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“Tragédia do Sarriá” da Copa de 82 completa 30 anos

Marcelo Mora, autor do livro "Telê e a Seleção de 82 – da arte à tragédia", comentou sobre umas das mais doloridas derrotas do Brasil em Copa do Mundo

Paolo Rossi, carrasco do Brasil na Copa de 82: jogador italiano marcou três gols que eliminaram o Brasil (Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 10 de julho de 2012 às 11h00.

São Paulo - Um empate bastava. Mas buscar o gol, a vitória, era natural. Fazia parte de como o jogo brasileiro fluía naquele distante ano de 1982. Falta de pragmatismo que custaria discussões nas mesas de bar, acusações ao técnico Telê Santana (o apelido de “pé frio” só cairia por terra dez anos depois, já no comando do São Paulo campeão da Libertadores e do mundo) e feridas abertas 30 anos depois da partida que ficou conhecida como a “Tragédia do Sarriá”. Como sabemos, não se dá tal nome a qualquer jogo, para uma derrota trivial. A eliminação frente a desacreditada Itália era, sim, o fim de um sonho.

Os três gols marcados no dia 5 de julho de 1982 fizeram de Paolo Rossi o carrasco mais terrível da Seleção Brasileira em uma Copa do Mundo . Para muitos, aquela tarde em Barcelona balançou também as convicções e a forma de o futebol ser praticado no Brasil daí por diante.

Marcelo Mora, autor do livro “Telê e a Seleção de 82 – da arte à tragédia”, que será lançado na próxima terça-feira, no Bar São Cristovão, em São Paulo, não coloca tanto peso na derrota do time que tinha Zico, Júnior, Sócrates, Cerezo, Falcão, Oscar e Leandro. Mas acredita que se o título viesse, o processo de abertura política do país, que se distanciava da fase mais dura da ditadura militar, poderia vir com maior facilidade. A conversa completa você confere abaixo.

- O que faz aquela Seleção de 1982 tão marcante?

É uma combinação de fatores, não foi de uma hora pra outra. O país saía da ditadura muito morosamente. E nesse processo veio o desmembramento da CBD (Confederação Brasileira de Desportos), que acabou na criação da CBF (Confederação Brasileira de Futebol). O presidente Giulite Coutinho decidiu chamar um técnico muito popular.


Naquela época, bem antes da Copa, o Telê já era muito admirado, tinha respeito de boa parte dos jornalistas. E ele recebeu carta branca total. Com essa liberdade, o Telê colocou os melhores para jogar e acabou naquele time. Ele tinha Cerezo, Falcão, Zico, Sócrates, Eder, Júnior… As exibições do time se juntaram ao ânimo do país. Criou-se um clima de festa. Cada jogo era uma celebração.

Em 1981, o Brasil fez uma excursão na Europa e passou por cima de todo mundo. Enfrentou a Inglaterra em Wembley e conquistou a primeira vitória da história lá. Ganhou da França, no Parque dos Príncipes… Teve ainda o Mundialito com vitória fácil contra a Alemanha, a seleção mais forte na época, por 4 x 1.

Curiosamente, só não jogou contra a Itália neste período de preparação para a Copa. Não houve nem jogo amistoso nem oficial. Mas eles tinham uma seleção muito desacreditada por conta do escândalo da loteria que havia estourado um ano antes.

Trinta anos depois daquela fatídica derrota, muitos conseguem ver que o Brasil perdeu para um bom time italiano. Você compartilha dessa ideia ou acha que é uma forma de aceitar melhor aquela derrota?

Os italianos fizeram uma primeira fase muito ruim, empatando os três jogos. Estavam brigados com a imprensa, não davam entrevista, eram criticados pelos políticos… Mas, de fato, eles tinham muitos bons jogadores. O que aconteceu é que a Itália achou o jogo dela contra a Argentina.

Mas não dá para dizer que tinham mais time que o Brasil. Acima disso tudo, baixou uma luz no Paolo Rossi, que teve três bolas e fez três gols. A bola o procurou, não tinha jeito. E eles jogaram muito bem contra nós. Acharam contra-ataques e algum espaço para jogar.


Qual é o peso da eliminação daquele time para o futebol brasileiro? Consegue ver alguma ligação entre a derrota do futebol mais plástico e o pragmatismo visto nos nosso times atuais?

Teve um peso parcial. Não diria que se mudou uma mentalidade a partir daquilo. A verdade é que nunca mais reunimos uma geração de craques como aqueles. Mas se tivesse acontecido uma alteração tão grande de mentalidade o Telê não teria voltado em 1986. Na Copa de 1990 (com o comando de Sebastião Lazaroni), mudamos nossas raízes e não deu em nada.

Quatro anos depois tivemos uma competição sem um grande destaque. O melhor time era a Argentina, mas acabou que o Maradona foi pego no exame antidoping… O Brasil jogava para o gasto, mas chegou lá e foi campeão do mundo. Mas a derrota no Sarriá não foi responsável por um rompimento.

O que aquela Seleção fez foi iniciar o grande êxodo de jogadores para a Europa. Já estavam lá o Falcão e o Dirceu. Mas os europeus ficaram encantados com o jogo brasileiro. O Cerezo já estava de malas prontas logo depois da Copa. Depois foi a vez do Zico. O Sócrates só saiu dois anos depois, em 1984.

Foi o último grande respiro do futebol que o Brasil sempre praticou. Em 1986, tem alguma coisa, o Telê ainda tenta manter uma filosofia de jogo, mas já se resguarda mais e monta o time com dois volantes mais marcadores (Alemão e Elzo). Mas podemos dizer que última Copa que teve as raízes do futebol brasileiro foi a de 1982.

Dá para afirmar que o Telê montou a última grande seleção do futebol mundial? Ou essa Espanha atual pode ser colocada no mesmo nível?

Tão cedo não vai se reunir tantos craques. Difícil juntar aquele nível de “pé de obra”, digamos assim. A seleção da Espanha é um grande time, tem craques, tem estilo de jogo, filosofia, mas não dá para comparar.


Ela joga muito mais próxima da Argentina, se baseia no “toco y me voy”. Jogam mais compactados, não arriscam o drible. Digamos que o brasileiro enfeita mais a jogada. A qualidade individual dos jogadores é a grande diferença.

Paralelamente ao seu livro, há o lançamento de “Sarriá 82 – O que faltou ao futebol arte?” que elenca erros táticos de Telê Santana. Questionam também a não convocação de Reinaldo, as rusgas de Telê com Tita. Acha que a história poderia ser diferente com algum desses jogadores lá?

Poderia, claro. Mas 30 anos depois esse tipo de questionamento perde um pouco o sentido. Essas questões todas são baseadas em critérios do treinador. O Telê tinha uma filosofia de jogo clara e ele escalou o melhor dentro daquilo. É preciso lembrar que o Reinaldo se machucava constantemente e talvez o Telê não tivesse confiança na recuperação total dele.

O centroavante titular da Seleção era o Careca, que se machucou pouco antes da Copa. Além disso, o Serginho foi muito bem em todos os jogos em que foi testado. Naquele jogo do Mundialito contra a Alemanha, ele demoliu os caras. Apesar de o sistema da Seleção não favorecê-lo nem um pouco.

Não dá para avaliar o resultado de um trabalho inteiro por um jogo. As perguntas que tentei responder no meu livro foram outras: De qual forma aquela seleção caiu nas graças da torcida? O que foi feito para isso acontecer? De que forma? Evitei esse tipo de discussão.

A derrota machucou tanto que ela é mais lembrada que um possível título brasileiro?

É difícil falar porque a gente precisa especular sobre o que aconteceria. Creio que se tivesse ganho o titulo esse país teria vivido um clima de festa durante uma semana. Politicamente e socialmente algumas conquistas poderiam ser mais aceleradas.

Com a derrota, os ânimos ficaram mais contidos. Se tivesse ganho não teria toda essa discussão de que o time corria muito risco por conta da forma que atuava. De toda forma, a derrota da forma como ela ocorreu marcou profundamente.

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São Paulo - Um empate bastava. Mas buscar o gol, a vitória, era natural. Fazia parte de como o jogo brasileiro fluía naquele distante ano de 1982. Falta de pragmatismo que custaria discussões nas mesas de bar, acusações ao técnico Telê Santana (o apelido de “pé frio” só cairia por terra dez anos depois, já no comando do São Paulo campeão da Libertadores e do mundo) e feridas abertas 30 anos depois da partida que ficou conhecida como a “Tragédia do Sarriá”. Como sabemos, não se dá tal nome a qualquer jogo, para uma derrota trivial. A eliminação frente a desacreditada Itália era, sim, o fim de um sonho.

Os três gols marcados no dia 5 de julho de 1982 fizeram de Paolo Rossi o carrasco mais terrível da Seleção Brasileira em uma Copa do Mundo . Para muitos, aquela tarde em Barcelona balançou também as convicções e a forma de o futebol ser praticado no Brasil daí por diante.

Marcelo Mora, autor do livro “Telê e a Seleção de 82 – da arte à tragédia”, que será lançado na próxima terça-feira, no Bar São Cristovão, em São Paulo, não coloca tanto peso na derrota do time que tinha Zico, Júnior, Sócrates, Cerezo, Falcão, Oscar e Leandro. Mas acredita que se o título viesse, o processo de abertura política do país, que se distanciava da fase mais dura da ditadura militar, poderia vir com maior facilidade. A conversa completa você confere abaixo.

- O que faz aquela Seleção de 1982 tão marcante?

É uma combinação de fatores, não foi de uma hora pra outra. O país saía da ditadura muito morosamente. E nesse processo veio o desmembramento da CBD (Confederação Brasileira de Desportos), que acabou na criação da CBF (Confederação Brasileira de Futebol). O presidente Giulite Coutinho decidiu chamar um técnico muito popular.


Naquela época, bem antes da Copa, o Telê já era muito admirado, tinha respeito de boa parte dos jornalistas. E ele recebeu carta branca total. Com essa liberdade, o Telê colocou os melhores para jogar e acabou naquele time. Ele tinha Cerezo, Falcão, Zico, Sócrates, Eder, Júnior… As exibições do time se juntaram ao ânimo do país. Criou-se um clima de festa. Cada jogo era uma celebração.

Em 1981, o Brasil fez uma excursão na Europa e passou por cima de todo mundo. Enfrentou a Inglaterra em Wembley e conquistou a primeira vitória da história lá. Ganhou da França, no Parque dos Príncipes… Teve ainda o Mundialito com vitória fácil contra a Alemanha, a seleção mais forte na época, por 4 x 1.

Curiosamente, só não jogou contra a Itália neste período de preparação para a Copa. Não houve nem jogo amistoso nem oficial. Mas eles tinham uma seleção muito desacreditada por conta do escândalo da loteria que havia estourado um ano antes.

Trinta anos depois daquela fatídica derrota, muitos conseguem ver que o Brasil perdeu para um bom time italiano. Você compartilha dessa ideia ou acha que é uma forma de aceitar melhor aquela derrota?

Os italianos fizeram uma primeira fase muito ruim, empatando os três jogos. Estavam brigados com a imprensa, não davam entrevista, eram criticados pelos políticos… Mas, de fato, eles tinham muitos bons jogadores. O que aconteceu é que a Itália achou o jogo dela contra a Argentina.

Mas não dá para dizer que tinham mais time que o Brasil. Acima disso tudo, baixou uma luz no Paolo Rossi, que teve três bolas e fez três gols. A bola o procurou, não tinha jeito. E eles jogaram muito bem contra nós. Acharam contra-ataques e algum espaço para jogar.


Qual é o peso da eliminação daquele time para o futebol brasileiro? Consegue ver alguma ligação entre a derrota do futebol mais plástico e o pragmatismo visto nos nosso times atuais?

Teve um peso parcial. Não diria que se mudou uma mentalidade a partir daquilo. A verdade é que nunca mais reunimos uma geração de craques como aqueles. Mas se tivesse acontecido uma alteração tão grande de mentalidade o Telê não teria voltado em 1986. Na Copa de 1990 (com o comando de Sebastião Lazaroni), mudamos nossas raízes e não deu em nada.

Quatro anos depois tivemos uma competição sem um grande destaque. O melhor time era a Argentina, mas acabou que o Maradona foi pego no exame antidoping… O Brasil jogava para o gasto, mas chegou lá e foi campeão do mundo. Mas a derrota no Sarriá não foi responsável por um rompimento.

O que aquela Seleção fez foi iniciar o grande êxodo de jogadores para a Europa. Já estavam lá o Falcão e o Dirceu. Mas os europeus ficaram encantados com o jogo brasileiro. O Cerezo já estava de malas prontas logo depois da Copa. Depois foi a vez do Zico. O Sócrates só saiu dois anos depois, em 1984.

Foi o último grande respiro do futebol que o Brasil sempre praticou. Em 1986, tem alguma coisa, o Telê ainda tenta manter uma filosofia de jogo, mas já se resguarda mais e monta o time com dois volantes mais marcadores (Alemão e Elzo). Mas podemos dizer que última Copa que teve as raízes do futebol brasileiro foi a de 1982.

Dá para afirmar que o Telê montou a última grande seleção do futebol mundial? Ou essa Espanha atual pode ser colocada no mesmo nível?

Tão cedo não vai se reunir tantos craques. Difícil juntar aquele nível de “pé de obra”, digamos assim. A seleção da Espanha é um grande time, tem craques, tem estilo de jogo, filosofia, mas não dá para comparar.


Ela joga muito mais próxima da Argentina, se baseia no “toco y me voy”. Jogam mais compactados, não arriscam o drible. Digamos que o brasileiro enfeita mais a jogada. A qualidade individual dos jogadores é a grande diferença.

Paralelamente ao seu livro, há o lançamento de “Sarriá 82 – O que faltou ao futebol arte?” que elenca erros táticos de Telê Santana. Questionam também a não convocação de Reinaldo, as rusgas de Telê com Tita. Acha que a história poderia ser diferente com algum desses jogadores lá?

Poderia, claro. Mas 30 anos depois esse tipo de questionamento perde um pouco o sentido. Essas questões todas são baseadas em critérios do treinador. O Telê tinha uma filosofia de jogo clara e ele escalou o melhor dentro daquilo. É preciso lembrar que o Reinaldo se machucava constantemente e talvez o Telê não tivesse confiança na recuperação total dele.

O centroavante titular da Seleção era o Careca, que se machucou pouco antes da Copa. Além disso, o Serginho foi muito bem em todos os jogos em que foi testado. Naquele jogo do Mundialito contra a Alemanha, ele demoliu os caras. Apesar de o sistema da Seleção não favorecê-lo nem um pouco.

Não dá para avaliar o resultado de um trabalho inteiro por um jogo. As perguntas que tentei responder no meu livro foram outras: De qual forma aquela seleção caiu nas graças da torcida? O que foi feito para isso acontecer? De que forma? Evitei esse tipo de discussão.

A derrota machucou tanto que ela é mais lembrada que um possível título brasileiro?

É difícil falar porque a gente precisa especular sobre o que aconteceria. Creio que se tivesse ganho o titulo esse país teria vivido um clima de festa durante uma semana. Politicamente e socialmente algumas conquistas poderiam ser mais aceleradas.

Com a derrota, os ânimos ficaram mais contidos. Se tivesse ganho não teria toda essa discussão de que o time corria muito risco por conta da forma que atuava. De toda forma, a derrota da forma como ela ocorreu marcou profundamente.

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