Economia

A automatização não assusta os trabalhadores suecos

O potencial da automação de gerar uma onda de desemprego não tem muita força na Suécia ou em seus vizinhos escandinavos

Famoso e generoso sistema de bem-estar social da Suécia faz dela uma nação que não se preocupa nem com a automação, nem com qualquer outra coisa (Linus Sundahl-Djerf/The New York Times)

Famoso e generoso sistema de bem-estar social da Suécia faz dela uma nação que não se preocupa nem com a automação, nem com qualquer outra coisa (Linus Sundahl-Djerf/The New York Times)

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Da Redação

Publicado em 11 de janeiro de 2018 às 13h07.

Última atualização em 11 de janeiro de 2018 às 18h55.

Garpenberg, Suécia – De dentro da sala de controle, no interior de uma rocha a mais de dois quilômetros abaixo do nível do solo, Mika Persson pode ver os robôs em marcha, supostamente chegando para o trabalho na mina Nova Boliden.

O fato não o perturba.

O famoso e generoso sistema de bem-estar social da Suécia faz dela uma nação que não se preocupa nem com a automação, nem com qualquer outra coisa.

Persson, 35 anos, está sentado de frente para quatro telas de computador, uma exibindo a máquina que ele controla, que carrega a rocha recém-explodida, contendo prata, zinco e chumbo. Se estivesse no fundo da mina controlando-a manualmente, estaria inalando poeira e gases, mas, na verdade, está sentado em uma cadeira e usa um joystick para controlá-la.

Ele está ciente de que os robôs estão evoluindo a cada dia. A Boliden está testando veículos autônomos para substituir os motoristas de caminhão, mas Persson acredita que as pessoas sempre serão necessárias para manter as máquinas funcionando. Ele bota fé no modelo econômico sueco e suas proteções contra o tormento do desemprego.

“Eu realmente não estou preocupado. Existem tantos empregos nesta mina que, mesmo que esta função desapareça, outra surgirá. A empresa cuidará de nós.”

Em grande parte do mundo, pessoas cuja subsistência depende de salários estão cada vez mais preocupadas com o potencial da automação de gerar uma onda de desemprego. Segundo essa história assustadora, a globalização forçou trabalhadores de regiões ricas como a América do Norte e a Europa a competir diretamente com a mão de obra mais barata na Ásia e na América Latina, o que gerou as demissões. Agora, os robôs estão chegando para acabar com o que resta.

Mas essa ideia não tem muita força na Suécia ou em seus vizinhos escandinavos, onde os sindicatos são poderosos, o apoio do governo é abundante e a confiança entre empregadores e empregados é profunda. Aqui, os robôs são apenas outra maneira de aumentar a eficiência das empresas. Quando os empregadores prosperam, os trabalhadores consistentemente ganham uma fatia proporcional dos lucros, em forte contraste com os Estados Unidos e o Reino Unido, onde os salários estagnaram mesmo enquanto os lucros das empresas subiram.

“Na Suécia, se você perguntar a um líder sindical se ele tem medo das novas tecnologias, ele vai responder que não. Se os postos de trabalho desaparecerem, treinamos as pessoas para novos postos. Não protegemos empregos, mas sim os trabalhadores”, diz a ministra sueca de Emprego e Integração, Ylva Johansson.

Um apoio para a inovação

Os americanos tendem a rejeitar os países nórdicos, vendo-os como reinos socialistas e estados paternalistas, em contraste com os ousados capitalistas que reinam em lugares como o Vale do Silício, mas, na Suécia, há a possibilidade de que, em uma época de automação, a inovação possa ser agilizada ao mesmo tempo em que são mantidas redes de segurança contra falhas.

“Essa segurança é boa para o espírito empresarial. Se um projeto não tiver êxito, você não necessariamente acaba quebrando”, diz Carl Melin, diretor de política da Futurion, instituição de pesquisa em Estocolmo.

Oitenta por cento dos suecos expressam opiniões positivas sobre robôs e inteligência artificial, segundo uma pesquisa realizada em 2017 pela Comissão Europeia. Por outro lado, uma outra, do Centro de Pesquisa Pew, mostrou que 72 por cento dos americanos estavam “preocupados” com um futuro em que robôs e computadores possam substituir seres humanos.

Nos Estados Unidos, onde a maioria das pessoas depende de seus empregadores para ter o seguro saúde, perder o emprego pode desencadear uma descida às profundezas catastróficas. Isso deixa os trabalhadores relutantes em deixar o cargo para perseguir carreiras mais lucrativas. Essa situação faz os sindicatos protegerem postos de trabalho acima de tudo.

Já na Suécia e no resto da Escandinávia, os governos garantem saúde e educação gratuita, além de pagar salários-desemprego generosos, e as empresas financiam extenso programas de treinamento profissional. Os sindicatos geralmente abraçam a automação como uma vantagem competitiva que torna o trabalho mais seguro.

Tentar deixar os Estados Unidos mais parecidos com a Escandinávia implicaria em custos que iriam contra o fervor do corte de impostos que domina a política americana nas últimas décadas.

A Suécia, a Dinamarca e a Finlândia gastam mais de 27 por cento da sua produção econômica anual em serviços do governo para ajudar as pessoas sem emprego e outros grupos vulneráveis, de acordo com dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Os Estados Unidos dedicam menos de 20 por cento da sua economia a tais programas.

Para as empresas suecas, esses gastos rendem um dividendo importante: a receptividade de seus funcionários à ideia de adotar novas tecnologias.

“Se não nos atualizamos em termos de tecnologia e de faturamento, acabaremos ficando fora do negócio. Você não precisa ser formado em matemática para fazer os cálculos”, diz Magnus Westerlund, 35, vice-presidente da unidade local do sindicato que representa os trabalhadores de duas minas da Boliden.

Na mina abaixo das florestas geladas de pinheiros em Garpenberg, a quase 180 quilômetros a noroeste de Estocolmo, Persson e seus colegas ganham cerca de 500 mil coroas por ano (cerca de US$60 mil) e têm cinco semanas de férias anuais. Segundo as leis suecas, quando uma criança nasce, os pais têm 480 dias de licença para dividir entre os dois. “Nenhum robô vai mudar isso”, diz Persson.

“Esse é o tipo de pensamento sueco: se você fizer algo pela empresa, ela lhe dará algo em troca”, diz Erik Lundstrom, de 41 anos, com dois filhos, que trabalha ao lado de Persson.

Duras projeções de emprego

Não se sabe quantos empregos estão ameaçados por robôs e outras formas de automação, mas projeções sugerem números chocantes.

Um estudo de 2016 do Fórum Econômico Mundial pesquisou as 15 principais economias que coletivamente detêm dois terços da força de trabalho global – cerca 1,8 bilhão de trabalhadores – e concluiu que a ascensão dos robôs e da inteligência artificial vai acabar com 5,1 milhões de empregos até 2020.

Dois pesquisadores da Universidade de Oxford concluíram que quase metade de todos os postos de trabalho americanos poderiam ser substituídos por robôs e outras formas de automação nas próximas duas décadas.

Quando os caixas automáticos chegaram às agências bancárias na década de 1960, alguns previram que logo não haveria mais seres humanos trabalhando em bancos, mas a taxa de emprego cresceu quando essas instituições investiram suas economias em novas áreas, como a de hipotecas, de empréstimos e de seguros. Tendências similares podem se repetir.

Mesmo que os robôs criem mais empregos do que os eliminem, um grande número de pessoas vai precisar de novas carreiras.

A Suécia e suas irmãs nórdicas parecem bem-sucedidas no gerenciamento de tais transições. Conselhos de segurança profissional financiados pelos empregadores ajudaram aqueles que perdem seus empregos a arrumar novos.

Manter a rede de segurança social da Suécia também exige que o público continue a pagar taxas de imposto próximas dos 60 por cento; porém, agora que absorveu um grande número de imigrantes vindo de nações em conflito, esse apoio pode diminuir. Muitos dos recém-chegados não têm formação e podem ter dificuldade para arrumar um emprego. Se muita gente acabar dependendo da generosidade do governo, pode haver uma reação.

“Há o risco de que o contrato social seja rompido”, disse Marta Blix, economista do Instituto de Pesquisa de Economia Industrial, em Estocolmo.

Por enquanto, ele resiste, e há uma sensação de calma na mina Boliden.

A mina Garpenberg opera desde 1257. Mais de uma década atrás, a Boliden se aliou à Ericsson, empresa de telecomunicações sueca, para a instalação da internet sem fio. Isso permitiu que os mineiros falassem uns com os outros para corrigir os problemas que iam aparecendo. Eles agora utilizam tablets que os ajudam a controlar a produção ao longo dos 97 quilômetros de vias em funcionamento na mina.

Fredrik Hases, 41 anos, que dirige a unidade local do sindicato que representa os técnicos, disse: “Para nós, a automação é uma coisa boa. Ninguém acha que ela vai acabar com seu emprego, mas sim que ajuda a fazer mais com o pessoal que temos”.

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