Dani Junco (esq) e Juliana Azevedo no estúdio, e Pedro de Figueiredo, Adriana Barbosa e Luciana Cattony, no telão, em debate EXAME/Aladas (EXAME/Exame)
Mariana Desidério
Publicado em 10 de março de 2022 às 09h57.
Última atualização em 11 de março de 2022 às 11h30.
Equilibrar as responsabilidades da maternidade com as ambições de uma carreira profissional não é tarefa simples e as mulheres encontram diversos obstáculos nesse caminho. Apenas 54,6% das mulheres com idade entre 25 a 49 anos que são mães de crianças de até três anos estão no mercado de trabalho. O número cai para 49,7% entre as mulheres negras. Mesmo quando continuam empregadas, essas mulheres muitas vezes não são consideradas para promoções dentro das companhias, além de em geral lidarem com uma carga de responsabilidade sobre os filhos maior do que os pais e uma expectativa social sobre o que é ser uma boa mãe.
A relação entre maternidade, culpa e trabalho foi debatida na terça-feira 8, Dia Internacional da Mulher, no evento Agora é Que São Elas, da Exame em parceria com a Aladas. Participaram do debate Adriana Barbosa, fundadora da Feira Preta e CEO da PretaHub, Juliana Azevedo, presidente da P&G Brasil, Luciana Cattony, cofundadora da consultoria Maternidade nas Empresas, e Pedro de Figueiredo, idealizador do Memoh. A conversa foi mediada por Dani Junco, fundadora da B2Mamy.
Junco iniciou o debate com uma provocação: “Ainda que a maternidade seja natural, ela ainda é vista como surpresa desagradável em muitas empresas. Por quê?”. Luciana Cattony avalia que o viés da maternidade é o maior viés relacionado ao gênero. “É aquela crença de que, depois que é mãe, a mulher não vai ser mais comprometida com a carreira, não vai querer assumir desafios, não é mais competente, não vai querer viajar. É preciso reconhecer que esse viés existe, mas isso só não basta. É preciso agir para combatê-lo”, afirmou.
Segundo ela, algumas empresas estão começando a agir para que o acolhimento da maternidade não seja mais dependente apenas de gestores empáticos e torne-se de fato uma política da organização. “As empresas não fazem isso porque são boazinhas. Isso gera resultado de negócio, as pessoas livres, sendo quem elas são, tornam-se mais produtivas”, disse.
Juliana Azevedo, presidente da P&G Brasil, ressalta que é papel de empresas como a P&G influenciar o ecossistema à sua volta. “Na empresa em que trabalho a maternidade não é notícia ruim, já promovi e já contratei mulheres gravidas. Cada empresa está em um momento diferente dessa jornada. Temos que influenciar e multiplicar as experiências que temos para mostrar que é possível”, disse. Para que essa mudança seja mais rápida, é importante haver mais lideranças femininas nas organizações, acrescentou Adriana Barbosa, fundadora da Feira Preta. “Tem que mudar a cultura organizacional, e não só na área de RH. Para isso, precisa ter mulheres em cargos de liderança”.
Se o viés de gênero nas empresas dificulta a ascensão das mães no mercado de trabalho, os estereótipos da maternidade não ficam atrás. “Existe na empresa o preconceito. Mas tem também na sociedade a definição do que é ser uma boa mãe, e uma boa mãe só se dedica de uma forma específica”, disse Azevedo, da P&G.
A executiva contou de sua experiência pessoal, quando decidiu assumir uma posição regional na companhia. “O julgamento é muito forte. Quando assumi uma posição regional, me mudei para o Panamá e minha família ficava no Brasil. Eu viajava toda semana, mãe de um filho de 3 anos. Eu tinha todo um apoio, a empresa me apoiou totalmente, mas no círculo à minha volta houve muito julgamento, de como é a mulher mãe e profissional. Se você não se encaixa nos estereótipos, tem que levantar a voz, tem que falar ‘isso não me pertence’”.
Essas expectativas sociais geram um sentimento de culpa que paralisam a mulher, acrescenta Luciana Cattony, da Maternidade nas Empresas. “A culpa é um mecanismo interno que nos trava, temos que entender esse mecanismo pra não cair nessas armadilhas no nosso círculo social ou na nossa empresa”, disse. Junco da B2Mamy, acrescenta que “a culpa impede que a mulher fique mais rica” e questiona: “À mulher é negado o prazer e o descanso: como se livrar disso?”
A solução encontrada por Adriana Barbosa, da Feira Preta foi “conversar com a culpa”. “eu sou mãe solteira e comecei a lidar com essas questões conversando com meus medos e culpas. A culpa me paralisava, hoje bato papo com ela e, quando alguém joga culpa para cima de mim, eu falo ‘isso é seu, não é meu’”, disse.
A solução para esse problema passa também pela maior conscientização dos homens, acrescentou Pedro de Figueiredo. “A gente se responsabilizar tanto quanto, sair da ajuda e ir para a responsabilidade conjunta. O homem que não sabe o shampu que usa é uma ilustração de como somos acomodados com o cuidado. Precisamos deixar os homens incomodados, entender que problemas de gênero são nossos também”, disse.
Veja o painel completo no vídeo abaixo: