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"Por que tanto medo da verdade?", diz Lula após STF adiar julgamento

O recurso da defesa do petista foi incluído na pauta do Supremo como 12º item, o que deve inviabilizar o julgamento por falta de tempo hábil

Lula: petista considerou o adiamento “inaceitável” e pediu para que sua defesa insista em manter o julgamento na data prevista. (Fabio Vieira/Getty Images)

Lula: petista considerou o adiamento “inaceitável” e pediu para que sua defesa insista em manter o julgamento na data prevista. (Fabio Vieira/Getty Images)

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Clara Cerioni

Publicado em 24 de junho de 2019 às 14h52.

Última atualização em 24 de junho de 2019 às 16h04.

São Paulo — A equipe do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recorreu às redes sociais do petista nesta segunda-feira (24) para questionar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) em adiar o julgamento previsto para terça-feira (25), que pede a anulação do processo do tríplex do Guarujá (SP), pelo qual o petista foi condenado e está preso.

Na ação, que está correndo no Tribunal desde novembro do ano passado, sua defesa alega que houve atuação parcial do então juiz do caso e atual ministro da Justiça, Sergio Moro. Nesta manhã, foi noticiado que os ministros devem deixar a votação para o segundo semestre do ano, ainda sem data definida.

O recurso — um habeas corpus — foi incluído pela presidente da turma, ministra Cármen Lúcia, como 12º item da pauta de julgamentos. Por essa razão, o ministro Gilmar Mendes, que iria apresentar o seu voto-vista, concluiu que não haverá tempo hábil na sessão de terça-feira (25) para apreciar o caso e já pediu a seu gabinete para formalizar o adiamento do julgamento, de acordo com o gabinete do ministro.

No perfil oficial de Lula no Twitter, ele diz que "muita gente poderosa, daqui e de outros países, quer impedir essa decisão, ou continuar adiando, que dá no mesmo para quem está preso injustamente".

 

De acordo com o petista, "há provas suficientes de que o juiz é suspeito e não foi imparcial", mesmo antes das revelações das mensagens atribuídas a Moro e a procuradores da Lava Jato publicadas pelo site The Intercept Brasil. Ele questiona, ainda, "por que tanto medo da verdade".

As publicações feitas em suas redes sociais foram retiradas de uma carta enviada pelo petista ao ex-chanceler Celso Amorim datada desta segunda-feira (24).

O advogado do petista, Cristiano Zanin Martins, que esteve hoje com Lula, afirma que o ex-presidente considerou o adiamento “inaceitável” e pediu para que sua defesa insista em manter o julgamento na data prevista.

“Nos estaremos lá amanhã e esperamos que o caso seja ouvido. É no interesse público dos brasileiros que este pedido de HC seja decidido o mais rápido possível”, disse o advogado.

Leia a carta na íntegra:

“Querido amigo,

A cada dia fico mais preocupado com o que está acontecendo em nosso Brasil. As notícias que recebo são de desemprego, crise nas escolas e hospitais, a redução e até mesmo o fim dos programas que ajudam o povo, a volta da fome. Sei que estão entregando as riquezas do país aos estrangeiros, destruindo ou privatizando o que nossa gente construiu com tanto sacrifício. Traindo a soberania nacional.

É difícil manter a esperança numa situação como essa, mas o brasileiro não desiste nunca, não é verdade? Não perco a fé no nosso povo, o que me ajuda a não fraquejar na prisão injusta em que estou faz mais de um ano. Você deve se lembrar que no dia 7 de abril de 2018, ao me despedir dos companheiros em São Bernardo, falei que estava cumprindo a decisão do juiz, mas certo de que minha inocência ainda seria reconhecida. E que seria anulada a farsa montada para me prender sem ter cometido crime. Continuo acreditando.

Todos os dias acordo pensando que estou mais perto da libertação, porque o meu caso não tem mistério. É só ler as provas que os advogados reuniram: que o tal tríplex nunca foi meu, nem de fato nem de direito, e que nem na construção nem a reforma entrou dinheiro de contratos com a Petrobrás. São fatos que o próprio Sergio Moro reconheceu quando teve de responder o recurso da defesa.

É só analisar o processo com imparcialidade para ver que o Moro estava decidido a me condenar antes mesmo de receber a denúncia dos procuradores. Ele mandou invadir minha casa e me levar à força pra depor sem nunca ter me intimado. Mandou grampear meus telefonemas, da minha mulher, meus filhos e até dos meus advogados, o que é gravíssimo numa democracia. Dirigia os interrogatórios, como se fosse o meu acusador, e não deixava a defesa fazer perguntas. Era um juiz que tinha lado, o lado da acusação.

A denúncia contra mim era tão falsa e inconsistente que, para me condenar, o Moro mudou as acusações feitas pelos promotores. Me acusaram de ter recebido um imóvel em troca de favor mas, como viram que não era meu, ele me condenou dizendo que foi “atribuído” a mim. Me acusaram de ter feito atos para beneficiar uma empresa. Mas nunca houve ato nenhum e aí ele me condenou por “atos indeterminados”. Isso não existe na lei nem no direito, só na cabeça de quem queria condenar de qualquer jeito.

A parcialidade dele se confirmou até pelo que fez depois de me condenar e prender. Em julho do ano passado, quando um desembargador do TRF-4 mandou me soltar, o Moro interrompeu as férias para acionar outro desembargador, amigo dele, que anulou a decisão. Em setembro, ele fez de tudo para proibir que eu desse uma entrevista. Pensei que fosse pura mesquinharia, mas entendi a razão quando ele divulgou, na véspera da eleição, um depoimento do Palocci que de tão falso nem serviu para o processo. O que o Moro queria era prejudicar nosso candidato e ajudar o dele.

Se alguém ainda tinha dúvida sobre de que lado o juiz sempre esteve e qual era o motivo de me perseguir, a dúvida acabou quando ele aceitou ser ministro da Justiça do Bolsonaro. E toda a verdade ficou clara: fui acusado, julgado e condenado sem provas para não disputar as eleições. Essa era única forma do candidato dele vencer.

A Constituição e a lei determinam que um processo é nulo se o juiz não for imparcial e independente. Se o juiz tem interesse pessoal ou político num caso, se tem amizade ou inimizade com a pessoa a ser julgada, ele tem de se declarar suspeito e impedido. É o que fazem os magistrados honestos, de caráter. Mas o Moro, não. Ele sempre recusou se declarar impedido no meu caso, apesar de todas as evidências de que era meu inimigo político.

Meus advogados recorreram ao Supremo Tribunal Federal, para que eu tenha finalmente um processo e um julgamento justos, o que nunca tive nas mãos de Sergio Moro. Muita gente poderosa, no Brasil e até de outros países, quer impedir essa decisão, ou continuar adiando, o que dá no mesmo para quem está preso injustamente.

Alguns dizem que ao anular meu processo estarão anulando todas as decisões da Lava Jato, o que é uma grande mentira pois na Justiça cada caso é um caso. Também tentam confundir, dizendo que meu caso só poderia ser julgado depois de uma investigação sobre as mensagens entre Moro e os procuradores que estão sendo reveladas nos últimos dias. Acontece que nós entramos com a ação em novembro do ano passado, muito antes dos jornalistas do Intercept divulgarem essas notícias. Já apresentamos provas suficientes de que o juiz é suspeito e não foi imparcial.

Tudo que espero, caro amigo, é que a justiça finalmente seja feita. Tudo o que quero é ter direito a um julgamento justo, por um juiz imparcial, para poder demonstrar com fatos que sou inocente de tudo o que me acusaram. Quero ser julgado dentro do processo legal, com base em provas, e não em convicções. Quero ser julgado pelas leis do meu país, e não pelas manchetes dos jornais.

A pergunta que faço todos os dias aqui onde estou é uma só: por que tanto medo da verdade? A resposta não interessa apenas a mim, mas a todos que esperam por Justiça.

Quero me despedir dizendo até breve, meu amigo. Até o dia da verdade libertadora. Um grande abraço do Lula

Curitiba, 24 de junho de 2019″

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