diz Clélio Grotta Junior, diretor da construtora Grotta & Salvetti.

Concentração de jalecos

A localização privilegiada transformou o Bairro Jardim em pólo de clínicas médicas, laboratórios, centros de diagnóstico e clínicas de estética. São quase 300 estabelecimentos no total. "É a maior concentração de clínicas e laboratórios do ABC", diz Jayme Tavares, diretor da seção regional da Associação Paulista de Medicina. Entre eles, o Centro Diagnóstico Fleury, que se mudou recentemente para novas instalações no bairro e está investindo 6 milhões de reais para expandir a oferta de exames. O faturamento do laboratório no ABC cresceu 15% no último ano. "Nossa unidade no Bairro Jardim atende um número maior de clientes que as de Alphaville, Campinas, Sorocaba e Jundia", afirma Ewaldo Russo, diretor-superintendente do Fleury.

O bairro vem atraindo também várias escolas de idiomas. Quando decidiu deixar o centro de Santo André em 1997, dadas as dificuldades de acesso e de estacionamento para os alunos, a Cultura Inglesa encomendou um estudo para definir um novo local. "O Bairro Jardim estava começando a crescer como um centro diferenciado", diz Christina Thornton, gerente de marketing da Cultura Inglesa. Desde a mudança, o número de matrículas aumentou em cerca de 25%. Os alunos vindos de São Bernardo representam 40% do total.

Centro de lazer

O mais novo filão de negócios do bairro é o de entretenimento e lazer. Os dois bares de primeira linha que acabam de ser abertos -- o Fonte Leone e o Paineiras, com investimento superior a meio milhão de reais cada um -- reforçam uma tendência iniciada por restaurantes que transformaram o bairro em referência gastronômica do ABC. Desde o fim do ano passado, sete novas casas foram abertas, com investimentos estimados em 2,5 milhões de reais, e outras estão a caminho. A proximidade de São Paulo faz com que a região exerça forte atração entre os moradores de Ipiranga, Vila Prudente, Sapopemba e Parque São Rafael. "É mais fácil o pessoal desses bairros vir ao ABC do que ir ao centro de São Paulo", diz Wilson Bianchi, presidente do Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do ABC (Sehal).

Instalada há cerca de um ano próximo aos restaurantes, a Chocolates Kopenhagen viu seu movimento decolar depois de se fixar no bairro. Desanimados com as baixas vendas na loja que tinham no centro da cidade, os franqueados Marília e Rubens Dias estavam a ponto de desistir do negócio. Por orientação da própria Kopenhagen, resolveram buscar um ponto melhor. A nova vizinhança representou um divisor de águas. O faturamento cresceu 60%, o que estimulou os franqueados a sofisticar o projeto arquitetônico e a introduzir um padrão de atendimento personalizado. O sucesso das mudanças transformou a loja num modelo para a rede Kopenhagen. "Nosso cliente é AAA", diz Marília.

Novos negócios não param de surgir na região. Na esteira da rede francesa 5 à Sec, as lavanderias Quality Cleaners e Tutti Belli abriram recentemente franquias no Bairro Jardim. A locadora Blockbuster chegou ao bairro há seis meses e trouxe consigo a rede de drogarias Farmax. A efervescência comercial produziu uma mobilização institucional. No fim de abril foi fundada a Associação do Bairro Jardim (Abaja), por intermédio da qual os empresários querem aprimorar a infra-estrutura do local. "A prioridade é melhorar a segurança e o trânsito", diz Marco de Bellis, presidente da Abaja.

O que o futuro reserva para o bairro? Os prognósticos variam -- alguns muito otimistas, outros nem tanto. "A região vai ser invadida pelas lojas de grife", acredita Wilson Ambrósio, presidente da Associação Comercial e Industrial de Santo André (Acisa). "Muito em breve, o Bairro Jardim será um grande centro gastronômico da Grande São Paulo", afirma Bianchi, do Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do ABC. "É preciso ver se haverá gente para tudo isso. Falar que o bairro vai ser um pólo de entretenimento hoje é mera especulação", diz Carlos Miranda, sócio do bar Fonte Leone.

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