Andrew Rzepa, do Gallup: “Ao contratar alguém, as empresas deviam se perguntar se, em dois, cinco ou dez anos, a carreira desse funcionário vai ser melhor, se ele vai ter relacionamentos mais fortes e mais energia” (Eduardo Zappia)
Da Redação
Publicado em 18 de junho de 2015 às 05h56.
São Paulo – Uma das maiores e mais renomadas empresas de pesquisa do mundo na área de promoção da saúde, com estudos que embasam relatórios das Organizações das Nações Unidas e do Banco Mundial, o Gallup definiu cinco elementos inter-relacionados e interdependentes — propósito, social, financeiro, comunitário e físico — que são determinantes para o bem-estar completo do trabalhador.
“E apenas um em cada cinco indivíduos no planeta está prosperando em três ou mais elementos do bem-estar”, afirma o londrino Andrew Rzepa, especialista em gestão de negócios e consultor sênior do Gallup, responsável pela coordenação de estudos de bem-estar, promoção da saúde e seus impactos nas organizações.
A boa notícia é que o Brasil ocupa o quarto lugar no ranking mundial de países onde os trabalhadores prosperam em três ou mais elementos, alcançando, no ano passado, índice de 39% das pessoas. Um dos palestrantes do Fórum Sesi Qualidade de Vida para a Produtividade na Indústria, que aconteceu no fim de maio, no Rio de Janeiro, Rzepa fez questão de desvincular o bem-estar do PIB per capita. “Nos países da Primavera Árabe, o PIB aumentou ao mesmo tempo que o número de pessoas felizes e satisfeitas com a vida que levam caiu”, afirmou.
Mas reforça a ligação direta que existe entre bem-estar, engajamento e produtividade — e, consequentemente, os resultados das companhias. “Você pode definitivamente dizer que um empregado que prospera bem em todos os cinco elementos é mais produtivo”, diz. A seguir, a entrevista que Rzepa concedeu com exclusividade à VOCÊ RH.
VOCÊ RH - Qual a definição de bem-estar para o Gallup?
Andrew Rzepa - Fazemos uma pesquisa anual, que, em 2014, cobriu 143 países para entender as esperanças, os medos e os sonhos da população mundial. Conversamos com pessoas de 15 anos ou mais, e somente em países onde é possível cobrir 80% da população é que lançamos mão de entrevistas por telefone. Nós vamos até as pessoas.
Nos últimos dez anos investimos mais de 200 milhões de dólares nesse trabalho. E, para nós, o bem-estar vai muito além dos aspectos objetivos de renda, saúde, emprego e pobreza. Ele engloba também aspectos subjetivos, do valor que as pessoas dão à vida e das experiências — positivas e negativas — que elas têm diariamente.
Nós começamos pedindo às pessoas para pensar no dia anterior e lembrar se vivenciaram sentimentos positivos (se elas foram tratadas com respeito, sorriram, gargalharam, aprenderam alguma coisa ou se divertiram) ou negativos (se sentiram alguma dor física, preocupação, tristeza, estresse ou raiva) na maior parte do dia.
Entre os países da América Latina, o Brasil ocupa a 51a posição, com 74% dos respondentes vivenciando sentimentos positivos. O Paraguai é o primeiro do ranking, com 89%, seguido por Colômbia, Equador e Guatemala, com 84% cada um.
VOCÊ RH - Mas o Brasil não está no quarto lugar em bem-estar?
Andrew Rzepa - Sim, quando você pensa nos cinco elementos do bem-estar e na quantidade de pessoas que estão prosperando em pelo menos três deles.
VOCÊ RH - Que cinco elementos são esses?
Andrew Rzepa - O primeiro é o propósito, é gostar do que você faz todos os dias e se sentir motivado a alcançar seus objetivos. Aqui, nós perguntamos às pessoas também se elas aprendem ou fazem alguma coisa interessante diariamente. Em segundo, vem o social, que significa ter apoio e amor na vida. É saber se há alguém que encoraja e apoia a pessoa, se seus amigos e sua família lhe dão energias positivas todos os dias.
Depois, tem o elemento financeiro, que busca identificar se a pessoa consegue manejar sua vida econômica para reduzir o estresse e aumentar a segurança, se ela tem dinheiro suficiente para fazer o que faz ou se esteve preocupada com dinheiro nos últimos sete dias.
O elemento comunidade tem a ver com gostar do lugar em que mora, ter orgulho dele e se sentir seguro. E o elemento físico depende de boa saúde e energia suficiente para desempenhar as atividades diárias. As pessoas que prosperam em todos esses cinco elementos faltam 41% menos ao trabalho do que aquelas que prosperam somente no elemento físico. Elas também são 81% menos propensas a mudar de empresa nos próximos 12 meses e têm 65% menos chance de entrar com processo contra seus empregadores.
Portanto, defendo que, ao contratar alguém, as empresas deveriam se perguntar se, em dois, cinco ou dez anos, a carreira desse funcionário vai ser melhor, se ele vai ter relacionamentos mais fortes, se vai estar mais seguro financeiramente, mais saudável, ter mais energia, e quanto estará envolvido e engajado com sua comunidade.
VOCÊ RH - Podemos concluir, portanto, que as pessoas que prosperam bem nos cinco elementos são mais engajadas e produtivas? E isso tem um impacto financeiro nas empresas?
Andrew Rzepa - Engajamento e bem-estar são conceitos diferentes, mas estão interconectados. Individualmente, eles são impactantes, juntos eles têm um efeito multiplicativo. Você pode, definitivamente, dizer que um empregado que prospera bem em todos os cinco elementos é mais produtivo. E isso tem um impacto nos resultados sim.
Nos Estados Unidos, em quanto mais elementos você prosperar, menor será seu custo relacionado à saúde. Se você não está bem em nenhum elemento, por exemplo, você terá um custo com saúde na média de 9 300 dólares por ano. Quando você prospera em três elementos, esse valor cai para 5 387 dólares. E, se você desempenha bem nos cinco elementos, seu custo será de 3 500 dólares.
VOCÊ RH - Quais são os três elementos do bem-estar nos quais os brasileiros se saem bem?
Andrew Rzepa - Globalmente, apenas 17% da população mundial está prosperando em três ou mais elementos do bem-estar. Nas Américas, esse percentual é de 33%, e, no Brasil, de 39%. O Brasil empata com a Áustria e fica abaixo apenas do Panamá, da Costa Rica e da Dinamarca.
Se pensarmos somente no elemento propósito, o Brasil alcança índice de 45%. No social, de 52%, e, no físico, de 44%. Os dois elementos do bem-estar nos quais o Brasil apresenta os piores desempenhos e não prospera são o financeiro (19%) e o comunitário (41%).
VOCÊ RH - Quais são suas recomendações aos líderes para melhorar o bem-estar e a qualidade de vida nas empresas e, consequentemente, aumentar a produtividade?
Andrew Rzepa - Acredito que o que leva à baixa produtividade e, inclusive, a doenças, como estresse e depressão, é a falta de engajamento nas empresas. Nós fizemos outra pesquisa na qual identificamos que a terceira experiência mais desagradável no dia de uma pessoa é lidar com clientes. A segunda é ter de interagir com os colegas de trabalho. E a primeira é estar com o chefe, uma experiência definida como pior do que fazer faxina.
Por isso, as empresas precisam entender que satisfação é diferente de engajamento. Elas fazem pesquisas de satisfação e apuram índices altos, mas em uma pesquisa que fizemos nos Estados Unidos percebemos que apenas 13% dos funcionários se sentiam, realmente, engajados na sua empresa. Os outros 87% não entregavam o que precisavam entregar, estavam desmantelando as empresas, mas iam embora ao fim do dia felizes e satisfeitos mesmo sem ter feito muita coisa.
VOCÊ RH - Como apurar o engajamento? E como o engajamento se relaciona com o bem-estar do trabalhador?
Andrew Rzepa - Nós definimos 12 perguntas-chave para medir o engajamento. Elas funcionam como um contrato emocional que os gerentes precisam firmar e respeitar com suas equipes se quiserem ter equipes produtivas.
Nos Estados Unidos, ao olharmos as experiências diárias positivas e negativas de uma pessoa, elas podem ser piores no caso de empregados desengajados do que de desempregados. Exemplo: 46% dos desengajados disseram ter aprendido algo interessante, ante 80% para os engajados e 65% para os desempregados.
Além disso, o engajamento está diretamente ligado ao elemento propósito do bem-estar, uma vez que pessoas engajadas fazem o melhor que podem a cada dia. Está relacionado ao elemento físico, já que, ao não sofrer para ir ao trabalho, pessoas engajadas são mais saudáveis. E também está ligado ao aspecto social.
Nós não perguntamos se a pessoa tem colegas de trabalho, mas se tem algum melhor amigo no trabalho. Acredito que as empresas podem e devem estimular as relações interpessoais entre seus funcionários.
VOCÊ RH - Como seria uma boa forma de fazer isso?
Andrew Rzepa - Existem inúmeras formas de criar situações para que as pessoas possam se conhecer. Nós recomendamos que as empresas não forcem isso, mas criem situações e ambientes em que a conversa informal ocorra.
Por exemplo: começar reuniões com apresentações pessoais; criar eventos comunitários; conectar as pessoas com base em seus interesses em comum; facilitar a criação de clubes para que possam ir após o trabalho; garantir que exista um espaço dentro da empresa para interações interpessoais, como a cozinha ou até o bebedouro — criar, portanto, um espaço para estimular as pessoas a parar de comer na própria mesa.