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Médicos pediatras recebem manual sobre disforia de gênero

O manual tem por objetivo orientar os profissionais a tratar de crianças que tem descompasso entre o gênero biológico e a identidade

Jazz Jennings: agora com 17 anos, ela foi uma das primeiras crianças a mostrar as etapas transexualidade infantil (Jazz Jennings/Divulgação)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 20 de setembro de 2017 às 10h46.

Brasília - A Sociedade Brasileira de Pediatria preparou um manual para orientar os médicos da especialidade sobre como atuar nos casos de crianças com disforia de gênero - o descompasso entre o gênero biológico e a identidade.

"Esse é um tema que tem aumentado nos consultórios e muitos profissionais têm dúvidas sobre como lidar com o assunto. Nossa intenção é trazer o máximo de informações", afirma a presidente da SBP, Luciana Rodrigues da Silva.

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Um dos assuntos abordados pelo guia é a possibilidade de que crianças com essas características se submetam em casos específicos à suspensão do processo de puberdade.

A estratégia, realizada em centros de pesquisa habilitados, permite que o adolescente ganhe tempo para avaliar sua identidade sexual, sem as pressões das transformações da puberdade.

A prática vem sendo adotada em três centros de referência do País instalados em São Paulo, Campinas e Rio Grande do Sul. "A puberdade pode ser extremamente sofrida para crianças com disforia", afirma o coordenador do Ambulatório de Transtorno de Identidade de Gênero e Orientação Sexual do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Alexandre Saadeh, um dos consultores para a preparação do guia.

A supressão da puberdade é reversível. Caso, durante o processo, o adolescente decida que deseja permanecer com sexo biológico, determina-se a suspensão do uso dos hormônios. No ambulatório da Medicina da USP atualmente cinco crianças realizam o bloqueio.

Há ainda outras quatro que poderão iniciar o processo, quando a puberdade estiver mais próxima. A supressão da puberdade somente é indicada para casos em que o diagnóstico da disforia está feito ou prestes a ser concluído.

Luciana observa que a estratégia é usada em casos específicos e não é essa a atribuição do pediatra. "Fizemos um guia de atualização, onde vários tópicos são abordados, como o que é a transexualidade, como identificar a disforia e quais estratégias estão disponíveis."

A presidente da sociedade afirma que não raramente o pediatra é o primeiro profissional de saúde a ser procurado para conversar sobre sexualidade e, em alguns casos, sobre variação de gênero das crianças e adolescentes.

"A orientação correta é fundamental", assegura Saadeh. Tanto ele quanto Luciana afirmam ter aumentado o número de pais que chegam ao consultório com dúvidas sobre a identidade sexual dos filhos, por causa da maior liberdade para se tratar do tema.

Erros

Para Saadeh, é essencial que pediatras não cometam erros do passado, como culpar os pais ou dizer que a criança tem de ser condizente com o sexo que nasceu. "Muitos casos vão evoluir para homossexualidade, não necessariamente para a transexualidade."

'Processo recompensador'

Anderson Almeida muda o tom de voz ao falar do dia em que entrou em uma loja para fazer compras para sua filha Carol, há três anos.

O gesto foi para ele - e para toda a família - uma mudança de vida e uma libertação. Anderson saiu da loja com vestidos, blusas, presilhas para cabelos, muitas em tons de rosa - a cor preferida, mas até então pouco usada por Carol.

"Foi um processo difícil, mas muito recompensador", conta. Industrial, Almeida descreve seu comportamento do passado como antiquado e machista. Ele demorou a se convencer sobre os sinais que Carol começou a emitir aos 2 anos.

Na época batizado de Murilo, já colocava fraldas na cabeça, simulando ter cabelos longos. "Minha mulher me alertou, dizendo que não tínhamos um menino em casa, mas uma menina."

Meses depois de muita resistência e de sucessivas tentativas frustradas de fazer Carol gostar de futebol, máquinas e mecânica, Almeida concordou em procurar o ambulatório da Faculdade de Medicina da USP.

"A pressão foi grande. Meus pais, religiosos, diziam que estávamos errados, foi um choque." A cada dia que passa, no entanto, Almeida se convence de que a mudança foi para melhor.

"Carol antes era desatenta, agressiva. Hoje é uma menina feliz, carinhosa com todos e muito interessada em aprender", disse.

A transformação de Murilo em Carol começou a ocorrer há três anos. Os avós da menina, assim como o pai, trocaram a resistência pela certeza de que o certo foi feito. "A bisavó, de 93 anos, foi a pessoa que mais me impressionou. Quando levei minha filha para visitá-la, ela perguntou: mas esse não é o Murilo?", recorda.

"Quando expliquei que era o Murilo, que agora se chamava Carol, minha avó foi rápida: Isso é lindo. O importante é o amor." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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