Lula: A 62ª cúpula de presidentes do Mercosul começou oficialmente na segunda-feira (Ricardo Stuckert/PR/Flickr)
Redação Exame
Publicado em 4 de julho de 2023 às 06h00.
Última atualização em 4 de julho de 2023 às 07h21.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) assume nesta terça-feira, 4, a presidência rotativa do Mercosul, com o desafio de tentar destravar o acordo com a União Europeia e reaproximar os países do bloco. No comando da organização, o presidente brasileiro terá que tentar construir uma posição unificada no continente, diante das novas exigências dos europeus. Outro obstáculo é o processo de aproximação da China junto à Argentina e ao Uruguai.
Presidido por Luis Lacalle Pou, líder da direita no país, o Uruguai cogita construir um acordo bilateral com os chineses separadamente. Mas o governo brasileiro argumenta que qualquer negociação desse tipo precisa primeiro da concordância dos demais sócios do Mercosul.
A 62ª cúpula de presidentes do Mercosul começou oficialmente na segunda-feira, quando aconteceu uma reunião do Conselho do Mercado Comum (CMC), que reuniu os ministros das Relações Exteriores e da Fazenda de cada país.
Os chefes de Estado entram em cena hoje, quando a Argentina passará o comando temporário para o Brasil pelos próximos seis meses. A reunião será realizada em Puerto Iguazú, cidade argentina localizada na tríplice fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina.
De acordo com secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores, embaixador Mauricio Carvalho Lyrio, o Brasil está “muito próximo” de fazer uma proposta ao Mercosul sobre qual deve ser a resposta do bloco à União Europeia. Isso porque, no último mês de maio, os países da UE apresentaram um documento adicional que contém novas exigências, como, um maior rigor no combate à derrubada de florestas.
Do lado brasileiro, a principal preocupação diz respeito às compras governamentais. O motivo é que o texto do acordo, construído até 2019, prevê a abertura de licitações para empresas estrangeiras em condição de igualdade com as locais. Além disso, causa preocupação no Itamaraty o fato de a União Europeia sugerir que o acordo traga também a possibilidade de sanções ao Mercosul, caso os países sul-americanos não cumpram com exigências ambientais.
"Tem umas preocupações específicas sobre o conjunto de textos herdados de 2019 [quando o acordo quase foi concluído] mais o documento adicional no que se refere às compras governamentais
", explicou o embaixador. "Numa relação de países de confiança não cabe abordagem por meio de sanções comerciais. Então este é outro tema que temos que discutir".
Um dos aspectos que podem pesar contra o esforço da diplomacia brasileira para que essas questões sejam solucionadas já nesta semana é o fato de que dois dos quatro países do bloco estão passando por processos eleitorais. A Argentina terá novo presidente em outubro e o atual presidente do país, Alberto Fernández, não irá concorrer à reeleição. Já o Paraguai elegeu, recentemente, o economista Santiago Peña, mas este assumirá o cargo apenas em agosto. Portanto, não participará das negociações em relação à resposta do Mercosul neste momento.
Na prática, isso colocará foco justamente sobre os presidentes Lula e Lacalle Pou, que têm adotado posições divergentes no bloco. O Itamaraty diz que o Mercosul tem a seu favor os números do comércio na região. Após uma queda substantiva nas relações comerciais entre os países-membros por conta da pandemia, o volume de negócios voltou a crescer no bloco em 2021 (US$ 35 bilhões) e 2022 (US$ 40 bilhões). Além disso, o Mercosul tem negociações “avançadas”, segundo o secretário Mauricio Carvalho Lyrio, com a “Efta”, como é conhecida a área de livre comércio formada por Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça.
Os principais destinos das vendas do blocos são China, Estados Unidos e Países Baixos. As exportações do Brasil para o Mercosul alcançaram US$ 21,9 bilhões de dólares em 2022, o equivalente a 6,5% das exportações brasileiras.
A reunião também deve tratar sobre um possível tratado com a Associação Europeia de Comércio Livre (AECL), grupo de países do continente que não participam do bloco europeu – Noruega, Suíça, Islândia e Liechtenstein –, e outro com Singapura.
Outro assunto que tem colocado Brasil e Uruguai em lados opostos é a questão venezuelana. Lula defende o retorno da Venezuela ao bloco, mas, recentemente, Lacalle Pou criticou duramente o brasileiro por amenizar as denúncias de violação de direitos humanos no país de Nicolás Maduro. Neste contexto, o governo brasileiro deve ignorar o assunto na cúpula.
"O Brasil pretende levar [este tema para a reunião do Mercosul]? Não. É do interesse do Brasil ter a Venezuela [no bloco]? Sim, mas precisa discutir as condições", disse a embaixadora Gisela Padovan, secretária para América Latina e Caribe do Itamaraty. "A razão da suspensão [da Venezuela] foi o não cumprimento do calendário de ações de qualquer país que queira ingressar [no Mercosul] e evidentemente a questão democrática é importante".
Fundado em 1991, o Mercado Comum do Sul (Mercosul) é a mais abrangente iniciativa de integração regional da América Latina, surgida no contexto da redemocratização e reaproximação entre os países da região, ao final da década de 1980. Os países do Mercosul correspondem a 67% do território da América do Sul, o equivalente a 11,9 milhões de quilômetros quadrados. Os 270 milhões de habitantes do países do bloco equivalem a 62% da população sul-americana. Os países do Mercosul detêm 67% do PIB da América do Sul em 2021.
Com Agência o Globo.