Khaleesi: para chegar ao topo, a pessoa deixa pelo caminho um rastro de “cadáveres” (HBO/Divulgação)
Luísa Granato
Publicado em 20 de maio de 2019 às 06h00.
Última atualização em 20 de maio de 2019 às 14h25.
São Paulo - “Eu não estou aqui para ser a rainha das cinzas. Eu não vou atacar King’s Landing”, disse Daenerys Targaryen, na sétima temporada da série Game Of Thrones.
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ATENÇÃO! SPOILERS DO EPISÓDIO 5 A SEGUIR
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Os fãs que acompanharam o penúltimo episódio da série, que terminou neste domingo, sabem que a promessa não foi cumprida.
Aos soarem os sinos da cidade, um sinal de rendição, a Targaryen alçou voo em seu dragão na direção do castelo, destruindo com fogo tudo e todos em seu caminho. E seus exércitos de Imaculados e Dothrakis a seguiram, massacrando os soldados inimigos e cidadãos inocentes.
Muitos espectadores ficaram perplexos, outros indignados e alguns acreditam que o destino da querida Khaleesi era inevitável.
Independente do desfecho da série ou de opiniões sobre escolhas dos roteiristas, Roberto Aylmer, médico, PhD e professor internacional da Fundação Dom Cabral, consegue ver um paralelo importante entre a jornada da personagem e o mundo corporativo.
A busca pelo poder pode revelar um lado cruel das pessoas, segundo ele.
“Na vida executiva, muitos começam com boa intenção, acreditando em tudo, mas terminam acreditando em nada. Começam inocentes e terminam cínicos”, comenta ele.
Empresas que exigem uma competitividade predatória ajudam a formar líderes sedentos pelo poder, que perdem de vista metas coletivas, minando colegas e aterrorizando suas equipes. Para chegar ao topo, a pessoa deixa pelo caminho um rastro de “cadáveres”.
Algo muito parecido a jornada daqueles que buscam sentar no trono de ferro.
“O índice de psicopatas em empresas é 4 vezes maior do que na sociedade. E empresas estimulam essa dinâmica de cada um por si, a competição vira uma arena de gladiadores”, comenta o professor.
Para o especialista, as ações de Daenerys foram resultado de uma escolha entre seu papel como rainha e seu histórico pessoal.
“Ela tinha o poder absoluto e todas as oposições contra ela destruídas, ela poderia escolher ser a quebradora de correntes, ajudando seu povo, ou a mulher querendo vingança, que perdeu a família e sofreu nas mãos dos outros”, diz.
Essa escolha é comum na vida profissional e uma encruzilhada onde muitos se encontram de tempos em tempos: liderar em benefício próprio ou por aqueles que têm menos poder.
Segundo o professor, há cada vez menos espaço para o primeiro tipo de liderança. É natural buscar alcançar objetivos pessoais, mas as empresas não têm mais espaço para reis e rainhas absolutos.
“O poder não está mais na pessoa, está no propósito. Mitos, salvadores da pátria e presidentes que têm todo o poder: esse modelo de gestão entra em conflito com a sociedade mais ágil. O cliente e os funcionários exigem um nível mais alto de maturidade moral dos líderes e companhias, o que significa que buscam posicionamentos considerando um bem comum”, explica Aylmer.
Como sinal disso, ele aponta a carta dos funcionários da Amazon cobrando de seu CEO um plano sobre a mudança climática. Uma liderança que busque controlar e peça obediência cega não encaixa no desejo dos profissionais de que seu trabalho tenha razão e impacto na sociedade.
A liderança com maturidade moral é aquela que ajuda a alavancar sua equipe e faz conexões para a vida. Além de crescer, ela cria condições para que outros também cresçam. “É uma estratégia mais inteligente e sustentável para a carreira e para a empresa”, fala ele.
Para Aylmer, um exemplo em Game of Thrones desse líder é Jon Snow. Ele é visto como tolo, foi traído e humilhado em diversas ocasiões. No entanto, ele usa sua força para unir os outros contra um inimigo em comum e está disposto a correr riscos para salvar os outros.
Erradicar a liderança tirânica é muito difícil e Aylmer não recomenda um confronto direto e solitário. O melhor a ser feito é não internalizar ou reproduzir os malfeitos. “É o que Daenerys não conseguiu fazer”, diz.
Ele conta que teve que abandonar a consultoria para um cliente após observar que o executivo da empresa tinha traços de psicopatia e que tinha um caso com outra diretora. A equipe e a empresa estavam sendo prejudicadas, mas seus superiores e a matriz da companhia estavam cientes das transgressões. Mesmo assim, nada foi feito.
”Eu poderia fazer meu trabalho ali e ganhar meu dinheiro, mas tinha certeza de que nada iria mudar”, confessa.
O especialista alerta que pessoas com apego ao poder sempre causam danos. Ele aponta três sinais para encontrar chefias com baixa maturidade moral: