Germano Couy, da Acer: o bom relacionamento com clientes e a determinação para fazer um trabalho bem-feito foram essenciais para que ele recebesse uma proposta, mesmo sem estar procurando (Omar Paixão / VOCÊ S/A)
Da Redação
Publicado em 11 de setembro de 2014 às 10h46.
São Paulo - Primeiro foi o Carnaval, que só ocorreu em março, a paralisar as ações das empresas. Depois veio a Copa do Mundo, que criou muita expectativa antes de seu início e atrapalhou a rotina enquanto a bola rolava. Agora, o Brasil entra em período eleitoral. Todos esses eventos fazem de 2014 um ano mais travado, em que tudo demora a avançar. Inclusive sua carreira.
Os números ajudam a entender essa desaceleração. Em junho, segundo dados do Ministério do Trabalho, foram criadas 25 000 vagas formais de emprego, pior saldo em 16 anos. O governo já diminuiu a projeção do PIB de 2014 de 2,5% para 1,8% — embora os analistas estimem o crescimento em 0,9%, segundo pesquisa do Banco Central divulgada em julho.
“A tendência é que a estagnação dure até o segundo trimestre de 2015”, diz o economista Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec, escola de administração do Rio de Janeiro. Até dezembro, tudo deve seguir igual. Os empresários querem saber o que acontecerá na eleição presidencial, se haverá ajustes na equipe econômica caso Dilma Rousseff seja reeleita, ou se haverá mudanças mais profundas com uma eventual vitória da oposição.
“Só depois disso as empresas vão fazer um planejamento de crescimento concreto”, diz Gilberto. Mas essa paralisia é motivo para desistir do objetivo de progredir na carreira? VOCÊ S/A acredita que não.
Do ponto de vista da carreira, 2014 se parece, portanto, com... 2013. Sim, o ano passado foi o das manifestações, que também atrapalharam a rotina de trabalho, e teve um crescimento do PIB um pouco abaixo da expectativa do governo, que esperava um índice de 2,5% e fechou o ano com 2,3%. E as empresas evitaram contratar e aumentar os salários.
Muita gente ficou pelo caminho, reclamando que avançar na carreira estava difícil. Nesse tempo todo, os índices de desemprego no Brasil se mantiveram nos mais baixos patamares da história (era de 6% em junho de 2014). Mas como será em 2015? Nada sugere que haverá grandes mudanças.
Tudo leva a crer que uma economia de baixo crescimento e baixo desemprego é o novo normal — um fato que economistas ainda se esforçam para explicar. A questão é: como crescer profissionalmente num mercado assim? A estratégia: faça coisas que só renderão frutos em 2015.
“No médio prazo, no Brasil ainda vai haver muitas oportunidades”, diz Joel Dutra, professor da Fundação Instituto Administração, escola de negócios, de São Paulo. A seguir, estão as principais atitudes que devem ser tomadas agora para que você consiga manejar sua carreira e impedir que seu desenvolvimento profissional fique estagnado como a economia brasileira.
Faça um ótimo trabalho
As empresas estão com as estruturas mais enxutas e precisam que os funcionários que ficaram deem conta do recado. O que significa que a pressão por resultados está alta. “É nessa hora que as empresas colocam uma lupa sobre o desempenho das pessoas”, diz João Baptista Brandão, professor da Fundação Getulio Vargas de São Paulo.
Por isso, mais do que nunca, é importante dedicar-se ao trabalho e entregar bons resultados — tanto para seu chefe quanto para seus clientes, que podem se tornar seus empregadores no futuro. Mostrar-se como alguém que resolve problemas e que tem comprometimento é a melhor estratégia para crescer.
Foi isso o que fez Germano Couy, de 44 anos, presidente da Acer no Brasil, fabricante de computadores, de São Paulo. Ele foi chamado para preencher a vaga que ocupa desde junho deste ano. Antes, era vice-presidente da área de celulares da Positivo. Germano não estava procurando uma recolocação, mas foi convidado para a vaga da Acer pelo presidente global da empresa.
“Atribuo o convite ao bom trabalho que eu fazia na Positivo e em meus cargos anteriores na área de tecnologia”, diz. “Sempre procurei atender às demandas dos clientes e, como a área em que atuo é muito fechada, construí uma boa reputação que me rendeu essa mudança.”
Para fazer um bom trabalho, entenda que a crise pode ficar do lado de fora e não afetar seu desempenho. “A estagnação gera oportunidades para quem quer criar soluções e resolver problemas”, diz Germano.
Assuma novos desafios
Embora todos estejam cheios de tarefas, pega bem assumir mais desafios — desde que haja certeza de que é possível fazer mais. Antes de se oferecer, leia o ambiente da empresa para identificar qual área está enfrentando maior carência de bons profissionais. Depois, pense se suas competências podem ser usadas para ajudar.
“Se o profissional se planejou previamente para assumir mais funções e tem certeza de que vai dar conta do recado, será bem-visto pelo chefe”, diz Nélio Bilate, da NB Heart, consultoria de carreira, de São Paulo. Quando o funcionário se sai bem, as chances de aumento e promoção crescem. Por isso, não tenha medo de deixar que seu chefe saiba que há a vontade de assumir novas tarefas e desafios.
A comunicação pode ser feita em um momento de feedback, formal ou informal. Francisco Eduardo Pires, de 45 anos, adotou essa estratégia e foi promovido de diretor de logística à vice-presidente de vendas da Novelis, produtora de alumínio, de São Paulo. Em março, foi avaliado formalmente por seu gestor, o presidente da empresa.
“Eu disse que queria, nos próximos dois anos, migrar da logística para vendas”, conta Francisco. Era uma sugestão para uma transição de longo prazo, mas a vaga surgiu mais rapidamente, e ele foi escolhido. “Ter falado sobre esse desejo e ter feito com que meu trabalho superasse as expectativas da empresa me ajudou nessa evolução”, afirma.
Leia o cenário
Os setores estão em descompasso. A indústria sente dificuldades de crescimento e tem demitido funcionários. O varejo e o turismo, impulsionados pela Copa do Mundo e com grande demanda do mercado interno, oferecem mais oportunidades. Por isso, é importante entender o que está acontecendo em sua empresa.
Antes de agir, converse com colegas, faça perguntas para seu chefe e se informe sobre sua área em jornais e revistas. Cada profissional tem de descobrir o que ocorre a sua volta para ajustar a atitude. “Não adianta pedir aumento agora se a companhia está em uma fase ruim”, diz Clara Linhares, professora da Fundação Dom Cabral, escola de negócios, de Minas Gerais.
Invista em educação
Um erro que pode ser cometido durante esse cenário desacelerado é deixar de investir em si mesmo. Já que a tendência é que não existam surpresas e mudanças bruscas de carreira (como uma expatriação, por exemplo), agora é o momento ideal para aprimorar a educação. “Quem não se preparar vai sofrer no futuro, pois tem muita gente se especializando para quando o mercado reaquecer”, diz Joel Dutra, da FIA.
Pense em quais são seus pontos fracos (leve em conta suas habilidades técnicas e comportamentais) e aproveite para corrigi-las: aperfeiçoar o inglês, fazer um curso rápido de atualização ou investir em algo que demande mais tempo, como um MBA ou uma pós-graduação. Se sua empresa oferece cursos de aperfeiçoamento, pesquise os melhores para você.
No curto prazo, é fundamental estar preparado porque as oportunidades que podem surgir serão para poucos. “Não há mais aquela avalanche de contratações como aconteceu em 2010”, diz Maria Candida Braumer de Azevedo, da People & Results, consultoria de carreira, de São Paulo. “As vagas e as promoções são pontuais, e as empresas estão escolhendo só os melhores.”
Aposte no networking
Arede de contatos sempre é estratégica. E ainda mais importante nesse cenário. O único cuidado a ser tomado é não parecer ansioso para criar laços apenas porque o mercado não está aquecido. No mundo ideal, o networking tem de ser uma atividade cotidiana e deve estar na agenda das prioridades (leia mais na reportagem Networking sem Culpa).
Há algumas estratégias para ampliar a rede sem parecer desesperado. Uma das mais eficientes é contar aos outros quais são seus atuais projetos. Isso desperta interesse nas pessoas e é um jeito de fazer propaganda do próprio trabalho sem tanto alarde. “Convide pessoas estratégicas para um almoço ou café e pergunte o que elas estão fazendo”, diz Maria Candida, da People & Results.
“A tendência natural é que elas perguntem sobre seus projetos e abram espaço para uma troca.” Outra estratégia é pedir ajuda — mesmo que não seja necessário. O importante é encontrar um modo de conversar com colegas e chefes e mostrar a eles que existe comprometimento e dedicação em seu trabalho.
Tenha paciência
Neste ano, a paciência é valiosa. Como o cenário econômico não deve mudar nos próximos meses, os profissionais mais calmos, resilientes e que pensam no longo prazo vão manejar melhor a carreira do que os apressados. Este é o momento de colocar algumas ambições maiores na gaveta e respirar fundo.
Atitudes arriscadas, como um pedido de demissão ou a abertura de um novo negócio, só são recomendadas se existir um forte planejamento prévio. “Se o profissional tiver reserva financeira e um plano de ação consolidado, pode ousar”, diz João Baptista, da FGV. “Desde que saiba exatamente quais são seus objetivos e entenda que o retorno financeiro pode demorar um pouco.”
Mude com objetividade
Embora as movimentações estejam mais lentas neste ano, nada impede que surja uma proposta interessante. Se isso ocorrer, o conselho é pensar muito antes de aceitar, pois as novas oportunidades tendem a ser mais pontuais. “É difícil alguém se recolocar rapidamente se quiser se demitir de um novo emprego que o desapontou”, diz Maria Candida, da People & Results.
Então, não troque de crachá se não tiver certeza sobre seu alinhamento com os valores da nova empresa e sobre sua motivação para encarar o trabalho. Se aparecer um convite, pense estrategicamente sobre sua carreira antes de aceitar, como fez Patricia Barbelli, de 38 anos, atual diretora jurídica da Whirlpool, fabricante das linhas Cônsul e Brastemp, de São Paulo.
Em fevereiro, um headhunter que a advogada conhecia do mercado a contatou informando sobre a vaga. Na época, ela era diretora jurídica da Pirelli, fabricante de pneus. Antes de entrar no processo seletivo, a profissional pesquisou bastante sobre a cultura da Whirlpool e sobre as possibilidades de carreira na companhia. Foram quatro meses de entrevistas.
“Esse período foi importante para que eu tivesse certeza de que queria trabalhar na empresa”, diz Patricia. “O que me motivou muito a aceitar o emprego foi a possibilidade de assumir, no futuro, uma vice-presidência — algo incomum na área jurídica na maioria das empresas no Brasil.”