Brasil

Gastos do cartão corporativo: inconsistências na divulgação expõem fragilidades da transparência

Ampla repercussão das informações na imprensa e nas redes sociais mostra que há interesse da sociedade sobre como é usado o dinheiro público, o que pressiona agentes públicos a aumentar a transparência sobre seus gastos

Diante do furor midiático, o governo federal abriu consulta pública sobre decreto para regulamentar o uso do cartão corporativo. O passo seguinte seria, divulgar as notas fiscais para os cidadãos saberem o que foi adquirido em cada compra, dizem membros da agência Fiquem Sabendo (ISABELA LYRIO/UNB AGÊNCIA/Divulgação)

Diante do furor midiático, o governo federal abriu consulta pública sobre decreto para regulamentar o uso do cartão corporativo. O passo seguinte seria, divulgar as notas fiscais para os cidadãos saberem o que foi adquirido em cada compra, dizem membros da agência Fiquem Sabendo (ISABELA LYRIO/UNB AGÊNCIA/Divulgação)

DR

Da Redação

Publicado em 21 de janeiro de 2023 às 06h48.

Última atualização em 21 de janeiro de 2023 às 16h08.

Desde que a Presidência da República abriu dados do Cartão de Pagamentos do Governo Federal de ex-presidentes de 2003 a 2022, a partir de um pedido da Fiquem Sabendo via Lei de Acesso à Informação (LAI), a imprensa se dedicou a examinar com lupa os gastos de Jair Bolsonaro, comparando-os com cifras divulgadas no Portal da Transparência e com mandatos anteriores. Mas a principal revelação do caso não é sobre quem foi o presidente mais econômico ou quem mais esbanjou, e sim a inconsistência dos dados públicos.

A decisão de informar sobre a publicação dos dados em caráter de urgência, sem análises mais aprofundadas, segue a missão da Fiquem Sabendo de abrir as bases públicas e colocá-las à disposição dos cidadãos. Não somos uma agência de notícias, e sim uma agência de dados especializada na LAI, que se dedica a garimpar informações que o governo tenta esconder e torná-las acessíveis a quem queira analisar. Nesse caso, ainda que tenham sido publicados a partir de um pedido de informação da FS, os dados foram ativamente disponibilizados pelo próprio governo em link público no site oficial.

Gastos por cartões de pagamentos no Portal da Transparência

Foi justamente a urgência da publicação que levantou a discussão sobre os gastos e permitiu a identificação de erros e divergências entre os dados que constam na planilha liberada pelo Planalto há uma semana e informações oficiais dos Cartões de Pagamento do Governo Federal que já estavam no Portal da Transparência, administrado pela Controladoria-Geral da União (CGU). E há outras fragilidades na transparência desses gastos. Não há, por exemplo, notas técnicas ou maiores detalhes sobre como ler os dados nem na divulgação da semana passada nem no Portal da Transparência, onde a planilha foi destacada com um banner na página inicial.

Na última quinta-feira, a CGU informou que os dados publicados se referem exclusivamente à unidade gestora da Secretaria Especial de Administração da Presidência, enquanto o Portal da Transparência inclui todos os órgãos. Dentro da Presidência, pode haver gastos, por exemplo, da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), e estes podem impor sigilo sobre as despesas a seu critério.

A boa notícia da ampla repercussão das informações na imprensa e nas redes sociais é que há interesse da sociedade sobre como é usado o dinheiro público, o que pressiona agentes públicos a aumentar a transparência sobre seus gastos e cumprir sua obrigação de prestar contas aos cidadãos.

Consulta pública para regular cartão corporativo

Diante do furor midiático, o governo federal abriu consulta pública sobre decreto para regulamentar o uso do cartão corporativo, que prevê, entre outras medidas, a divulgação em transparência ativa das notas fiscais das compras e o veto a qualquer gasto com produtos ou serviços considerados de luxo. Que sirva também para reforçar a responsabilidade sobre a integridade dos dados disponibilizados ao público por parte da fonte oficial, que nesse caso ainda deve esclarecimentos.

O passo seguinte seria, conforme determina a Lei de Governo Digital, divulgar as notas fiscais digitalizadas para que os cidadãos possam também saber o que exatamente foi adquirido em cada compra. Essas informações são públicas, porém apenas em arquivo físico na sede do governo, um empecilho a mais para o controle social em um país de dimensões continentais, onde apenas poucos cidadãos podem se deslocar até Brasília para consultar documentos.

*André Spigariol, repórter da Fiquem Sabendo, agência de dados independente e especializada na Lei de Acesso à Informação (LAI), tem como missão revelar dados e documentos do poder público escondidos da sociedade, além de formar cidadãos capazes de exercer o controle dos recursos e serviços públicos usando a LAI.

**Bruno Morassutti, diretor de advocacy da Fiquem Sabendo

***Luiz Fernando Toledo, diretor de conteúdo da Fiquem Sabendo

****Taís Seibt, diretora de operações da Fiquem Sabendo

Mais de Brasil

Em meio à crise no Rio Grande do Sul Lula recebeu ex-presidente da Argentina no Planalto

Prefeito de Porto Alegre faz apelo para que as pessoas não voltem para casa

Cartão Prato Cheio: como fazer o cadastro; tudo que você precisa saber

Quase 95% da atividade econômica do RS foi afetada por enchentes, aponta Fiergs

Mais na Exame