Imunidade contra a covid-19 continua baixa no Brasil, indica estudo
Pesquisa nacional em 120 cidades brasileiras mostra que um percentual muito baixo da população desenvolveu anticorpos contra a doença
Filipe Serrano
Publicado em 12 de junho de 2020 às 06h05.
Última atualização em 12 de junho de 2020 às 10h51.
Apesar do rápido avanço da covid-19 no Brasil e do alto número de casos e de mortes, a maioria da população ainda não desenvolveu imunidade ao novo coronavírus. É o que indica uma pesquisa feita em 120 cidades brasileiras que testou a presença de anticorpos na população desses locais.
De acordo com os pesquisadores, somente 2,8% das 31.165 pessoas testadas nos 120 municípios brasileiros apresentaram anticorpos contra a covid-19. A margem de erro é de 0,2 ponto percentual para baixo ou para cima.
Como essas 120 cidades têm uma população somada de 68,6 milhões de pessoas, o resultado indica que entre 1,7 milhão e 2,1 milhões de pessoas podem já ter sido infectadas pelo novo coronavírus, seis vezes mais do que o número de casos registrados nessas mesmas cidades no início da pesquisa (296.300) e mais que o dobro do total de casos oficiais notificados no país (805.000).
Os resultados são do Estudo de Prevalência de Infeção por Covid-19 no Brasil (Epicovid19-BR) coordenado pelo Centro de Pesquisas Epidemiológicas da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e financiado pelo Ministério da Saúde.
Embora a presença de anticorpos ainda seja baixa, algumas cidades mostraram ter uma soroprevalência maior do que a média, o que indica que a presença da doença varia de acordo com o município e a região. Em cidades como Boa Vista (RR), 25,4% das pessoas testadas apresentaram imunidade contra o coronavírus. Já em Salvador (BA), o resultado ficou em 5,4%. Entre 200 e 250 pessoas foram testadas aleatoriamente em cada um dos municípios entre os dias 4 e 7 de junho para produzir os resultados.
Os dados são importantes porque indicam a capacidade de o vírus continuar circulando e infectando pessoas nessas regiões. Como mostra uma reportagem publicada na última edição impressa da EXAME, cientistas acreditam que uma vez que 60% a 70% estiver imunizada, é possível que a doença deixe de circular por não conseguir mais encontrar pessoas suscetíveis.
"O Brasil é o único país que parece querer desafiar o vírus. Exatamente quando estamos lá perto do topo da montanha, ou pico da curva, o país está reabrindo, colocando em risco milhares de vidas", diz o epidemiologista Pedro Hallal, coordenador do estudo e reitor da UFPel. "O momento agora seria de fazer exatamente o contrário. Fechar tudo, por uns 15 dias, exatamente para garantir que a curva entre na descendente, como entrou em outros países".
É a segunda vez que os pesquisadores realizam o teste na população desses municípios. Na primeira fase da pesquisa, realizada entre 14 e 21 de maio, somente 1,4% das pessoas testadas apresentaram anticorpos contra o coronavírus. Nessa primeira etapa, 90 cidades foram contabilizadas, porque não foi possível testar um número suficiente de pessoas nos demais municípios.
Analisando os dados de 83 cidades que participaram das duas fases, os pesquisadores observaram que a taxa de imunização subiu de 1,7% para 2,6%, um aumento de 57% num intervalo de apenas duas semanas. É um aumento inédito encontrado em pesquisas desse tipo feitas ao redor do mundo, de acordo com os pesquisadores.
Em algumas cidades, o aumento entre as duas etapas do estudo foi ainda mais acentuado. No Rio de Janeiro (RJ), o número saltou de 2,2% para 7,5%. E em Maceió (AL), passou de 1,3% para 12,2%. Mas cidades como São Paulo tiveram um decréscimo, de 3,1% para 2,3%.
Outro ponto que chamou a atenção dos pesquisadores é a alta incidência da doença na população dos estados do Norte do país. Das 15 cidades com a maior prevalência de anticorpos, 12 estão localizadas na região. As outras 3 estão no Nordeste. O resultado reforça a conclusão de que a epidemia se espalhou de forma mais acentuada e grave justamente nessas duas regiões.