Porta-aviões de amianto: a instituição informou que sua degradação traz "risco elevado" que representa ao meio ambiente (AFP/AFP Photo)
AFP
Publicado em 24 de janeiro de 2023 às 14h24.
Última atualização em 24 de janeiro de 2023 às 14h34.
Antigo navio-insígnia da Marinha francesa, o porta-aviões Foch, renomeado São Paulo em 2000 ao passar à bandeira brasileira, vaga pelo mar em busca de um porto de refúgio, sob o risco de terminar seus dias no fundo do oceano.
A Marinha brasileira anunciou na sexta-feira que está atracando seu casco velho, cheio de amianto, tinta e outros resíduos tóxicos, em um ponto do Oceano Atlântico a 315 quilômetros da costa brasileira, para evitar que o navio fique à deriva.
A instituição informou em nota que em vista de sua degradação e do "risco elevado" que representa ao meio ambiente, não autorizará mais seu retorno a um porto ou ao mar territorial do Brasil.
O antigo porta-aviões, que esteve a serviço da Marinha francesa por 37 anos, foi levado até lá por um rebocador holandês a serviço do estaleiro turco Sok Denizcilik, que o havia comprado como sucata em abril de 2021, mas corria o risco de abandoná-lo na falta de encontrar um porto para recebê-lo.
Organizações de defesa do meio ambiente alertaram para o risco de a antiga embarcação, construída no fim dos anos 1950 em Saint-Nazaire, no oeste da França, terminar os dias no fundo do mar. Elas temem, sobretudo, uma operação de afundamento de parte das autoridades brasileiras.
A Marinha brasileira "se prepara atualmente para cometer um crime ambiental de grandes proporções no mar", alertou Jim Puckett, diretor da organização Basel Action Network (BAN), ao afirmar em nota que teme que a instituição "afunde" o casco "usando uma falsa justificativa".
"É inquietante ter no mar 30 mil toneladas de resíduos tóxicos, dos quais não sabemos o destinatário", alerta a associação Robin des Bois.
As organizações ambientalistas apelam ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que se diz disposto a lutar pelo meio ambiente em seu terceiro mandato.
"Pedimos ao presidente Lula, como comandante-em-chefe da Marinha brasileira, a intervir imediatamente e dar a ordem de levar de volta o São Paulo para o Rio de Janeiro", reivindica a organização Shipbreaking Platform, avaliando que se o Brasil afundar "intencionalmente" o casco, isto "equivaleria a um crime ambiental patrocinado pelo Estado".
A antiga glória da "La Royale", como é conhecida a Marinha francesa, capaz de catapultar aeronaves de 12 a 15 toneladas a uma velocidade de decolagem de 278 quilômetros por hora, havia sido adquirida pelo Brasil em 2000. Mas, devido à sua antiguidade e a uma série de problemas relacionados sobretudo a um incêndio a bordo, registrado em 2005, e depois que sua modernização foi considerada cara demais, o país decidiu se desfazer dele.
Em junho de 2022, o estaleiro Sok Denizcilik obteve autorização das autoridades brasileiras para conduzi-lo até a Turquia para ser desmontado. Mas, quando estava na altura do estreito de Gibraltar, no final de agosto, as autoridades ambientais turcas informaram que a embarcação não era mais bem-vinda.
As autoridades brasileiras, então, fizeram com que retornasse, mas sem autorizar que se aproximasse da costa, apesar de um constante "agravamento dos danos" no nível do casco.
Após vários meses ao longo do porto de Suape, no leste de Pernambuco, o estaleiro turco ameaçou abandonar o casco.
Em 19 de janeiro, o rebocador holandês ALP Guard, operando para o estaleiro, começou a se afastar do litoral brasileiro após uma decisão da Justiça proibindo-o de navegar águas internacionais sem a autorização prévia das autoridades brasileiras.
O Ibama, responsável no Brasil pela aplicação da Convenção de Basileia sobre o Controle de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos, informou em seu site ter solicitado a intervenção da Marinha do Brasil.
A saga do antigo navio-insígnia da Marinha francesa, que participou sobretudo das operações aéreas da Otan contra a antiga Iugoslávia na primavera boreal de 1999, durante a crise de Kosovo, remete à de seu navio-gêmeo, o Clemenceau.
Este último foi desmontado em 2010 na Grã-Bretanha, após ter sido interditado na Índia após uma polêmica sobre a presença de amianto a bordo.