Casual

Exposição do IMS de São Paulo apresenta obras de Letizia Battaglia

A fotografa italiana de 84 anos registou as piores carnificinas praticadas por mafiosos em Palermo

A exposição no Instituto Moreira Salles em São Paulo começa no dia 27 de abril (Laura Lezza/Getty Images)

A exposição no Instituto Moreira Salles em São Paulo começa no dia 27 de abril (Laura Lezza/Getty Images)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 22 de abril de 2019 às 15h33.

Letizia Battaglia é um nome internacionalmente conhecido, associado, de forma quase automática, ao registro fotográfico das piores carnificinas praticadas por mafiosos em Palermo, sua cidade natal. Hoje, aos 84 anos, a fotógrafa revela que já sonhou várias vezes estar queimando seus negativos dos anos 1970 e 1980, período em que se manteve ativa no confronto com a violência praticada pela Máfia, agindo como testemunha dessa guerra civil entre italianos.

A partir do dia 27, algumas de suas mais chocantes imagens estarão em exposição no Instituto Moreira Salles.

A mostra, Letizia Battaglia: Palermo, vem acompanhada de um catálogo com imagens registradas principalmente nos anos 1980, justamente o período mais intenso dessa guerra entre mafiosos, que deixou rastros de sangue e um sentimento de "asco" na própria fotógrafa, atônita diante de tanta barbárie. O catálogo/livro do IMS traz textos do curador da mostra, Paolo Falcone, fundador e diretor artístico da Fundação Sambuca de Palermo, além do crítico Lorenzo Mammì, responsável pela programação do IMS em São Paulo.

Há ainda um terceiro ensaio, de Leandro Demori, sobre os crimes da Cosa Nostra fotografados por Letizia Battaglia, desde o primeiro registro, o homicídio de um agricultor ao pé de uma árvore, em 1974, até a morte do juiz Giovanni Falcone, em maio de 1992, passando pela prisão de mafiosos como Leoluca Bagarella e o atentado contra o político democrata-cristão Piersanti Mattarella - morto por pistoleiros na frente de sua mulher e filha, em 1985. Correu mundo a foto de seu irmão Sergio Mattarella, atual presidente da Itália, puxando seu corpo para fora do carro. E fez de Letizia Battaglia um ícone da fotografia contemporânea, espécie de herdeira intelectual de Weegee (o norte-americano Arthur Fellig, morto em 1968 e mestre da fotografia realista seguido por célebres fotógrafos como Diane Arbus).

A exemplo de Weegee, Letizia chegava sempre ao local do crime bem antes da polícia. Jornalista, começou a fotografar por necessidade, para ilustrar os próprios artigos. Também como Weegee, Letizia sempre recorreu ao preto e branco - mais realista para registrar a história dos crimes de Palermo, embora com uma aposta formal diferente do fotógrafo nova-iorquino, que não era culto como a fotógrafa italiana. Weegee, além de tudo, não era igualmente afeito à ética.

Algumas de suas fotos foram montadas, dizem, mas ele fez escola no cinema, vendendo até os direitos de uso do título de seu primeiro livro, Naked City.

Letizia, ao contrário, fez da fotografia um documento incontestável. Alinhada a progressistas, foi amiga de Pasolini (1922-1975) e frequentemente cita o cineasta como uma de suas referências - o diretor aparece numa das fotos do livro, no Círculo Turati de Milão, em 1972. Além dele, outra imagem que testemunha o apreço de Letizia pela cultura é a do escritor Leonardo Sciascia (1921-1989) com o pintor Renato Guttuso (1911-1987) em Palermo, há 40 anos.

Sciascia foi um dos grandes autores italianos a tratar do tema da corrupção política na Sicília. Seu livro O Dia da Coruja revela toda a sua aversão ao fascismo e denuncia a rede de assassinatos encomendados por mafiosos e poderosos políticos. Sciascia representou para a Itália o que Roberto Saviano (leia nesta página) representa hoje com Gomorra e Os Meninos de Nápoles. Com uma diferença: Siascia era melhor escritor.

Letizia teme que o glamour dos marginais que aparecem nos filmes baseados nas obras de Saviano possa fascinar os espectadores mais jovens, pobres e desavisados. Sua preocupação com os garotos parece legítima. Pacifista, não gosta quando alguém diz que ela usa a câmera como uma arma. Sente até hoje o cheiro do sangue das vítimas da violência que fotografou. Igualmente lembra-se de cada rosto torturado pela humilhação, a pobreza e o medo. Certa vez, entrou numa casa humilde de Palermo onde uma criança acabara de morrer. Estava acompanhada de Franco Zecchin, o colega fotógrafo que registrou com ela a escalada de violência da Máfia nos anos 1980. Zecchin tentou captar a atmosfera geral. Ela se aproximou do rosto da mãe do menino, dependente de álcool, e de seu marido truculento, ameaçador.

Letizia registrou uma lágrima caindo do rosto da mulher. Há várias maneiras de se colocar diante do sofrimento. Ela escolheu ser discreta. Respeito, compreensão e envolvimento são seus três mandamentos. "Fotógrafos não podem mudar o mundo, mas, como um bom livro, podem ser uma pequena chama", costuma dizer. Seu livro, que traz também fotos líricas do mundo infantil, é uma prova desse fogo purificador.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Acompanhe tudo sobre:ExposiçõesFotografia

Mais de Casual

Brooks Running, uma das marcas de tênis mais amadas por corredores, chega ao Brasil

Sem planos para o fim do ano? Confira hotéis com pacotes disponíveis

Os 50 carros mais vendidos no Brasil no mês de novembro de 2024

Montblanc é eleito o melhor relógio para mergulho em premiação no Oriente Médio